10- Quando a morte nos separou.

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Quando a feia e impiedosa morte se atreveu a lhes separar, não restavam mais cabelos negros na cabeça de nenhum deles. Seus netos outra hora meninos eram adolescentes brilhantes, seus filhos se podiam chamar de senhores e aquela pele que um dia já foi delicada, macia e suave, havia se tornado mais enrugada.

E o que dizer do cabelo outra hora volumoso que Marcos possuía?

Dele só restavam lembranças.

Mas o amor que sentia, esse não mudou. Nem uma vírgula ou ponto. Lá em seus corações se manteve, e sobreviveu.

Naquele dia, em que a morte se atreveu a lhes separar, Marcos estava deitado em sua cama, a mesma que partilhava com sua amada. O rosto velho pálido, e sua belas covas haviam se perdido em meio às rugas de seu rosto.

- Foi uma boa vida, não? - Com a voz fraca e trémula, Marcos perguntou.

- Claro que foi. - Aline lhe sorriu gentil. Lembrava de 30 anos atrás, quando caminhavam juntos na praia sorriam como duas crianças, o sentimento daquele dia, ainda era o mesmo que inundavam seus corações apaixonados.

- E pensar que partilharia minha vida com uma rabugenta feito você. - Tentando ser engraçado, Marcos fez a esposa chorar. - Ah, não fique assim. - Disse tentando lhe consolar. Não era por suas palavras que ela chorava, ele sabia.

- Até quando durarei sem você aqui? - Se lamentou a mulher que sabia estar perdendo seu amigo, amado e eterno namorado.

- Aline minha querida, você durará até o tempo que  tiver que durar... Vai sentir a minha falta é claro, mas não pense em mim como alguém que partiu para longe, pense em mim como alguém que faz parte de você. E se alegre, porque Deus nos concedeu a chance de envelhecer um ao lado do outro... - Marcos aconselhou. Aline se emprentigou na cadeira e fungou o ar.

- É, afinal eu posso dizer que me tornei imortal. - Ela sorriu docemente.

- Isso, e eu amei a melhor pessoa que o mundo alguma vez teve a oportunidade de conhecer... Me casei e tive filhos, netos e uma vida completa. O que mais poderia pedir agora? - Perguntou retórico.

- Por um pouco mais de tempo ao meu lado. - Aline devolveu. Marcos sorriu.

- Certamente eu quero sempre mais tempo ao seu lado. Mas não posso dizer que não foi bom, que não foi maravilhoso e que não poderia querer qualquer coisa melhor... Mas ao menos continuei te amando até o fim. - Decretou sorridente. Com as rugas e fraqueza, Aline notou que seus olhos ficavam menores sempre que ele sorria, e como sempre que se tratava dele, ela amou aquele novo traço.

- Não sei quanto tempo vou durar sem você aqui, mas ainda vou te amar. Da forma mais pura e linda, e com meu coração velho que conhece a juventude de te amar. - Declarou a velha. Marcos fechou os olhos e assentiu.

- Daqui até nos encontrarmos na lua? - Perguntou lhe estendendo a mão. Dessa vez seus olhos estavam abertos.

- Daqui até nos encontramos na lua. - Assentiu com lágrimas nos olhos. Beijou a face amada e mais uma vez, sentada na cadeira perto da cama, repousou no peito do seu amado.

Cantou alguma música aleatória para ele enquanto ouvia seu fraco coração parar ao bocados. Fechou os olhos e guardou aqueles batimentos na memória.

Eles foram um, foram completos e singelos. Mas não eram imortais, ao menos não os seus corpos, e naquele dia, aos 85 anos depois de uma vida repleta, a morte os separou.

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Uma palavra sobre esse capítulo. Lindo.

E, estamos chegando ao final dessa mini história.

Daqui até lua.Onde histórias criam vida. Descubra agora