Cap.16

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Não posso dizer que sinto pena dele.As palavras de Jörgen ficaram gravadas na mente de Calle Collin. A pior parte era queelas foram espontâneas. Jörgen não as havia dito para ser maldoso, mas como umareação instintiva à notícia de que Anders Egerbladh havia sido assassinado.Calle procurou o crime do martelo na internet. Após navegar por meia hora, descobriuos fatos básicos. Anders Egerbladh, que todos os artigos diziam ter trinta e seis anos,havia sido espancado até a morte na Sista Styverns Trapp, uma escada de madeira queligava a Fjällgatan e a Stigbergsgatan. A arma, um martelo, fora deixada na cena do crime,mas não tinha impressões digitais.O assassinato foi descrito como bestial. O nível de violência indicava ódio intenso pelavítima, e a polícia estava trabalhando com a hipótese de que a vítima e o assassino seconheciam. Um buquê de flores havia sido encontrado na cena, o que levava a crer que ohomem de trinta e seis anos estivesse a caminho de visitar uma mulher. Maisprovavelmente, uma mulher casada.Os melhores artigos foram escritos pelo repórter policial de um jornal vespertino noqual Calle Collin havia desperdiçado seis meses de sua vida profissional. Calle acreditavaque o repórter sabia mais do que compartilhara com seus leitores. Ele não conhecia ojornalista pessoalmente, mas conhecia uma de suas editoras. Se ela intercedesse a seufavor, talvez ele conseguisse falar com o repórter.Calle trabalhara temporariamente na seção feminina do jornal, em que todos os artigosse baseavam no primeiro mandamento do feminismo de Mary McCarthy: que não hádiferença entre homens e mulheres, exceto que os homens são maus por natureza, e asmulheres, boas por natureza.As manchetes e os vieses eram preconcebidos, e o trabalho editorial consistiasimplesmente em reunir argumentos que apoiassem a alegação e eliminar qualquer coisaque pudesse se opor a ela. Sem o menor pudor, os jornalistas da seção censuravamqualquer um que tivesse a coragem de questionar suas maquinações em nome da causa.O fato de que muitos daqueles perseguidos, cujas vidas e ações eram menosprezadas,na realidade eram bons exemplos de igualdade simplesmente não era levado em conta seeles chegassem a sequer insinuar, em uma nota que fosse, que talvez tivessem umaopinião diferente.No fim, isso significava que questões essencialmente importantes eram muitas vezesridicularizadas, e aqueles seis meses de trabalho no suplemento haviam instilado em CalleCollin uma desconfiança permanente do debate público. A única coisa positiva daquelaépoca no jornal foi que ele havia conhecido uma das editoras, uma mulher sábia e decoração grande. Após seis meses, ao ver que Calle não aguentava mais, ela perguntara seele não preferia ir para a seção de notícias.— Se eu estivesse interessado em notícias, teria ido para um jornal de verdade — Callerespondera.Por um longo tempo depois disso, ele fora citado muitas vezes pela equipe editorial. Amaioria das pessoas ria e até concordava com ele, mas o editor de arte ficara furioso ejurara que, se dependesse dele, Calle nunca mais poria os pés ali de novo.Calle pegou o telefone e ligou para a mulher sábia de coração grande.  

Não Voltarás (Hans Koppel)Onde histórias criam vida. Descubra agora