08. Às estrelas

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"Desgraçado" Aýlla urrou assim que chegou no banheiro de seu quarto. Removeu a roupa suada e se enfiou na banheira enquanto essa ainda enchia. Respirou fundo algumas vezes, tentando acalmar o corpo agitado. Muita adrenalina, essa era a justificativa. Adrenalina, e muito tempo sem contato físico. Somente isso justificaria a vontade, o desejo ridículo, de estar com Feyd-Rautha. Ele era um monstro, uma besta, um sádico; haviam lutado, e não fosse por ele a Ginaz jamais teria abandonado seu lar. Com toda certeza não estaria ali, naquele planeta quase morto obedecendo ordens de um barão cruel.

Por que estava suportando tudo aquilo? Talvez uma parte de si ainda tinha esperança de sair viva. Ou talvez uma parte escondida queria estar exatamente ali, vivendo nas sombras e existindo sem sentir. Afundou a cabeça na água morna, silenciando a mente. Precisava de mais ação, a rotina monótona estava a deixando maluca. Precisava sair, ver pessoas, entrar numa briga de verdade, ou ficaria maluca de vez.

A água da banheira borbulhava ao redor de Aýlla, cada bolha refletindo o turbilhão de emoções que ela sentia. Quando emergiu, o vapor do banho embaçava o espelho, como se até seu reflexo quisesse se esconder. Logo seria hora do almoço, e a oportunidade perfeita para uma conversa com o barão. Já havia ficado em silêncio por tempo demais. Quando acabou, vestiu o uniforme completo de guarda Harkonnen, as botas pesadas e o tecido pouco flexível.

Foi a primeira a chegar na sala de jantar, onde criados andavam de um lado para o outro para rechear a mesa com as mais diversas carnes e grãos. Sentou-se no lugar de sempre, à esquerda do barão, e esperou. As portas duplas se abriram diversas vezes, nobres estrangeiros se acomodando e conversando em idiomas que a Ginaz não entendia. Quando Feyd chegou o silêncio se fez, e Aýlla não conseguiu levantar os olhos em sua direção conforme ele sentava em sua frente. O rapaz nunca participava dessas refeições sofisticadas, certamente estava ali para desequilibrá-la, como havia feito mais cedo.

Poucos segundos depois da chegada do sobrinho, Vladimir Harkonnen apareceu. Cumprimentou todos na mesa enquanto flutuava até seu lugar, cordial e sorridente.

"Que honra ter a sua presença hoje" ele disse com escárnio ao mais novo, pegando os garfos. Somente depois da primeira abocanhada no pedaço de carne, os convidados começaram a se servir. "Se livrou do filho do traidor, como mandei?" perguntou, e Aýlla finalmente encarou Feyd, que já a observava, sério.

"Sim, meu barão" o filho do traidor seria Yusuf? Feyd-Rautha estava cumprindo ordens? Isso sequer mudava alguma coisa?

"Bom, bom" murmurou enquanto mastigava. "Preciso que faça uma expedição à Caladan, recebi um comunicado do Imperador dizendo que o planeta vem sendo saqueado por homens sem Casa".

"E o que temos a ver com isso?" perguntou insolente, sem olhar para o tio. Aýlla viu a oportunidade surgir.

"Suponho que, por terem derrubado os Atreides, Caladan agora seja responsabilidade da Casa Harkonnen" a garota falou, chamando a atenção do barão.

"Exatamente" sorriu largo, a expressão causando arrepios na Mestre de Espadas. "O problema tem ficado grande o suficiente para o Imperador exigir que tomemos uma atitude".

"E o que precisa ser feito?" perguntou Feyd.

"Uma limpeza de território, apenas o bastante para que o conde Hasimir Fenring assuma o comando" esclareceu. Aýlla endireitou a postura, preparando-se para falar; então o barão olhou em sua direção. "Pode levar nossa Mestre Ginaz e o batalhão que ela vem treinando" sugeriu, e ela não conseguiu conter a surpresa.

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