capítulo 3 Nem tudo são flores

28 2 16
                                    

lua

Mesmo trabalhando em uma floricultura, nem tudo são flores, é isso que eu penso toda vez que venho pra cá. Trabalho na Sabor Floral (nome particularmente péssimo) há pelo menos três meses. Vim para Brasília apenas quando finalmente consegui o emprego. Você deve estar pensando: "Nossa, então você sabe muito sobre flores e café, né?" Não, meus amigos. O que eu sei sobre flores resume-se às espadas de São Jorge que minha avó tinha no quintal de casa. O que me trouxe aqui foi o famoso "QI" (quem te indica). Ainda assim, foi difícil pra caramba, tá bom? Tive que puxar saco e pedir favores a Deus e ao mundo. Fiz promessa de ficar no mínimo seis meses e tudo isso para receber atrasado e sair melada de café quase todos os dias.

- Você vai ficar olhando o vento passar por quanto tempo? Já tem mesa para atender, sabia? - Samuel estalando os dedos na minha frente. Eu havia chegado há uns trinta minutos. Depois que saí da faculdade, fui almoçar no shopping, o que só me rendeu estresse por esperar na fila e auto depreciação ao olhar os preços. Sério gente, não é que esteja realmente caro, mas não está dentro do meu orçamento para o mês todo.

- Aí Samu, não tem como você ir atender por agora? Eu fico no caixa e na parte das flores, você se dá muito melhor com a cafeteira - falei já colocando meu avental e fazendo um rabo de cavalo no cabelo. Não que eu precise realmente, mas meu querido chefe, para não ter que chamar aquela peste de algo pior, seu Rodrigo, faz questão até que eu não use um batom muito "chamativo".

- Tá bom Lua, mas só hoje, ok? E só porque eu não quero limpar chão melado de café hoje. Sério mesmo, você por acaso morava na roça?" - Samuel olhou para mim como se eu viesse de outro planeta. Ele faz isso diariamente desde o dia em que eu disse que não sabia exatamente como mexer nas cafeteiras.

- Ai não começa. Eu só não consigo me entender com elas, véi. Sou fria demais para elas provavelmente. Você sabe que sou bem melhor na parte das flores. As pessoas desistem de comprar depois de ver seu olhar de julgamento - coloquei um pouco de água nos lírios da paz. Sério, esses aqui são as plantas mais dramáticas desse lugar. Achei que tinha matado eles umas duas vezes, mas só estavam sem água mesmo.

- Eu tenho culpa se é super brega eles quererem misturar tulipas e girassóis? Esse povinho é quem deveria mudar seu gosto.

Nem tento responder porque ele já fala se afastando para atender as mesas, a floricultura não é grande, mas também não é pequena, é dividida entre o balcão de flores no início e no fundo fica o balcão da cafeteria, para um lugar pequeno até que temos bastante movimentação, principalmente por causa dos clientes fiéis, que variam entre adolescentes anti sociais, idosos querendo atenção ou empresários que só tomam um café e ficam no computador durante cinco horas, Samuel não tem paciência na maioria das vezes pra nenhum dos tipos.

- Bom dia, mocinha, pode me ajudar? - como eu tinha dito, idosos são nosso público às vezes, mas essa estava até muito bem conservada, dava para ver pelas unhas pintadas de vermelho e nos óculos de sol na cabeça.

- Bom dia, senhora. Posso sim. A senhora precisa tirar dúvidas sobre algum produto?

- Ah, como você é educada. Você poderia me dizer qual arranjo seria melhor para a sala e para a cozinha? Estou achando minha casa tão sem vida ultimamente - ela fica observando os lírios e as rosas.

- Posso sim. A senhora pode me acompanhar? Tem opções lindas aqui desse lado - levo-a para a lateral da vitrine onde eu já deixava os arranjos do Pinterest prontos.

- A senhora vai adorar esses aqui. O amarelo e o rosa das flores dão um ar de leveza e claridade aos ambientes. Tenho certeza que vai ser perfeito para a senhora.

Entre Flores | SáficoOnde histórias criam vida. Descubra agora