dear girl

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Saio da varanda pouco depois de Cath me deixar, tendo certeza de ela já estar no quarto antes para não acabar trombando com ela no corredor. Entreabro a porta da sala e vislumbro Peter pela luz da Tv, ainda acordado assistindo alguma coisa. Sentei do seu lado, com a expressão ainda um pouco triste e, ao notar, ele pergunta o que houve. Simplifico dizendo ter discutido com minha mãe ao telefone e ele me abraça em silêncio. Peter não era jeitoso com palavras, mas eu adorava como ele tentava se mostrar presente fisicamente, mesmo sendo tímido. Fiquei algum tempo ali com ele, os dois assistindo The office, até me dar um pouco de sono. Esses momentos simples só aumentavam meu carinho por ele.

Acordei cerca de 10h da manhã. A luz do dia atravessava as longas janelas do apartamento, deixando-o bem iluminado. Peter já estava acordado, jogando um jogo de Fórmula 1. Entrei na cozinha, com minha higiene pessoal já feita, e cumprimentei a empregada, que já orgazinava alguns preparativos para o almoço. Pego um copo de água na geladeira e nego comer algo, preferindo esperar até o almoço. Ela me avisa que Cath e Thomas viriam almoçar conosco, mais tarde. Entro na sala e junto algumas tralhas que Peter havia espalhado, guardando-as no lugar, colocando copos na pia e embalagens fora. Ele ri da minha mania de organização, me chamando para sentar com ele.

Almoçei com todos reunidos mais tarde, conversamos banalidades na mesa e até falamos relativamente mal de nosso pai, o que acaba se tornando um assunto frequente entre nós, seus comportamentos imaturos. Cath conta manias bobas que ele costumava ter e eu e Peter rimos, notando algumas semelhanças que, infelizmente, temos com ele.

Cerca de duas horas após o almoço, Peter e Thomas saem para treinar tênis juntos, me deixando sozinha com Cath. Tento ler um pouco, me distrair desse fato, mas logo ela me convida para vermos um filme. Com as cortinas da sala fechadas, deixando o ambiente com a luz baixa, ela zarpou por vários títulos até entrarmos em consenso sobre um. O filme era um thriller sobre uma mulher que se interna em uma clínica psiquiátrica para investigar uma morte. Apesar de o filme me prender bastante, a presença de Cath ainda me deixava de certa forma inquieta, por mais que me sentisse confortável. Quando estávamos perto de descobrir a reviravolta final, os dois chegaram do tênis, nos fazendo parar o filme. Cath fica chateada, curiosa para ver o final. Acho graça seu entusiasmo com o final do filme.

O casal resolveu nos levar até o shopping da cidade vizinha, para saírmos um pouco. Enquanto ela se arruma, vou para o quarto e coloco uma das roupas que ela me deu. Quando saio, a porta de seu quarto está aberta, ela pintando seu olho com uma sombra escura em frente à sua penteadeira. Ela termina sua maquiagem e me senta onde antes ocupava. Cath alisou meus cabelos levemente desgrenhados com uma escova e prendeu uma parte, impossibilitando-os de cair no meu rosto. Ela faz isso com um aparente entusiasmo, como se brincasse de boneca. Fico parada e a deixo fazer o que quiser. Após passar uma leve sombra em meus olhos, ela avisa que estamos prontas.

O trajeto leva cerca de uma hora, a qual passamos ouvindo musicas, Cath e Thomas conversando enquanto eu e Peter mexíamos em nossos celulares. Me impressiono com o tamanho do shopping, no mesmo padrão dos grandes e novos. Passeamos como uma família perfeita, Peter compra um tênis (o qual demora séculos para escolher), Cath e Thomas vão à loja de brinquedos comprar um presente para um aniversário e, enquanto isso, eu e Peter achamos um painel da lego com peças para as crianças encaixarem. Rindo feito bobos, usamos elas para escrever "Cu", o que faz Cath zoar nossa imaturidade, mesmo achando um pouco de graça. Quando estava juntos parecíamos sempre um pouco mais novos, Peter me acalmava e eu o agitava, como meu pai costumava dizer. E nisso ele estava realmente certo. Tínhamos um lado travesso de irmãos que tinha sido pouco exercitado e agora quando, mais velhos, nos uníamos, ainda agíamos assim, por vezes.

Passamos na livraria antes de irmos e, enquanto Cath olha alguns títulos, Peter escolhe um Diário de um banana para levar.

- Sério que você vai levar isso? Eu lia eles quando tinha 12 anos! - brinco, vendo o ótimo gosto literário que meu irmão tinha.

Recomendo um livro para Cath, que o leva sem pensar duas vezes, me espantando com sua facilidade em comprar algo sem pensar tanto. Pego um livro que reconheço e folheio, enquanto Peter já começa a ler seu Diário de um banana. Mesmo à meu contragosto, ele pede para Cath levar o livro que eu estava vendo, o que ela faz também sem rodeios.

Voltamos para o apartamento com o trajeto mais silencioso, eu e Peter já um pouco cansados do dia que passava. Tomo banho assim que chego, com Peter indo logo após. Depois ele e Thomas tornam a conversar na sala de estar. Noto Cath em seu quarto, com a porta novamente aberta, como costuma deixar. Ela está deitada de bruços com o celular em mãos, com uma aparência um pouco cansada. Ando até seu lado da cama e pergunto se está bem.

- Tudo, querida. - ela faz uma pausa. - é bom que você esteja aqui. Costumo trabalhar bem mais durante às ferias e, confesso, deixei a agenda mais livre para ficar mais com vocês nesses dias. Thomas que está trabalhando um pouco mais na clínica. - ela sorri.

- Fico feliz de ter vindo. Foi bom saber seu lado nisso tudo e te conhecer melhor.- digo, tímida. Ela chega um pouco para o lado, para eu me sentar na cama.

- Você é uma menina tão querida, inteligente, bonita. - ela passa a mão em meu rosto, me olhando com seu sorriso bonito. As coisas que ela dizia e fazia eram tão carinhosas, eu me derretia por dentro. - sei que aqui é diferente do que você está acostumada, mas quero que saiba que isso é o normal. O normal é uma família se dar bem e se comunicar, fazer as coisas juntos. - ela pausa, segurando minha mão - Mesmo que nem todas as famílias sejam assim, esse é o esperado. O que você passou de ruim com seu pai e até com sua mãe não é normal. Você não deveria ter passado por isso. Lembre disso.

Ela aperta minha mão levemente e sinto suas palavras me atingirem no peito. Era algo tão óbvio, mas que eu nunca havia pensado. Eu não deveria normalizar o caos familiar em que cresci e sim uma família saudável. Era isso que ela queria me dizer. E eu entendi. Havia comentado pouca coisa sobre minha relação com minha mãe, mas ela tinha alguma ideia de que não era tão boa, além do que sabia sobre meu pai. Suas palavras passavam a se faziam extremamente necessárias para mim, como se eu fosse sua discípula.

- Thomas vai fazer plantão no hospital essa noite. Fica aqui um pouco. - ela sorri e vai mais pro lado, o suficiente pra caber meu corpo ao seu lado. Me deito e nos encaramos, fazendo pouco caso quando Thomas passa para pegar suas coisas para sair.

Aproximei a mão de seu rosto, hesitante, passando a mão por sua face. Cath sorri, me deixando sem jeito. Ela estende o braço, em sinal para eu me recostar nela, que estava meio sentada/meio deitada. Me afundo em seus braços e me sinto segura. Ela me olha com ternura e me parece tanto certo como errado, sabendo o quanto eu não tinha nada haver com aquela família, por mais que quisesse abundantemente.

Relembro quando cantávamos no carro, quando os marquei em uma foto que tirei do retrovisor, me surpreendendo com uma republicação sua, escrito "minha fotógrafa❤️". E eu queria acreditar. Queria ser sua. Seria tudo tão diferente. Cath percebe meu olhar pensativo e, novamente, sorri com carinho. Ela se aproxima e deposita um beijo em minha face, me olhando atentamente. Dessa vez não hesito e deixo um beijo relativamente perto de seus lábios, ao que ela não esboça surpresa. Sua expressão continuava a mesma, cautelosa, carinhosa.

Peter surge na porta do quarto e, por um momento, me assusto, mas Cath não reage. Lhe dá boa noite e me diz para assistirmos alguma coisa antes de dormir. Assim, me retiro de sua cama, com meus pensamentos vagueando enquanto encaro a televisão, com Peter já concentrado em assistir o The office.















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Revisado!

Family Affair - sáficoOnde histórias criam vida. Descubra agora