Brisa de Verão

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- Aparece lá em casa. Vai rolar um happy hour, a galera vai estar toda lá, queremos que você vá!

Foi o convite que recebi uma vez de uma colega do trabalho. Mas tudo o que eu consegui fazer foi sorrir e agradecer o convite, pois por dentro eu só queria ir pra minha casa e, deixar de existir.

Não fui tão soberba assim, pelo tempo que trabalhei com eles, visitei uma festa daquela mesma pessoa, naquela mesma casa. Mas não sei se adiantou alguma coisa porque, eu interagia com conversas rasas, sorrisos aparentes e nada conseguia ser interessante para mim.

Enquanto eles dançavam, riam e se divertiam, eu ficava no canto próximo a janela, fumando e observando tudo ao meu redor, e me perguntava se estavam todos quebrados como eu e se preenchiam daqueles momentos pra sentirem algo, ou se realmente aquele tipo de diversão lhes era algo bom e construtivo.

Cansada de observar e indagar, apaguei o meu cigarro, me desfiz do copo de vodka que mal havia bebido e saí tão à "francesa" que nem me despedi de ninguém, e também não acho que fez alguma falta.

Na verdade, não sei porque as pessoas falam "sair à francesa" pra se referir a sair de mansinho, já que os franceses na verdade fazem questão de cumprimentar um por um tanto quando chegam, quanto quando vão embora.

Mas no fim, acho que não importa muito, saindo ou não de mansinho da festa, minha presença lá não estava sendo participativa.

Lembro que quando cheguei em casa aquela noite, tomei um banho e fiquei acordada, sentada na sacada, observando o céu e ouvindo os sons da madrugada. Um silêncio vez ou outra interrompido por barulho de carros, gatos miando, alguma TV com o volume alto ao longe, e nada além do som da minha geladeira.

Hoje me recordo daquele tempo, daqueles dias e até mesmo, de como me sentia, e acaba por tudo fazer sentido, uma vez que consigo aos poucos compreender o significado de tudo aquilo.

Naquela mesma madrugada, meu telefone tocou, o que admito que até me assustou um pouco, primeiro porque era muito raro alguém me procurar, segundo que só meus pais me ligavam e a maioria dos contatos era pra fazer cobranças e brigar, e terceiro que estava muito tarde pra algum deles me ligar. Então não atendi e deixei cair na secretária.

- Oi minha filha, é a mamãe. Eu acabei de acordar de um sonho, nele você estava presa em uma caixa de vidro, gritava mas eu não ouvia sua voz, chorava mas não caíam lágrimas. Sei que todos esses anos não foram fáceis pra nenhum de nós, mas você continua sendo a minha princesinha, e eu sinto muito por tudo o que aconteceu, e como aconteceu. Está tarde para te ligar mas nunca é tarde para dizer que eu amo você.

Aquelas palavras me chocaram, e sinceramente eu não sabia nem o que pensar.

De fato, eu me sentia daquela maneira que ela descreveu: presa numa caixa de vidro, sendo vista por pessoas que não me ouviam, tentando chorar sem lágrima alguma.

Talvez fosse tarde de mais pra que eu sentisse alguma coisa, tarde de mais pra que alguma coisa boa acontecesse comigo, pra que eu fosse importante de alguma maneira para alguém, somente talvez pois não haviam certezas em mim.

Me recordo que, após ouvir a mensagem da minha mãe algumas vezes, senti uma imensa vontade de ouvir músicas, não sabia ao certo quais músicas até porque não era algo que eu costumava fazer, mas liguei o rádio e então, pela sala conjugada mesmo, me pus a dançar.

Movimentos que eram tão naturalmente efetuados por meu corpo, sob a meia luz do luar que invadia a sala pela sacada, eu dancei. Dancei por horas o que se pareceram minutos, músicas que eu não conhecia, mas que pareciam me conhecer tão profundamente a ponto de fazer dos meus olhos escorrerem lágrimas tão pesadas, porém ao caírem se tornaram leves.

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