Capítulo 1 - Ninguém Sabe O que Aconteceu

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4 anos atrás

      Eu vi em um livro velho de filosofia que meu pai tinha na sua enorme prateleira de livros, em um capítulo que falava sobre a felicidade do homem, um trecho no qual o escritor tratava sobre a sociedade líquida, do quanto as coisas poderiam mudar de uma hora a outra nas relações entre as pessoas. Um fardo carregado pela nossa geração, sempre estávamos em constante mudança. Na época, as capacidades de meu subconsciente eram muito limitadas para compreender todos aqueles termos complicados que meu pai, mesmo após seus 60 anos, ainda foi capaz de lecionar para adolescentes de 16 anos que não davam a mínima para o que ele dizia no palco de uma sala de aula.

     A maior qualidade desse velho, era sua esperança nas pessoas, ele sorria para mim dizendo sempre as mesmas frases: "tolo seja o incapaz de enxergar uma saída mesmo na mais profunda das fossas".

     Seu escritório em casa era de muito bom gosto, pequenas estátuas românicas nas estantes de madeira escura, cofres guardando documentos de casos antigos e paredes bem pintadas com um preto e branco em listras verticais. Minha filha estava me ajudando a retirar as coisas dele, já que estaríamos nos mudando para o apartamento dele, minha mãe já era muito idosa e não poderia morar sozinha, seria a primeira vez que ficará sem seu marido desde seus 14 anos de idade.

     - Vocês já se mudaram bastante, por que virem até aqui residir com uma velha infeliz quando finalmente conseguem se estabelecer? – exclamava minha mãe.

     - Não posso ficar sem cuidar da senhora e, aliás, a Jude já entendeu.

     - Esta menina é realmente uma garota de ouro.

     Nos abraçamos na porta do escritório enquanto olhávamos para Jude, minha filha de 16 anos, empilhando os livros de seu avô em uma caixa. Eu estava preocupada com ela na época, era uma das poucas pessoas com que Jude mantinha afinidade, ela não era capaz de escoar sequer uma lágrima, todavia, eu sabia que tamanha era dor da minha filha que, não seria capaz nem mesmo de se comparar à minha.

     Já havia se passado alguns dias desde que nos desfizemos das coisas de meu falecido pai, como eu já era divorciada de meu antigo marido, pai de Jude, ela foi cumprir o que se espera de uma guarda alternada e passar alguns dias com ele até que chegasse o tempo de seu retorno a mim. Estava preparando uma surpresa, a decoração do novo quarto estava impecável, ela provavelmente já estaria em casa quando eu chegasse do serviço daquele dia cansativo.

     Eu estacionei meu carro na garagem do prédio, a bicicleta de Jude estava estacionada na nossa vaga, sinal de que ela já estaria em casa. "Que besteira fiz em chegar tarde logo hoje", pensei eu naquele dia. Percebi um movimento grande de pessoas em direção a frente do edifico poucos minutos depois que entrei, mas estava com tanta pressa de ver minha filha que não me dispus a desviar o caminho, já estava atrasada o suficiente.

     Tive uma surpresa quando o elevador abriu no corredor do quinto andar, onde ficava nosso apartamento. Havia um enorme movimento de pessoas entrando na casa, eu não entendi muito bem de relance, porém, quando entrei, me deparei com minha mãe caída aos prantos no sofá da sala principal mas, surpreendentemente, a concentração de pessoas não estava em volta do socorro de minha genitora idosa, estavam no quarto da minha filha.

     Eu paralisei quando vi o estado em que tudo se encontrava, pelo menos 5 pessoas estavam lá dentro, uma bagunça inexplicável, a janela estava arreganhada e todos olhavam para baixo através dela.

     - O que está acontecendo aqui? – gritei para que todos me ouvissem.

     Toda a barulheira, de repente, se tornou silêncio, todos olhavam para mim com expressões assustadas, hesitantes, lamentáveis. O silêncio que se formou, por sua vez, me ensurdecia, olhei nos olhos de um dos rapazes que veio andando em minha direção, ele não disse uma palavra, apenas me abraçou.

     - Apenas me diga, o que aconteceu? – insisti enquanto já chorava aos ombros do rapaz, devolvendo com força aquele doloroso abraço.

     - Ninguém sabe! – respondeu ele em meu ouvido – Não é nada fácil de entender.

Pais e FilhosOnde histórias criam vida. Descubra agora