TERRAS DE NINGUÉM

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Junho de 2133

Naquela noite, após Maia deixar meu apartamento, me sentei no sofá, encarando o chão. Meus pensamentos embaralhados não me deixavam focar em nada com todas as novas emoções me sobrecarregando. Sem saber lidar com isso, escondi esses sentimentos em uma gaveta e continuei meus dias. Depois disso, voltei a trabalhar no hospital, e assim que pisei no prédio, Takashi me informou que o enfermeiro-chefe do banco de sangue, Vital, me aguardava na minha sala.

— Bom dia, como vai? O Dr. Taylor gostaria de vê-la. Podemos ir até ele?

Esse homem não respeitou tempo algum que pedi. Andei devagar, muito carrancuda. Eram só oito da manhã, mal cheguei no meu trabalho, e Taylor já estava me chamando.

Chegamos ao setor mais silencioso, apesar de estar repleto de pessoas. Entre eles, tinham aqueles que participavam das pesquisas, ou aqueles que doariam ou receberiam sangue.

Quando pisei em seu escritório, Taylor já estava me esperando. Ele veio de Kinshasa, a Oitava Cidade.

— Bom dia. Que bom vê-la. — Ele sorriu e acenou para eu sentar. — Desculpe incomodar, mas você deve saber...

Sentei, franzindo a testa. — Ela aceitou mandar amostras do sangue dela, mas não virá até aqui.

Taylor me encarou com olhos brilhantes. — Ela aceitaria se pagarmos?

— Acredite, ela não é esse tipo de pessoa. — Sorri sobriamente. Mas vai saber que tipo de pessoa ela realmente era?

Ele colocou a mão no queixo, pensativo. — Certo, vamos ter que trabalhar com isso. Tudo bem se forem amostras semanais? Para a pesquisa que estou conduzindo, seria o suficiente.

— Suponho que não será um problema. — Dei de ombros.

— Onde podemos encontrá-la? Posso mandar um andróide para fazer a coleta das amostras. — Taylor me olhou com expectativa.

— Isso não é necessário. Ela só vai aceitar se eu fizer a coleta.

Ele apertou os lábios em contrariedade. — Não será incomodo para você?

Meneei a cabeça. — Tudo bem. Para quando você quer a primeira amostra? — Eu queria terminar logo aquela conversa.

— Essa semana, se possível. Então pode fazer a coleta semanal. — Ele sorriu, tentando não soar impositivo.

— Vou verificar. Você será notificado. — Me levantei, escutando seu agradecimento no fundo.

Mandei uma mensagem para Maia e combinamos de nos ver na próxima sexta.

Segui a minha semana tranquila, recebendo os resultados e emitindo os relatórios do CogniSynth. Embora eu estivesse com uma sensação péssima, especialmente porque ia ver Maia tão cedo, eu ainda queria encontrá-la. Quando a sexta-feira chegou, a ideia do nosso encontro fazia meu interior pular. Era tão forte, que eu quis sorrir sem motivo aparente. A pior parte foi quando Takashi me deu uma notícia horrível:

— Uma voluntária morreu por falência completa dos neurônios do córtex cerebral.

Abri o seguro da pesquisa que ele me enviou. Os voluntários recebiam um valor diário, mas em caso de danos severos ou até mesmo óbito, eles, ou uma pessoa designada, recebia o prêmio. Um valor que, segundo Morey, era um ticket para a Zênite.

— Hum, certo... — Eu quase sorri. — Ainda que seja sério, isso já era esperado. — Segurei uma risada, cobrindo minha boca. Takashi continuava apático. Pigarreei, me recompondo. — Acione a UNITED Seguros e contate o responsável indicado. É a primeira voluntária que perdemos e espero que seja a última — disse bastante séria, enviando-lhe o seguro certificado.

Metade em ChamasOnde histórias criam vida. Descubra agora