Simone
— Vocês poderiam ter se reencontrado. O amor sempre dá um jeito, sr. Prior! O amor sempre dá um jeito!
Ele está cético.
— Não quero ofender, minha garota, mas você não estava lá. Não era assim que funcionava. Claro, houve várias histórias ótimas, moças que achavam que os namorados estavam mortos, depois voltavam para casa e os viam subindo a rua de uniforme, tranquilos... Mas, para cada uma delas, houve centenas de histórias de amantes que nunca voltaram. Johnny provavelmente está morto, ou, se não estiver, deve ter se casado há muito tempo, com um homem ou uma mulher em algum lugar, e já me esqueceu.
— Mas você disse que ele não estava na lista.
Estou sacudindo a lista de mortos na guerra que imprimi, sem entender por que insistir tanto. O sr. Prior não me pediu para encontrar Johnny. Ele só estava com saudade. Perdido em memórias. Mas vejo muitos idosos aqui. Estou acostumada com memórias; com a saudade. Senti que isso era diferente. Senti que o sr. Prior tinha assuntos mal resolvidos.
— Não, acho que não. Mas sou um homem velho e esquecido e o sistema do seu computador é bem recente, então um de nós pode estar errado, não?
Ele abre um sorriso gentil, como se eu estivesse fazendo isso por mim, não por ele. Olho para o sr. Prior mais de perto. Penso em todas as noites em que vim falar sobre visitantes de outros pacientes e vi o sr. Prior sentado em silêncio em um canto, mãos no colo, rosto inexpressivo, rugas retas, como se estivesse se esforçando para não parecer triste.
— Colabore um pouco. Me conte os fatos. Qual regimento? Local de nascimento? Características específicas? Parentes?
Os olhos pequenos e redondos do sr. Prior me encaram. Ele dá de ombros. Sorri. Fecha o rosto seco e manchado pela idade, movimentando sardas do pescoço, parecidas com tintas, deixadas ali por décadas de colarinhos de camisa exatamente iguais. Ele balança um pouco a cabeça, como se, mais tarde, fosse diz era alguém que as enfermeiras modernas são muito excêntricas, mas começa a falar mesmo assim.
• • •
Quinta de manhã. Ligo para minha mãe para uma conversa curta e difícil no ônibus.
"— Alguma novidade?"
"— Sinto muito, mãe. "
"— Não é melhor eu ligar para o Sal? "
"— Não, não. Estou cuidando disso. "
Silêncio longo e triste. Chafurdamos nele.
Mãe, com esforço:
"— Desculpa, querida. Como você está?"
Volto para casa e tenho uma surpresa agradável: bolo de aveia caseiro na bancada da cozinha. Está cheio de frutas secas e sementes coloridas, como se a mulher de Essex não conseguisse deixar de misturar cores nem na comida. Mas isso parece menos condenável quando vejo um bilhete ao lado da bandeja.
Excelente progresso. Com certeza posso aturar altos níveis de entulho e luminárias diferentes por trezentas e cinquenta libras por mês e comida de graça. Pego um pedaço grande, me sento para escrever para Richie e conto as novidades sobre a saúde de Maya. Ela é a "garota ingênia" em minhas cartas para ele e um pouco uma caricatura de si mesma: mais inteligente, sarcástica e bonita. Pego outra fatia do bolo sem olhar, preenchendo a segunda página com descrições dos objetos mais estranhos da mulher de Essex, alguns tão ridículos que acho que Richie não vai acreditar. Um ferro de passar no formato do Homem de Ferro. Sapatos de palhaço de verdade, pendurados na parede como obras de arte. Botas de caubói com esporas, e, ao ver como estão gastas só me resta concluir que ela as usa com frequência. Noto, um pouco alheia, enquanto mexo no selo, que comi quatro fatias. Torço para que realmente não tivesse problema. Já que a caneta está na mão, rabisco no verso do bilhete dela.
"Obrigada. Tão delicioso que, sem querer, comi quase tudo."
Paro antes de terminar o bilhete. Sinto que preciso retribuir o favor de alguma maneira. Quase não há mais bolo de aveia na bandeja.
"Obrigada. Tão delicioso que, sem querer, comi quase tudo. Tem estrogonofe com cogumelo na geladeira caso você queira jantar (já que não deixei quase nada do bolo).
Simone."
Melhor começar a fazer o estrogonofe com cogumelo agora.
• • •
Não foi o único bilhete que encontrei. Tem outro no chão do banheiro.
"Oi, Simone, Você poderia baixar a tampa da privada, por favor ?Desculpe não ter conseguido escrever este bilhete de um jeito que não soasse passivo-agressivo — é sério, alguma coisa acontece quando escrevemos bilhetes. A gente pega uma caneta e um Post-it e imediatamente se torna um babaca. Então estou tentando deixar o texto mais estiloso. Talvez até coloque uns smiles só pra garantir.
Bjos,Soraya"
Há smiles cobrindo toda a parte de baixo do bilhete. Começo a rir. Um dos smiles tem corpo e está mijando no canto do Post-it. Eu não estava esperando isso. Não sei por quê — não conheço essa mulher —, mas não a havia imaginado com tanto senso de humor. Talvez porque todos os livros dela sejam do tipo "faça você mesmo".
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Teto para duas - Simone e Soraya
FanfictionTrês meses após o término do seu relacionamento, Soraya finalmente sai do apartamento do ex-namorado. Agora ela precisa para ontem de um lugar barato para morar. Contrariando os amigos, ela topa um acordo bastante inusitado. Simone está enrolada co...