Dois longos anos de relacionamento haviam se passado desde então, Jhonatan e eu estávamos felizes, nos encontrávamos quase todo dia, meu pai e minha mãe já haviam o conhecido e o aprovado, tanto que, Jhonatan e o senhor Édson passaram a ver o campeonato brasileiro de futebol juntos todo domingo de tarde, seria algo bom se meu pai não fosse palmeirense e meu namorado corinthiano.
Mas nem tudo eram flores como se pensa, ainda éramos crianças, brigávamos muito por motivos fúteis, como quando eu ia a algum lugar sem avisar e o deixava irritado, eu também brigava com ele quando ele fazia isso, se passam mil coisas em minha cabeça quando eu não sabia onde ele estava, eu surtava de certa forma e, acredito que o mesmo acontecia com ele também. Trocávamos mensagem a todo momento, qualquer sumiço de 5 minutos que não fossem avisados com antecedência se transformava em desconfianças e atritos, coisas normais de jovens imaturos.
Embora tudo isso, fomos nos encaixando, estávamos planejando nossa moradia, justamente no apartamento próximo aos dos meus pais, eu já tinha uma condição financeira trabalhando de auxiliar no escritório de advocacia de meu pai, enquanto Jhonatan, já era enfermeiro e residente em um hospital.
Mas durante esse período de desenvolvimento emocional nosso, do qual antecedeu a inesperada gravidez, houve um acontecimento em particular que me fez rever meus conceitos sobre com quem eu estava me envolvendo, mais precisamente, sobre o caráter dos irmãos Cavalieri.
Antes de nos mudarmos, nossa rotina nos fins de semana se resumia em passar os sábados no apartamento que ele dividia com Rafael e, os domingos no apartamento de meus pais. Em uma noite em particular, Jhonatan e eu víamos um filme interessante que achamos nos streamings, ele estava sentado normalmente no sofá e eu deitada com a cabeça apoiada sobre suas coxas, ele acariciava meus cabelos de forma lenta, enquanto estávamos concentrados na trama.
Seu celular então tocou, ele atendeu normalmente, mas logo, sua voz se alterou para um tom de preocupação, gritando: "Você não pode ter feito isso de novo"; aquilo me assustou e me fez saltar tão rápido quanto ele, não pude resistir à perguntar de forma instantânea:
- Quem era no telefone?
- Meu irmão. – respondeu ele enquanto se vestia para sair de casa, mesmo estando muito tarde. – Eu já disse para ele parar, mas ele não aprende.
- Com o que?
- Te explico no caminho, agora, se vista porque precisamos ir até a delegacia.
Depois de trocarmos de roupa, entramos no carro que era de Jhonatan e fomos até a delegacia na qual Rafael estava. Antes de ele me explicar o que estava acontecendo, estava conversando no celular com alguém que parecia ser um advogado que, aparentemente, também estava em trânsito rumo à delegacia.
Após se desconectar da ligação, começou a me contar o que havia ocorrido. Rafael havia tentado abusar de uma garota bêbada no banheiro de uma balada, tentativa essa frustrada pelo flagrante de uma das amigas da menina. Jhonatan me explicou que isso não tinha sido a primeira vez, Rafael já havia sido expulso de um ônibus por passar a mão em uma adolescente e, por pior que me doa relembrar desse relato, Rafael era suspeito de estuprar uma mulher em Londrina, cidade onde eles nasceram no interior do Estado do Paraná. Ou seja, Rafael não estava em São Paulo para estudar, ele trabalhava, todavia, não era matriculado em sequer uma faculdade do Estado, a família Cavalieri havia o enviado para ficar seguro com o irmão e longe das suspeitas de uma investigação recorrente de estupro.
Jhonatan dirigia rápido, sua determinação para proteger o irmão era maior do que sua importância aos atos que o próprio cometia. Quando chegamos no Distrito Policial, Rafael já estava solto e acompanhado do advogado, Jhonatan só teria que assinar a intimação que o irmão sofreu, logo após, foi liberado para ir embora conosco.
No caminho de volta para a casa, tudo ficou em silêncio dentro do carro, ninguém ecoava um só barulho, eu senti um peso no ambiente que não era capaz de explicar, eu evitava olhar para os espelhos temendo o contato visual com Rafael no banco de trás. Ele ainda estava namorando minha amiga Gita naquela época, me preocupava com ela e com que ela acharia de toda aquela situação. Em apenas uma das minhas reviradas de olho ao espelho do carro, Rafael estava, também, mirando fixamente a mim.
- Escute Fernanda. – disse ele em um tom pouco ameaçador. – Não conte nada para a Gita.
Eu não o respondi, fiquei mentalmente paralisada com o tom de sua voz, Jhonatan não fez nada que pudesse fazer me sentir segura, eu senti um calafrio vindo das pernas até o pescoço, entretanto, tive que me conter. Naquele momento, prestava atenção nos caminhos da condução de Jhonatan, temendo de forma extrema, qualquer desvio de caminho. Esse é o tipo de situação em que uma mulher necessita ficar atenta, pois, nunca se sabe quando sua vida pode estar em risco e, por algum motivo, eu sentia isso.
Chegamos em casa, Rafael saiu do carro e eu disse a Jhonatan que não subiria ao apartamento e que voltaria para casa. Isso gerou uma discussão dentro do carro, acarretando em minha partida sem qualquer olhar para trás. Eu não poderia acreditar que nada havia sido feito por parte de Jhonatan para que ele me defendesse, eu me senti em perigo, ameaçada ao ter me sujeitar a mentir para uma amiga, não poderia ficar tranquila com aquela situação.
Jhonatan e eu ficamos por 2 meses sem se falar, até que, Rafael teve de retornar a Londrina por ordens judiciais. Com aquela figura longe de nossas vidas, poderíamos agora nos retratar novamente, planejar nossas vidas. Mesmo assim, nunca sumiu de minhas memórias toda a perversidade que houve durante aquela cena, não somente vinda do ar maléfico dos irmãos, mas também de quem eu estava escolhendo como marido.
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Pais e Filhos
Roman d'amourOs problemas sempre estiveram presentes na conturbada vida de Fernanda. Entretanto, um acontecimento específico afetou sua memória e sanidade mental, tendo de que ao lado de uma profissional, contar a história de sua trajetória ao lado de sua jovem...