Capítulo 7 - A Noite dos Mortos Vivos (Parte 2)

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   General estava morto. O cãozinho não fazia mais parte da Família Cassarano.

   Os garotos haviam cavado uma cova ao lado da cabana e o enterrado ali. Puseram uma grande pedra para marcar o local e se despediram do pobre animal. Paulo ia lá todas as manhãs, jogava a bolinha de tênis na pedra e a pegava novamente, como se ainda brincasse com General.

   Fabrício sentiu a perda do animal, mas não havia alternativa. Estavam no fio de uma navalha naquela noite, qualquer deslize e todos sairiam cortados.

   O destino ainda brincava com os garotos, e cada vez mais jogava com suas vidas.

   Fabrício havia planejado a fuga de Thomas, visando o bem dos rapazes, mas General havia estragado seus planos. Thomas agora estava no porão, já haviam se passado três semanas. Mais uma e eles sairiam dali. Mas para isso General Thomas precisava estar vivo até segunda ordem. Com o pescoço costurado de forma grosseira, ataduras sujas e febre alta, o homem permanecia no porão delirando, agora em um colchão no chão. Estava esbranquiçado e tinha os olhos amarelados. Certamente estava muito debilitado pela perda de sangue e pela falta de cuidados médicos mais assertivos. E a idade avançada não o ajudava muito na recuperação.

   Os dias eram tranquilo, mas durante as noites o inferno subia até a cabana. Thomas sentia dores e a febre fazia com que delirasse. Ele gritava e praguejava o mais alto que podia, então perdia as forças e dormia por dias seguidos.

   Lá fora da casa a noite chegava. Fabrício estava apoiado no balcão da cozinha, fitando o telefone, esperando a ligação. Mas ela nunca vinha, e ele continuava a esperar e esperar. Dia após dia ficava ali, horas às vezes, na mesma posição, bebendo vinho e olhando para o telefone com seus olhos de velho.

   - Fabris, vamos ver outro filme hoje. Você vem? – Henrique falou, passando pela cozinha.

   Fabrício baixou o copo e suspirou.

   - Onde estão os caras?

   - Lá em cima. Quer que eu chame?

   - Não, é melhor conversarmos só nós dois. Você sabe para onde estamos indo?

   Henrique se espantou.

   - Como assim? Aqui na Itália?

   - Não, H. Na vida.

   - Não tenho ideia.

   - Mas eu tenho.

   - E...

   - Vamos morrer.

   Agora Henrique estava curioso.

   - Quem garante... No que está pensando? – limpou os óculos e colocou a pipoca no microondas.

   - Na morte. Só penso nisso desde que matei General. Sonhei com isso. Sonhei com um demônio que vive dentro de mim, e isso não me deixa em paz. A morte é certa. Você pode fugir de tudo na sua vida Henrique, menos da morte.

   - Dom, relaxa, todos nós temos nossos demônios.

   - Sim, mas o de vocês não matou um homem a sangue frio e sorriu no dia seguinte.

   Aquele argumento era imbatível, pelo menos para Henrique.

   - Você ta certo. – se entregou Henrique, enquanto lavava alguns copos para serem usados na sessão que começaria dali a alguns instantes – Acho que você tem que esquecer essas coisas por alguns momentos do seu dia. É como... Sei lá... Seria como marcar uma hora onde é proibido ser Dom Fabrício, e ser apenas Fabrício. Entende? – retirou as pipocas do microondas.

Família Cassarano (por Marco Febrini) (Sem revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora