Eu vou pro baile.... de sainha.

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31 de dezembro de 2023. Véspera de ano novo. Muitos comemoram na praia, com a família, com os amigos, em templos religiosos, em jantares. Kelvin era diferente. Comemoro em Baile Funk, hoje, mais especificamente, seria no baile do Complexo do Alemão, onde sabia que arrancaria suspiros e olhares curiosos, cheios de desejo, como sempre acontecia. 

Desde que fora expulso de sua casa por seus pais (o que já ia completar 2 anos), decidiu dividir apartamento com sua melhor amiga, Berenice, uma menina bem avoada para falar a verdade. Adorava festas, encher a cara, dançar e se divertir como se não houvesse amanhã, mas o amanhã sempre chega, né?  Toda manhã, após ter apenas 3 horas (isso quando conseguia dormir), Berenice era professora de um jardim de infância, a qual dizia ser extremamente apaixonada.

Kelvin, por sua vez, cursava direito em uma federal de Niterói, a UFF, curso esse que, foi forçado pelos seus pais para que – segundo palavras deles – conseguisse dar pelo menos algum orgulho à família. Veja bem, ele não odiava seu curso, mas aquela não era sua vocação. Não era por Direito que seu coração palpitava, não era dentro de um terno engomadinho, com uma gravata muito bem passada, em um tribunal envernizado que Kelvin se enxergava. Pensar em tamanha breguice, lhe arrepiava a espinha. O seu lance era cantar, dançar, compor. Ele era da arte. Sentia isso no fundo da alma. Adorava assistir aos Reality Show Drags e se perguntava se em alguma vida em que ele reencarnasse, esse sonho (tão apagado, que ele mal sabia que tinha) poderia ser realizado.

Mas, voltando a nossa deliciosa véspera de ano novo, Kelvin se remexia na cama, sendo despertador de um sonho que não se recordaria ao acordar, mas com certeza lembraria das sensações, inclusive da sensação de querer matar Berenice por não desligar aquele maldito despertador.

– Um dia eu mato essa garota, é sério.

Kelvin levanta da cama, pisando fundo, bufando muito, enquanto abre a porta da menina de supetão.

– Se você não desligar essa porra em 1 segundo eu juro que te asfixio com seu próprio travesseiro. 

Kelvin fala, irritado por ter sido acordado e perceber que a culpada por isso estava se babando em um sono maravilhoso.

Berenice se mexe na cama, resmungando e se cobre até a cabeça com um cobertor.

– Sério, Bere, acorda logo, é véspera de ano novo e a gente nem sabe onde vai passar ainda. Sem contar que nem compramos nossas roupas. 

A amiga se levanta, com um bico enorme e passa por ele, indo direto ao banheiro tomar um banho gelado, enquanto Kelvin se direciona a cozinha para preparar o café da manhã dos dois.

Após os dois estarem de banho tomado, se sentam para tomar o café da manhã juntos, como sempre faziam. Era uma tradição.

– Qual vai ser o baile que vamos curtir a virada?  — Kelvin pergunta enquanto morde um pedaço de pão. —

– Mana, não sei, viu? O BN tava dando a ideia de a gente curtir o da Penha, mas a gente ja foi lá no natal, queria um baile que a gente nunca foi. Quero coisa nova, música nova, ares novos, pica nova. Chega de mesmice. — Após a fala melodramática, a mulher bebe o copo de nescau quase inteiro de uma vez só. —

– Nossa, mas como sofre essa minha amiga, né? E eu achei que você já tinha cortado contatos com esse BN, dona Berenice. A mulher dele já te deu um apavoro aqui chegando do nada com um pedaço de madeira na mão. Sorte sua que a Dona Lurdinha tava lavando a calçada na hora e tacou um balde de água na mona.

– Que apavoro o que, me respeita. Se ele viesse, ia ficar sem os dentes. — Kelvin revira os olhos, sabendo que entrar naquele debate não valeria a pena — Ele vai mudar, Kel. Eu sei que vai. Ele disse até que vai me dar um anel de compromisso. — Mais um vez, o loiro revira os olhos pela maneira suspirosa e iludida que sua amiga fala. 

Complexo - Kelmiro Onde histórias criam vida. Descubra agora