II. Os Últimos.

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Até onde a vida e a ficção deixam de ser a mesma coisa?

Essa era uma pergunta que Felix vinha se fazendo há um longo período de tempo, tudo aquilo parecia coisa tirada de algum livro não publicado de Stephen King.

Quer dizer, primeiro ele acorda sozinho e, pelo visto, todas as outras pessoas do mundo deveriam ter sido sugados para dentro da terra, era a única explicação possível. Ninguém some do nada.

E agora, outro cara aparece, quer dizer, não que ele duvidasse da possibilidade de realmente terem outras pessoas por aí... mas ele passou meses naquele lugar.

Porque logo agora?

Christopher parecia uma pessoa legal, mas, muitas pessoas horríveis também parecem legais.

E depois daquele encontro conturbado e toda aquela situação e silêncio constrangedor estavam caminhando pelas ruas vazias juntos.

-Você precisa de um banho, 'tá fedendo.

Christopher riu, Felix tinha quebrado o silêncio da forma mais tosca o possível. Mas, era compreensivel, aquele silêncio já estava começando a incomodar.

-Foi mal, eu andei por um bom tempo direto.- Riu.

-Era só entrar em uma casa com caixa d'agua.- O Lee murmurou, ainda encarando a rua direto.

-Não gosto de sair invadindo tudo que é casa, ué.- Chris murmurou. É sério, mesmo que estivessem no fim do mundo, seu senso de bom moço lhe fazia se sentir envergonhado.

-Você sabe que a porra do mundo acabou, né?- Felix riu. -Dá pra entrar em qualquer lugar.

-Você fica bonito sorrindo.- O Bang comentou.

Felix corou um pouco, e sim,  Chris estava falando sério, Felix ficava muito bonito sorrindo, diferente daquele rostinho triste de minutos atrás.

-Você corou, que fofo!- O maior disse todo emocionado com a carinha do outro.

-Precisamos achar algumas roupas pra você.- Felix disse, tentando desviar aquela conversa idiota. -Não tenho nenhuma roupa que vai servir.

-Ah, sim...- Chris ficou pensando em onde iria pegar roupas.

Felix literalmente encarou uma vitrine de lojas por algum tempo, isso até caminhar tranquilamente até a porta, constatando que estava trancada mesmo. Suspirou pesadamente, voltando até onde o Bang estava.

-Deve ter alg... Caralho!

Chris arregalou os olhos quando o ruivo pegou uma pedra e atirou na mesma com toda a força que seu corpinho devia ter.

-Vai ficar parado ai ou vai me ajudar?- Resmungou para o maior.

-Você vai mesmo tentar quebrar a vitrine?- Olhou incrédulo para o outro, que já procurava por mais coisas pesadas.

-É meio óbvio, né?- Disse com um tantinho de deboche.

Chris ficou encarando o garoto atirar várias coisas na vitrine durante algum tempo. Decidiu tocar os ombros do menor, fazendo-o largar aquele tijolo, que não fazia a menor ideia de onde ele tinha tirado.

-O vidro não vai quebrar, Felix.- Riu. -Ele não tem grade por um motivo, uh?

O Bang puxou de dentro do bolso um grampo, indo em direção aos cadeados da porta. Tinha aprendido a fazer aquilo na força do ódio, só por ser extremamente necessário.

-Pronto.- O mais velho riu da cara de desgosto do Lee, erguendo a porta.

-Se você é um marginal, me diz logo pra eu dormir com uma faca embaixo do travesseiro.- O Lee disse, entrando na loja sem olhar pro outro, sabia que nenhum alarme ia tocar até por que não tinha eletricidade em porra de lugar nenhum mesmo.

-Anda logo, daqui há pouco começa a escurecer.- Bufou, pegando uma das sacolas grandonas dispostas ali, que antigamente deveriam ser para os clientes.

A verdade de ambos era uma única: não sabiam mais como agir com outra pessoa por perto.

Tinham se acostumado à aquela intensa solidão de acreditarem que eram os últimos seres com um coração batendo naquele lugar. Felix ainda duvidava bastante que aquele garoto que caminhava devagar pela sessão de camisas ao lado fosse real.

Mas, tudo bem, pelo menos era uma alucinação bem bonita.

Óbvio que ponderava o fato do Bang ser real, e também a possibilidade de ele ser um psicopata que poderia lhe matar enquanto dormia.

Mas preferia não pensar muito nisso, afinal, nada de bom passa na cabeça de alguém que só para pra pensar besteira.

Felix pegou algumas camisas, calças, cuecas e meias, não parando pra ver ae serviam, apenas conferindo se eram do tamanho que costumava usar, afinal, se não ficasse bom, era só pegar outra.

Não ia ter que esperar em uma fila pra trocar mesmo.

-Já escolheu suas coisas?- Felix murmurou, vendo o outro brincar com um bichinho de pelúcia que estava em cima da arara de roupas.

Era impossível aquele cara ser tão fofo, porém, ele era.

-Sim, Sim.- Ergueu a sacola, mostrando que ela estava cheia de coisas.

-Só roupas pretas?- O ruivinho riu, afinal, Felix adorava cores, desde as mais fortes até os tons mais pastéis.

-Uhum.- O loiro deu de ombros. -Eu gosto de preto.

-Percebi.

Caminharam para fora do local, Felix observou o céu levemente alaranjado, com alguns risco que quase pareciam um tom rosado. O silêncio daquele dia estava menos ruim do que os dias de antes, afinal, agora tinha outra pessoa ao seu lado.

-É aqui.- Felix apontou para a própria casa, achando extremamente estranho outra pessoa entrar ali com ele.

Era irônico, nunca havia levado alguém para casa quando seus pais estavam lá, e agora, um completo desconhecido iria dormir no quarto ao lado.

Mas, preferia se prender à fiel ideia de que estava junto do Bang com a certeza de que talvez nunca mais visse outra pessoa em sua vida.

Era melhor que estar sozinho.

E se o Bang quisesse lhe fazer mal, já teria feito, quer dizer, não havia ninguém para exercer regras, ou seja, sem punição.

Christopher entrou meio desconfortavel no local, era todo milimetricamente arrumado, quadros de familia espalhados, o piso de madeira parecia refletir.

-Você pode dormir aqui.- Felix o guiou para o quarto que pertencia à seu irmão, não haviam muitas coisas ali além de roupas e alguns mangás com nomes super desconhecidos.

Chris observou, até mesmo o quarto que estava sem uso brilhava, como se o Lee tivesse a esperança de que seus familiares voltassem.

Bom, não o julgaria.

Por mais ruim que sua relação com seus pais fosse, ainda assim, desejou durante algumas semanas que eles voltassem para casa.

-Tem uns livros se quiser ler...- Felix disse. -Só cuide bem deles, por favor.

-Obrigado, Felix... Sério.- Sorriu minimamente, não sabia como dizer o que sentia.

Só se sentia agradecido por finalmente ter alguém junto de si.

-O banheiro é no final do corredor, não é quente... Mas a caixa d'agua esta cheia.- O Lee disse.

-Como você...

-Eu roubei agua das caixas dos vizinhos. Pode me julgar.- Deu de ombros. -Eles claramente não iriam se importar.

-Não julgo... Só acho que é muito peso pra carregar sozinho.- Disse sério, e só agora realmente tinha percebido que Felix era um tanto quanto franzino.

-Da próxima você me ajuda.- Lix sentiu o rosto corar um pouquinho, mas então se virou, seguindo reto para a cozinha. -Anda logo que você 'tá fedorento!

Ser chamado de fedorento é a última coisa que faria alguém rir, porém, naquela situação, Bangchan sorria.

Torcendo com fé para aquilo ser o começo de uma boa amizade.

Surgit •ChanlixOnde histórias criam vida. Descubra agora