Kapitel VIII

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Os raios de sol despontam pela janela e minha maior surpresa é que eu tenha conseguido dormir sentada no chão duro apoiada apenas em meu braço estendido na mesinha. Tomo um pequeno susto ao constatar que não estou sozinha e que Gilbert se encontra escorado todo torto no braço da poltrona de cor feia. Apoio a cabeça em meu braço ainda estendido sobre a mesa e tomo como missão olhá-lo.

Com toda a correria não pude notar direito todos os traços dele e invejar o que posso, como a extensão de seus cílios que são longos — injustamente longos —, ou como sua pele facial é livre de toda e qualquer mancha ou pinta, o que é totalmente diferente da minha cara sardenta e com pintinhas em todos os lugares possíveis pelo corpo.

Respiro fundo me levantado de onde estou e me estico, dou um grunhido de dor quando o corte abaixo de minhas costelas lembra que ele existe e que uma ponta dele resolveu cagar com o pouco de paciência que eu ainda tinha e abrir. Olho para o lado vendo que felizmente não o acordei.

Dou uma passeada pela cabine e paro na pequena pintura que havia me chamado atenção ontem, passo a ponta dos dedos pelos traços delicados na pintura, uma onda de saudades de me invade e me sinto um pouco culpada por ter fugido assim de Weidenbaum.

— Éramos amigos quando estudávamos em Tunerdown.

Sobressalto com a voz baixa ao pé de meu ouvido, enrigesso nervosa. A nossa proximidade gera em mim em uma pequena onda de pânico, me obrigo a tentar ficar bem, porém meus tremores são grandes e perceptíveis para quem quisesse ver a pelo menos um quilômetro de distância. Me viro para ele, os olhos arregalados e no rosto uma expressão de incômodo. Ele parece perceber meu medo pois se afasta consideravelmente de mim.

— Me desculpe.

— Não tem pelo quê se desculpar, eu que fui sem noção me aproximando dessa maneira.

— Não, eu devia... — deixo a frase morrer sem mais qualquer explicação.

— Você não devia nada. Não tem que ser culpada por sofrer nas mãos dos tiranos que reinam aquele país. Não tem problema nenhum ficar mal depois de ser sentenciada a desonra, na verdade é bastante compreensível suas reações. Nós devíamos apenas ser mais cuidadosos quanto a isso, sinto muito, de verdade.

Dou um meio sorriso.

— Então estudou com meu marido na faculdade? — Mudo de assunto, me voltando novamente para a pintura deles dois e mais três pessoas. — Não que eu queira lhe ofender, mas jamais imaginei que o senhor tivesse estudado algum tipo de ciência exata.

Ele ri.

— Bom saber que pareço um alienado.

Franzo o cento, ofendida.

— Perdoe-me, mas ser da área matemática não te torna mais inteligente que pessoas de outras áreas — me viro para ele novamente, notando que dessa vez ele se encontra a bons metros de mim — me dou bem com ciências humanas e nem por isso sou uma alienada. E mesmo se fosse, não seria culpa de mais ninguém senão de seu tio, pai, irmão sei lá quem que deixa qualquer tipo educação nas mãos da igreja, que por sua vez escolhe beneficiar apenas quem tem dinheiro para pagar por esses direitos básicos.

— Não foi isso que eu quis dizer.

— Mas foi o que deu a entender.

Cruzo os braços e volto a analisar os traços de Gulliver no antigo quadro. Suspiro vendo que "corrigiram" algumas coisas em sua aparência, o nariz definitivamente está menor do que era o habitual e com toda certeza ele não tinha a mesma altura do sr. Bakersfield, não que fosse menor, mas tenho a impressão de que se colocados lado a lado, Gilbert precisaria inclinar a cabeça para trás se quisesse olhar nos olhos de meu marido. Rio baixo. Mudaram toda a estrutura de Gulliver para deixarem o filho da realeza bem na fita.

Como Uma RainhaOnde histórias criam vida. Descubra agora