capítulo 5

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"Me leve num voo de asa prateada Até depois da escuridão, onde as sirenes cantam. Me aqueça no brilho de uma estrela, e me solte no sonho inferior.

Porque eu sou apenas uma rachadura neste castelo de vidro, e não há quase nada para você ver"
Castle of Glass, Linkin Park.

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Por incrível que pareça, não foi tão difícil quanto imaginei entrar na minha casa, que está inabitada há cerca de uma semana.

Claro que não é fácil pisar em um lugar cheio de memórias, mas também é impossivel fugir delas, porque se elas não estão nos lugares por onde andamos, elas estarão em nossa mente, como uma tatuagem permanente. E mesmo que você tente tirá-la a laser, a cicatriz ainda ficará lá, me lembrando de que um dia Rebecca Armstrong existiu na minha vida.

- Seu apartamento exala paz. - a Fantasma diz atrás de mim enquanto me vê colocar algumas das minhas roupas que estavam no varal nos cabides do guarda-roupas, sentada em minha cama e brincando com uma miniatura móvel do sistema solar, que comprei na feira astronômica de Seul ano passado. - É como estar no céu.

Rio nasalmente com a sua última frase.

- Você não foi para lá, então como sabe? - Pergunto, encaixando uma blusa de frio dele no cabide. Eu paro e a encaro por alguns segundos, pensando se devo ou não guardá-la, pois eu sei que a partir de hoje ela não estará aqui para vesti-la, que ela será apenas uma peça intocada ocupando espaço em meu guarda-roupas.

- Estive lá por pouco tempo. - Ela me responde, a voz baixa denunciando que a mesma está com os pensamentos altos. - E o silêncio do destino é semelhante a este quarto.

- Eu deveria ficar feliz com isso? - Pergunto. desacreditado. - Porque mesmo que eu devesse, você sabe que eu não irei ficar.

Eu olho na direção de Rebecca e observo a sua feição pálida continuar encarando os planetas coloridos da miniatura, o dedo indicador girando o sol no centro de todos. Volto a olhar para a sua blusa de frio, em um dilema sobre doar ou jogar fora, ou deixar em meu guarda-roupas, cultivando uma esperança sem sentido de que um dia ela voltará para vesti-la.

No fim, decido optar pela última opção. Essa é a única que irá garantir que ela não vá definitivamente embora, que ela continue vivo em minhas lembranças e em cada coisa que deixou em minha casa semana passada, como a sua máquina de tirar fotos, seu tênis favorito e o seu caderno de desenhos. Isso pode ser um pouco egoísta, pode até mesmo ser algo que vá me quebrar ainda mais por dentro, mas eu sei que, por hora, pelo menos por alguns dias ou alguns segundos, isso me deixará mais aliviada. Mostrará que a existência dela não foi totalmente em vão, que ela fez coisas e faria muito mais se não estivesse totalmente quebrada por dentro.

Realmente, como uma rachadura em um castelo de vidro.

Eu deixo a sua blusa de frio no canto do guarda-roupas, no último cabide, longe da minha visão. Fecho a porta logo em seguida, por mais que eu ainda tenha mais roupas para guardar aqui dentro.

- Mesmo que eu não fosse o centro do universo, você continuou girando em torno de mim do mesmo jeito. - Becky murmura da cama, ainda encarando o sol. - Quando você me abraçava, eu me sentia aquecida pelo fogo de mil sois.

O meu coração bate mais rápido dentro do peito. Por que isso me afeta tanto? Porque a minha imaginação prega coisas desse tipo? Ah, claro, não é apenas uma imaginação. E por mais que pareça assustador saber que o espírito da minha namorada está me rondando mesmo após quatro dias da sua morte, eu não tenho medo. Na verdade, me trás conforto. É bom, mesmo que errado. É como se fosse um enorme colapso na matriz, e eu só queria que nesse momento ela também pudesse voltar à vida.

O céu ainda está azul // freenbecky Onde histórias criam vida. Descubra agora