Capítulo 35

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Jungkook

Quando a chuva começou a diminuir, passei a remar em direção à cabana. Já era tarde, por volta das onze da noite, quando as nuvens carregadas decidiram seguir para a próxima cidade. Amarrei a canoa na doca e passei a mão pelo cabelo encharcado, tirando um pouco do excesso de água.

— Merda — resmunguei, com frio.
Tudo que eu queria era andar até a cabana, trocar de roupa e deitar na cama. Mas, ao me aproximar dela, senti um aperto no peito. Havia alguém deitado no balanço da varanda, dormindo. Os paparazzi eram foda. Não era a primeira vez que tentavam acampar do lado de fora da cabana para conseguir informações minhas, mas normalmente o xerife da cidade, Sehun, conseguia mantê-los afastados.

Depois de horas de solidão na água, eu não ia conseguir lidar com um estranho do lado de fora da cabana tirando fotos minhas.

Caminhei até a varanda e bufei.

— Seu merdinha, você não tem nada melhor para fazer do que tirar fotos de... — Minha voz falhou quando me deparei com Jimin, que começava a despertar, alerto e assustado. Ele se sobressaltou um pouco, surpreso, a mão no pescoço. Quando seus olhos encontraram os meus, ele relaxou.

— Jimin? — chamei, quase duvidando da minha voz. O aperto no peito se tornou ainda maior. — O que você está fazendo aqui? — perguntei de forma bruta e confusa, com um pouco de raiva, mas feliz. Principalmente feliz.

Muito feliz em vê-lo.

Ele procurou algo atrás de si e, ao se levantar, me mostrou o quadro. Comecei a ler a minha própria letra.

Um dia, você vai acordar e sair de casa, Jimin-ssi, e vai descobrir o mundo. Vai ver o mundo todo, Park Jimin, e, nesse dia, quando você sair e respirar pela primeira vez fora dessa casa, quero que me procure. Não importa o que aconteça, você tem que vir me encontrar, porque eu vou te mostrar o mundo. Vou te ajudar a riscar as coisas da sua lista.

Ele se levantou, e suas roupas estavam encharcadas, como se também tivesse ficado embaixo de chuva a noite toda. Espirrou e começou a tremer de frio.

Jimin ficou ali, olhando para mim, esperando que eu dissesse alguma coisa, qualquer coisa.

Muitos pensamentos passaram pela minha cabeça quando nossos olhares se encontraram, mas não eram do tipo que eu merecia ter. Eu achava que não merecia sentir saudades dele, abraçá-lo ou amá-lo.

Tudo que eu fazia era beber e mergulhar em autocomiseração.

Jimin merecia mais do que a minha tristeza. Como eu poderia mostrar o mundo a ele quando me esforçava ao máximo para evitá-lo?

— Vamos entrar para nos secarmos — sugeri. Vi uma sombra de tristeza passar por ele. Era quase como se ele esperasse que eu fosse arrumar as malas e me juntar a ele para concluir a sua lista de coisas a fazer.

Foi a primeira vez que senti que realmente o deixei na mão.

Entramos na cabana e notei as malas na sala.

— Suas?

Ele assentiu.

— Eu já volto. — Entrei no quarto, segui direto para o banheiro e joguei água no rosto. — Meu Deus, Jungkook, controle-se.

Ver Jimin me deixou balançado. Ser lembrado de algo tão lindo quando só tenho tido sentimentos horríveis foi difícil para mim. Vê-lo me fez querer respirar, quando tudo que fiz nas últimas semanas foi tentar prender a respiração.

— Como você veio para cá? — perguntei ao voltar e encontrá-lo enxugando o cabelo com uma toalha e procurando o pijama na mala.

Ele escreveu: Seokjin.

Suspirei.

— Já é tarde e estou um pouco bêbado, então não posso levá-lo de volta para casa até amanhã. Você pode ficar por uma noite, mas terá que ir embora. Você vai ficar em um dos quartos.

Eu o conduzi até o quarto europeu.

— Vou te levar para casa assim que acordar, Jimin. Tem uma pizza de ontem na geladeira e refrigerante, se você quiser. Boa noite.

Fui breve. Não queria ter nenhum tipo de conversa com ele naquela noite, porque ele conseguia tornar as coisas melhores. Eu não queria me sentir melhor.

Não queria sentir nada.

Estava prestes a sair quando senti os dedos dele no meu antebraço. Fechei os olhos.

— Jimin — sussurrei e hesitei, mas ele me puxou para si. Olhei para seus olhos, e ele me deu aquele sorriso perfeito. — Não posso fazer isso agora — eu disse, mas ele não me soltou. Puxei o braço. — Não consigo. Sinto muito. Não consigo fazer isso.

Saí antes de me virar para ver sua reação. Fui para o meu quarto, bati a porta, peguei uma garrafa de Jack Daniel’s e tentei esquecer como era sentir algo de novo.

* * *

— Por que você está preparando algo pra comer? Temos que ir — gritei com Jimin na manhã seguinte quando o vi na cozinha fazendo panquecas. Eu não entendia. Já havíamos decidido tudo na noite anterior. Eu tinha deixado claro que íamos sair bem cedo.

Ele não se virou para me olhar e continuou cozinhando.

— Jimin! — gritei.

Mesmo assim, ele não respondeu.

Revirei os olhos, fui até a geladeira para pegar uma cerveja. Mas não havia nenhuma.

— Mas que m... — Tudo bem. Fui até o armário de bebidas e o abri, mas estava vazio. — Você está a fim de me sacanear? — resmunguei. — Jimin, cadê as bebidas?

Ele não respondeu.

— Droga, Jimin. Você é mudo. Não surdo!

Ele se virou para mim e me lançou um olhar fulminante, que, de alguma forma, me obrigou a me desculpar.

— Sério. Onde estão as minhas coisas?
Ele apontou para as garrafas vazias na pia. Senti um aperto no estômago e respirei fundo. — Você precisa voltar para casa, Jimin. Precisa pegar as malas e ir embora agora!

Ele veio até mim e pousou a mão no meu rosto com um toque reconfortante. Seus dedos percorreram a cicatriz do pescoço. Fechei os olhos. Era demais. O toque dele era reconfortante demais.

— Você não deveria estar aqui — protestei, minha mão cobrindo a dele. Pigarreei. — Pedi um tempo... — Engoli em seco.

Ele pousou os lábios nos meus e ergueu a mão direita. Cinco minutos.
Fechei os olhos.

— Não consigo.

Jimin me puxou para mais perto de si, pousando a mão no meu peito. Quando abri os olhos, ele estava olhando para mim, esperançoso.

— Tudo bem. — Afastei os pés e peguei as mãos delo. — Cinco minutos.

No primeiro minuto, foi muito difícil ficar olhando para Jimin. Ele me fazia lembrar de tudo que eu sempre quis e do que já tinha perdido. No segundo minuto, ele me fez lembrar dos melhores dias da minha vida. No terceiro, pensei na música. Jimin sempre me fazia lembrar da música. Ele era a minha música.

Ele se aproximou, e eu me afastei, soltando as nossas mãos.

— Não. Você não pode me confortar. Sinto muito. Não posso ficar perto de você. Sinto muito, Jimin. Vou passar o dia na cidade e, quando eu voltar, esteja pronto para partir. — Eu me virei para ir embora, constrangido com a minha grosseria. Quando meus pés chegaram à porta, falei a verdade:

— Você não pode me consertar, Jimin. Você tem que me deixar afundar.

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Bjs.   

O Silêncio Das Águas | jikook version Onde histórias criam vida. Descubra agora