Epílogo

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[Jiwoo]

Ele sabe que eu existo.

Peter, meu melhor amigo, definitivamente sabe que eu existo e, na mesma medida que isso me faz explodir em milhões de pequenas borboletas por dentro, também me assusta. Muito.

Eu não sei dizer com certeza quando eu comecei a me sentir nervosa na sua presença ou quando meu coração começou a acelerar quando ele se aproximava, já que passávamos todos os dias juntos, rindo por alguma piada boba ou sem sentido, ou chorando por um romance clichê, abraçados no sofá da sala.

Todos os dias Peter me acompanhava até a minha casa e nos raros dias de neve, como hoje, por exemplo, quando as linhas da calçada estão cobertas de gelo, ele me dava seu cachecol, mesmo que eu já estivesse usando um.

Hoje, no entanto, ele não me acompanhou até a cafeteria onde trabalho. É meu dia de fechar a loja e é seu costume ficar comigo até que eu possa ir embora, mas ele não está aqui.

As coisas costumavam ser naturais entre nós, já que somos melhores amigos desde muito novos, mas os meus sentimentos esquisitos e complicados acabaram nos distanciando, principalmente depois do que aconteceu ontem.

Peter parecia irritado demais com o fato de um garoto da nossa classe de inglês ter me chamado para sair, e, em um momento de completo desespero e irracionalidade, acabei confessando o que sentia por ele para fazê-lo calar a boca.

Funcionou muito bem já que não nos falamos desde então.

"Caramba Peter, como você é imbecil! eu sempre suspeitei que te faltava inteligência, mas, poxa, achei que fosse capaz de compreender que o único garoto de quem eu gosto é você seu imprestável!"

Depois disso tudo o que se pode ouvir ao nosso redor foi o agoniante e constrangedor silêncio. De sua boca não saiu uma palavra sequer, nem mesmo quando eu disse que iria embora, afinal não havia clima algum para continuar em sua casa e com isso obtive a resposta que temia.

Ele não sentia o mesmo por mim e agora talvez nem amigos pudéssemos ser.

Solto um suspiro pesado que ecoa pelas paredes do estabelecimento vazio. A cafeteria já estava fechada e eu apenas precisava organizar algumas xícaras e talheres, trancar as portas e então poderia ir embora.

Eu não tinha nenhum espelho próximo a mim mas tinha consciência do meu estado deplorável. Meus fios loiros com algumas mechas cor-de-rosa estavam presos de maneira desleixada e eu havia recebido uma advertência por conta do meu uniforme amassado, que podia ser visto, mesmo por baixo dos casacos grossos.

Meus olhos estavam vermelhos e inchados. Reflexo de uma noite mal dormida, e eu me sentia ridícula por isso.

Meu tio Jay disse que eu jamais deveria sofrer por alguém e, se sofresse, que fosse em Milão assim como ele, que está morando lá atualmente.

Eu realmente tento pensar que ele tem razão, mas, então, a voz de Kyujin, minha melhor amiga, soa em minha mente.

"Quando um cara não liga pra mim eu penso que se ele não for o amor da minha vida, então eu errei de vida e não de amor."

É realmente muito confuso, mas não sei se existe algo que eu possa fazer e não é como se um milagre fosse acontecer.

Rio de meus próprios pensamentos, colocando a última xícara na estante. Coincidentemente, também é nesse momento que a campainha da porta de entrada toca, indicando a entrada de alguém.

Franzo as sobrancelhas estranhando a ação. Já passava das oito, não havia porque alguém vir até aqui. A menos que fosse um ladrão...

Por precaução, olho para todos os lados a procura de algo que possa usara para me defender e quando avisto uma vassoura encostada na bancada, seguro-a com toda a minha força e me preparo para usa-la, se necessário.

Me viro lentamente, vendo uma silhueta recostada no batente da porta. As luzes já estavam parcialmente apagadas, então não conseguia ver claramente o rosto de quem quer que estivesse ali.

─ já estamos fechados ─ falo a primeira coisa que me passa pela cabeça, enquanto dou passos para trás. De repente, a sombra caminha em direção ao interruptor, acendendo-o. Fecho meus olhos com medo. Sei que passei o último dia inteiro lamentando a minha vida, mas ainda sou jovem demais pra morrer, poxa.

Ouço passos caminhando tranquilamente em minha direção, e seguro com força a vassoura a minha frente, como se de alguma forma, ela pudesse me proteger. Me encolho, ao sentir minhas costas se chocarem com a parede, e então, os passos cessam ─ olha, eu estou de olhos fechados, eu não vi seu rosto, então se me deixar ir embora, podemos fingir que nada aconteceu ─ engulo seco esperando por uma resposta, mas tudo o que ouço é uma gargalhada muito conhecida por mim.

Abro meus olhos lentamente, ainda receosa e completamente confusa e encontro Peter, que ria de maneira exagerada.

Suas mãos estavam posicionadas sobre a barriga e seu corpo inclinado levemente para trás.

─ você me assustou! ─ exclamei sentindo meus músculos relaxarem gradativamente.

─ ah é? se você não me falasse, acho que não teria percebido ─ murmura entre risos.

─ ridículo, palhaço, sonso... ugh, que ódio ─ esbravejo soltando a vassoura. Meu sangue fervia por vários motivos. Pelo susto, pela raiva e pelo nervosismo de tê-lo aqui ─ agora me diz o que veio fazer aqui.

─ você sabe que nós precisamos conversar, Ji ─ agora sua expressão era séria, nenhum traço de piada ou diversão.

Eu sabia que não era o momento, mas não pude deixar de notar como seus fios castanhos, levemente ondulados, pareciam ainda mais macios. Seus olhos escuros como a noite brilhavam de forma intensa e suas bochechas estavam levemente coradas por conta do frio rigoroso.

─ oh, então agora você quer conversar? ─ cruzo meus braços em frente ao peito, tentando parecer imponente, mas nossa considerável diferença de altura tornava tudo mais difícil ─ ontem não parecia ser assim, já que me deixou ir embora sem dizer uma palavra ─ soei bem mais magoada do que pretendia, mas não me importei.

─ me desculpe, Ji. Eu realmente gostaria de ter lhe dito muitas coisas ontem, mas me senti tão feliz que simplesmente travei ─ arqueei a sobrancelha, esperando que ele continuasse ─ você é minha melhor amiga. A garota que me deu um colar de conchas quando tinha cinco anos. A garota que eu aprendi a amar e a única que eu quero amar pro resto da minha vida. Sei que deveria ter lhe dado alguma resposta e sinto muito por ter te chateado, mas quando se trata de você, eu sou um idiota apaixonado.

Acho que entendi o que ele quis dizer. Diante de tudo isso, não há nenhuma palavra capaz de expressar o que eu sinto, mas sei que meus olhos pretendem voltar a derramar lágrimas. De felicidade, dessa vez.

Passei alguns minutos observando seus olhos, buscando enxergar além de suas orbes escuras brilhando tanto quanto as incontáveis galáxias existentes e então sugeri:

─ vamos sair daqui.

Depois de me certificar de que as todas as luzes estavam desligadas e que tudo estava em seu devido lugar, caminhei ao lado de Peter até a porta de vidro, só então percebendo a forte nevasca que caía de forma repentina.

Olhei de soslaio para o garoto ao meu lado, que parecia tão surpreso quanto eu, mas apenas dei de ombros e toquei a maçaneta estranhamente fria. Queria muito ir para a casa, a minha ou a dele e passar nosso tempo juntos.

Não precisávamos terminar aquela conversa agora. Tudo o que eu precisava era estar com ele como sempre fizemos.

Estava pronta para enfrentar o frio terrível do lado de fora, mas acabei batendo meu corpo contra a porta quando esta não abriu. A maçaneta nem se moveu. Tentei mais uma, duas, três vezes e então troquei um olhar frustrado com Peter ao perceber o que havia acontecido.

A maçaneta havia congelado por conta do frio extremo e do lado de fora uma grossa camada de neve impedia a porta de se abrir.

Não fazia muito tempo que Peter havia chegado, então como isso era possível?

─ droga ─ murmuro ─ estamos presos.

after the storm | jakehoonOnde histórias criam vida. Descubra agora