Sempre em minha mente

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Benjamin tomava seu café da manhã enquanto lia as notícias no jornal online. Só desgraça, pessoas se degladiando por poder e dinheiro, guerra, crianças passando fome pelos lugares em subdesenvolvimento no mundo, muitas tragédias humanas naquele final de ano. Lembrou-se que, mesmo se compadecendo de toda dor que lia ali, precisava manter um pensamento positivo de que ainda havia esperança. Só assim não se auto destruiria. Pelo menos em sua vida as coisas precisariam dar certo. Se ele não podia mudar o mundo, poderia mudar a vida das pessoas ao seu redor com pequenos gestos e ações. Começaria por Charlotte. Abriu o seu Instagram e viu que ela havia postado uma foto em seu feed com um cachorrinho. "Denver, meu novo assessor" Benjamin sorriu realmente contaminado pela energia daquela foto. Aquela menina realmente gostava de acolher outros seres perdidos. Pensou ao ler mais abaixo onde ela explicava melhor o encontro com o bichinho. Mesmo feliz pelo gesto dela, Benjamin se sentiu um pouco incomodado. Charlotte claramente era uma garota empática e solidária. Mas não eram essas características que o incomodavam nela. Charlotte, com sua alma boa, apenas o salvou naquela noite por pura pena e solidariedade. Nada mais! E ele já criando uma história bonita com ela dentro de sua cabeça perturbada. Ela faria o mesmo por qualquer um. Porém, isso não diminuia em nada os fortes sentimentos que estavam nascendo dentro dele. Viu também que ela colocou nos storys um pequeno vídeo de sua apresentação onde a plateia cantava junto alguma música do Alan Jackson. Ela tinha um talento imensurável mas tinha a sensação que ela não acreditava tanto em si. Talvez por falta da ambição que sempre sobrou nele. Sim, Charlotte era o seu completo oposto.

Saiu às nove para a Clifford Incorporation, onde tinha diversos compromissos naquele dia. Na reunião do dia anterior, deixou claro a sua contrariedade ao projeto de demolição dos prédios da rua de Charlotte.

- Mas, Sr Clifford, não há melhor lugar para esse empreendimento. Será um centro comercial com restaurantes e cinemas bem no meio de Nova York.

- Se não tiverem outros lugares, abortem o projeto! Ou procurem outra metrópole para fazê-lo. - respondeu ao seu diretor de planejamento que o olhava alarmado.

- Sabe quanto dinheiro perderemos com isso? - perguntou envermelhando a veia do pescoço.

- Não me importo! Já ganhei dinheiro suficiente em Nova York e não preciso jogar mais prédios no chão para provar que somos a maior construtora do país. Sejam criativos! Outro arranha céus? Por que não diversificarmos os projetos? Restaurações, aproveitar prédios que estão abandonados e montar um senhor projeto de revitalização. Os europeus fazem isso de forma excepcional e nem por isso ganham menos dinheiro.

Todos o olharam com atenção. Alguns com ódio e outros refletindo sobre as mudanças propostas.

- O meu posicionamento é esse! Pretendo tirar alguns dias de férias mas sobre esse projeto específico eu estarei atento. Por hoje é isso!

Os homens engravatados saíram da sala de reuniões com os semblantes cansados e assustados. Benjamin sempre os cobrou agressividade nas negociações e grandiosidade nos projetos. Eram conhecidos por isso e aclamados. Agora, ele pretendia mudar a essência da Clifford.

Benjamin não se importava em nada com aquelas caras assustadas. Era a sua construtora! Quem não estivesse de acordo com a nova cultura, que ele estava prestes a inserir, que procurasse um outro lugar para trabalhar.

- Estou genuinamente orgulhoso! - disse Peter Felldman, seu advogado e assessor jurídico enquanto entravam em sua sala. Talvez o único ali naquele meio que se assemelhasse a um amigo. - Você bateu com a cabeça ou está seguindo alguma religião oriental? Porque aquele cara na reunião, definitivamente não é você.

- Está sendo sarcástico ou genuinamente sincero? - perguntou se sentando em sua mesa.

- Você sabe que estou sendo sincero, Ben. Há tempos que conversamos sobre a necessidade de desaceleração e você sempre discordou do meu ponto de vista. Qual o motivo dessa mudança?

- Não têm motivos. Só que eu me cansei do meu estilo de gestão. Já me enriqueci, enriqueci todos que estiveram comigo. Preciso de novos projetos que façam realmente os meus olhos brilharem. - não falaria nada sobre o ocorrido nem com Peter e com ninguém ali dentro. Apenas Charlotte e seu psicólogo saberiam sobre a sua noite sombria.

- Bom, conte com o meu apoio!

Agora, um dia após a fatídica reunião, Benjamin olhava lugares em que quisesse visitar. Lugares que o dinheiro ainda não o havia levado. Pequenos lugarejos com história e gastronomia boa. Pensou em ir para algum lugar pouco explorado da Europa mas não queria ir no inverno. Talvez esperasse o Natal passar para se decidir. Focou novamente a atenção em seus contratos.

Ao final do dia daquela sexta-feira, ao invés de ir para algum bar como havia se acostumado a fazer em seu processo de autodestruição, Benjamin foi direto para casa, onde pediu comida árabe e maratonou alguns clássicos do cinema. Mas se sentia sozinho naquele apartamento enorme e sem vida. Abriu o Instagram novamente e mandou um direct para Charlotte, respondendo ao seu story.

" Precisa acreditar em você. Você é incrível!"

Esperava que ela não fosse respondê-lo. Na melhor das hipóteses, demoraria alguns dias. Charlotte não aparentava ser uma pessoa que ficava o tempo inteiro em suas redes sociais. Temeu estar sendo invasivo. Porém, para a sua surpresa, uma hora depois sentiu o seu celular vibrando.

" Benjamin? Estou surpresa por ter me encontrado por aqui. E feliz por ter gostado. Foi uma apresentação realmente incrível, com público receptivo. Espero que esteja bem."

Ele se endireitou na cama e pensou em como responderia.

" Eu estou bem. Tenho ótimas notícias sobre o seu prédio mas contarei pessoalmente."

" Então não devo procurar um abrigo quando retornar?"

Benjamin sorriu respondendo.

"Não, Charlotte! Sua moradia e dos seus vizinhos está garantida. Te dou a minha palavra."

No Estado do Tenneesse, enquanto se arrumava para outra apresentação, Charlotte sorria incrédula. Ele realmente cumpriu o que havia prometido, mesmo que ela não tivesse pedido nada a ele. Quantos milhões de dólares aquilo teria custado para o seu bolso? Pensou.

"Obrigada, Benjamin! Mas espero que não tenha feito isso apenas em agradecimento a mim. Espero que esteja refletindo de fato a sua existência."

Alguns minutos depois ele respondeu.

"Se te deixa mais confiante em mim, voltei para a terapia, estou tomando meus remédios, não tenho ingerido álcool e estou pensando em umas férias em lugares menos luxuosos. E estou mudando a cultura da Clifford no sentido de não acabar com o patrimônio histórico de Nova York."

Charlotte riu com Denver ao seu lado no camarim.

"É um upgrade, com certeza. Fico feliz por você. Tenho que cantar agora."

Benjamin sorriu triste, já sentindo a despedida.

"Um ótimo show! Espero te ver em breve. Abraços no Denver."

Charlotte riu por saber que ele estava stalkeando suas fotos.

" Se cuida!"

Respondeu deixando o celular de lado para trabalhar. Como na apresentação anterior, o público da noite a acolheu muito bem e ela voltou feliz para o hotel.

Benjamin deu play novamente em seu filme "A lista de Chindler", tentando tirar Charlotte de sua mente.

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