Capítulo 3. Aparências

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A manhã seguinte chegou com um peso sufocante, como se o próprio céu estivesse cansado. A névoa suave cobria tudo, mas dentro de mim o ciclo já começava a girar, implacável. Era sempre o mesmo roteiro, repetido à exaustão nos últimos cinco meses. Acordar, vestir minha máscara de indiferença, fingir que estava tudo bem, e ignorar Camila. Ela, com aquela doçura ingênua, sempre acreditava. Cada vez que eu a afastava, cada vez que minhas palavras eram afiadas, ela voltava. Acreditava na minha fachada, nas minhas mentiras.

Ela confiava em mim, e isso me matava aos poucos. Eu sabia que não merecia sua confiança, mas me afundava mais e mais no papel que criei: a filha perfeita, a garota popular, a manipuladora que nunca podia fraquejar. E Camila, vulnerável como sempre, continuava a acreditar. A cada dia eu me afastava, deixando-a mais confusa, mais ferida, mas ela nunca desistia.

No refeitório, o som habitual de conversas e risadas flutuava ao meu redor enquanto me sentava com Alexa e  Vero. Risadas ecoavam, talheres batiam contra pratos, mas era tudo ruído distante. Minha mente estava em outro lugar, mergulhada nos pensamentos que eu preferia ignorar.

— E aí, Lauren? Como vai o namorinho com a sua amada? — O tom de deboche de Alexa estava estampado em cada sílaba, forçando um sorriso em meus lábios, mas fazendo meu estômago revirar.

— Uma merda, como sempre — retruquei, a irritação escapando sem filtro. Meu olhar automaticamente se fixou em Camila e Dinah, perto da máquina de doces, rindo de algo que eu não podia ouvir, mas que aumentava minha frustração.

Vero me encarou, seus olhos afiados como lâminas, cortando a defesa que eu tentava erguer. O peso do seu olhar desafiava a justificar minha escolha.

— Não sei por que você ainda está com ela, se é assim que a trata — disse, sua voz direta e sem paciência para os meus jogos. Aquelas palavras ressoaram dentro de mim, um eco de crítica que eu não podia ignorar.

Suspirei, sentindo a tensão familiar apertar meu peito. O que eu poderia dizer que já não tinha repetido mil vezes?

— Vocês sabem que é complicado — comecei, como se essa justificativa pudesse apagar meus erros. — Além disso... ela é virgem. Sabe como é, né? Estou curiosa sobre o que ela esconde debaixo daquele moletom largo.

Ri, e Alexa riu junto comigo, uma risada oca que ecoava como um lembrete de quem eu tinha me tornado. Alexa fez uma careta exagerada, quase teatral.

— Pelo amor de Deus, Lauren! Que nojo! — exclamou, fingindo ânsia de vômito.

Vero balançou a cabeça, desaprovando, mas mantendo o silêncio. Ela entendia as camadas do que eu estava tentando esconder. Sabia mais do que qualquer um ali.

— Vero... — insisti, meu tom beirando o desespero disfarçado de casualidade. — Você sabe que isso é pelo meu bem. Camila precisa estar comigo, e enquanto não liberar o que eu quero, vou procurar em outros lugares.

Ela soltou um suspiro pesado, seus olhos capturando os meus por um segundo a mais do que o necessário. O silêncio parecia espesso.

— Camila é mesmo ingênua, né? — Alexa cortou o silêncio como uma faca. — Qualquer outra garota já teria te mandado pastar faz tempo.

Eu sorri, um sorriso vazio, enquanto meu olhar se fixava novamente em Camila, que agora pegava sua bandeja.

— Mas essa é a vantagem — murmurei, mais para mim do que para os outros. — Ela me idolatra demais para enxergar o que realmente acontece.

— Até quando você vai manter isso? — Vero perguntou, a voz baixa, mas firme. — Uma hora ela vai perceber, e aí, Lauren?

— Quando isso acontecer, eu já terei um plano B — respondi, tentando soar despreocupada, mas a insegurança escapava em meu tom.

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