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Em uma certa sexta feira, em comemoração a um projeto finalizado e também a um contrato fechado com uma das empresas que há muito estávamos tentando, meus colegas e eu saímos do escritório rumo à um bistrô.
Comemos, bebemos, rimos e ficamos todos a vontade na presença um do outro, e aquilo estava sendo bom, estávamos criando laços que iam além do escritório.
Quando deu o meu horário, me despedi de todos e fui embora. Andando de volta para minha casa, e dividindo espaço com alguns atletas noturnos, ouço meu nome sendo gritado por uma voz feminina...e quando me viro, vejo a dona daquela voz que não me era familiar.
Confesso que fiquei surpresa ao vê-la, pois um dia julguei nunca mais ouvir sua voz, e com o passar do tempo e com tantos acontecimentos, não pensei que esse reencontro poderia acontecer, na verdade já não pensava mais nela desde muitos anos atrás.
Me cumprimentou com um forte aperto de mão e um largo sorriso. Enquanto ela me questionava se eu estava bem, e comentava sobre quanto tempo não nos víamos, eu não conseguia disfarçar minha reação de surpresa e confusão. Apertei sua mão como retribuição do cumprimento, e respondendo sua pergunta acerca do meu bem estar, retruquei também a afirmativa " - Sim...faz bastante tempo, não é mesmo?!"
Aquela mulher que estava ali na minha frente, sorrindo de forma quase agressiva e conversando comigo a respeito de muitas coisas que se sucederam desde o colegial, em nada se parecia com a garota que havia traído a minha confiança justamente com o meu namorado, o que em algum momento do diálogo, se tornou um dos assuntos comentados por ela.
Com um certo desdém em seu tom de voz, fez um comentário um tanto ácido sobre aquele acontecimento, o que me fez duvidar do pensamento que tive um pouco antes desse assunto vir à tona. Entre algumas palavras, maioria ditas por ela, surgiu um questionamento na minha cabeça:
" Será que ela tá bêbada? Ou doida? Ou talvez os dois? Porque ela tá agindo assim? Será que é alguma piada? Ela tá sendo sarcástica, atriz ou uma simples babaca?"
E enquanto esses pensamentos circulavam em minha mente, ela continuava a falar tanto sobre muitas coisas ao mesmo tempo, que de uma certa maneira me senti esgotada, muito mais esgotada do que se tivesse trabalhado em um campo de colheita.
- Foi um prazer te rever...espero te encontrar mais vezes...podemos marcar alguma coisa depois, o que acha?! eu acho ótimo! Te ligo mais tarde então!
E assim, desse jeito afobado ela se despediu e continuou andando para fora do parque, enquanto eu estava ainda tentando entender o que havia acabado de acontecer.
Confusa ainda pela cena anterior, e cheia de perguntas em meus pensamentos, sem perceber acabei sendo atropelada por uma bicicleta, mas devo confessar que a culpa foi toda minha. Andei pela ciclovia sem a menor percepção, dando atenção aos meus pensamentos.
Quando fui atingida pela bicicleta, atingi também o chão e com bastante força, a ponto de rasgar os joelhos da minha calça, e machucar a minha mão.
Em seguida ouvi uma voz:
" - Aí meu Deus! Você está bem? Está machucada? Mil perdões! "
Tentando separar os acontecimentos recentes, eu me sentei no banco que tinha próximo dali, e por uns segundos respirei buscando voltar à mim mesma e àquela realidade presente, e foi quando mesmo sem perceber, estava olhando para frente, e na minha frente havia um rapaz de capacete, me olhando e perguntando se eu estava bem.
- Sim sim, eu estou bem! Desculpe, a culpa foi toda minha, eu não deveria entrar na ciclovia, eu estava meio confusa com algo que tinha acabado de acontecer, me desculpe. Você está bem? Está machucado?
Ele então deu um suspiro tão aliviado que começou a rir, sentou-se ao meu lado e continuou rindo. E eu sem compreender muito bem o motivo da risada, fiquei o observando enquanto esperava por uma explicação.
Admito que foi um jeito muito estranho, e até mesmo dolorido, de conhecer alguém, mas enquanto eu o observava rir, notei o quão bonito ele era, e o quão prazeroso era o som da sua risada.
- Ai ai moça. Olha, vou te dizer, o meu dia acabou de ficar melhor do que já estava, e eu só precisei atropelar uma distraída na praça.
E continuou rindo de maneira que sua risada me contagiou. O que por um momento estava estranho, ficou engraçado e então começamos a rir juntos.
- Ai ai moça. A propósito, me chamo Miguel.
se apresentou ele em uma breve pausa depois de tanto rir.- Então esse é o nome do rapaz que está rindo depois de ter me atropelado...
respondi.- Mas a culpa foi sua que entrou na ciclofaixa. Na verdade a culpa é nossa por sermos tão distraídos. Mas agora podemos rir disso já que ninguém se machucou feio.
e voltamos a rir, juntos.Ficamos um tempo ali, sentados, olhando pro alto, rindo e conversando um pouco, até o momento em que resolvi levantar e me despedir dele. Com um aperto de mãos e um sorriso mútuo, dizemos tchau um ao outro.
Quando me distanciei, o ouvi gritar:
- Ei! Seu nome, você não disse...
Dei a ele um último sorriso da noite e me despedi de uma vez, prometendo que, na próxima vez, talvez, que nos encontrássemos, então eu diria meu nome.
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Revie: Anastásia
Short StoryA vida é um grande amanhã: misteriosa e incerta. E nela conhecemos e desfrutamos de momentos bons que parecem curtos, e momentos ruins que parecem eternos. Contudo, o que ela nos proporciona em ambos os casos é a chance de aventurar-se em sua constâ...