Capítulo 4

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Lembro-me de todas as vezes que, com o coração aberto e uma esperança quase ingênua, tentei ser amiga do Simon. A cada tentativa, porém, era como se eu estivesse batendo contra uma parede intransponível de desprezo. Simon não apenas me afastava, mas o fazia com uma arrogância que queimava, como se eu fosse indigna até de tentar. Seus olhos, sempre carregados de uma frieza distante, me atravessavam como se eu fosse invisível – ou pior, como se minha presença fosse um incômodo.

Mesmo assim, eu persistia. Talvez porque visse algo mais profundo em seus olhos, uma dor que eu compreendia, a perda de sua mãe e a necessidade de ter que viver rodeado por pessoas que foram a causa do sofrimento dela, após descobrir a traição. Eu sentia que ele precisava saber que eu o compreendia, que ele não estava sozinho. Mas o que recebi em troca foi uma rejeição que parecia alimentar o vazio dentro dele.

Lembro-me nitidamente do Dia das Mães, o primeiro após a morte da mãe de Simon. Enquanto todos ao redor pareciam envoltos em uma bolha de felicidade – minha mãe e Rick riam, trocavam presentes, como se nada estivesse fora do lugar –, eu o vi. Simon estava sentado à margem de tudo, os ombros curvados, o rosto semi-encoberto, mas eu percebi as lágrimas que ele tentava esconder. Era como se ele estivesse desmoronando por dentro, enquanto o mundo ao seu redor fingia que tudo estava perfeito.

Algo dentro de mim se quebrou ao vê-lo assim. Eu sabia que ele estava ferido, que a perda tinha deixado cicatrizes profundas que ninguém parecia enxergar. Sentindo um impulso incontrolável de consolá-lo, me aproximei, tentando oferecer um pouco de conforto em meio ao caos que ele sentia.

— Oi, Simon. Posso me sentar aqui com você? — Ele levantou o olhar, seus olhos ainda vermelhos das lágrimas, mas sua expressão se fecha imediatamente, como se tivesse erguido uma muralha invisível entre nós.

— Não. Saia daqui.

— Eu só... achei que você poderia querer companhia. — Ele solta uma risada seca, sem qualquer traço de humor. E em seguida, vira o rosto, olhando para o horizonte, como se eu nem estivesse ali.

— Posso te dar um conselho? — Perguntou após alguns instantes. Aquela era a primeira vez que ele me dirigia a palavra com algo além de desprezo, então assenti, tentando conter a esperança que se acendia dentro de mim.

— Vai cuidar da sua própria vida e para de encher o saco dos outros. Sabe o que seria ainda melhor? Nunca mais fale comigo. Nunca mais. Porque eu vou fazer questão de ignorar cada palavra sua. Entendeu? Agora some daqui.

As palavras foram duras para uma criança ouvir, e isto me consome até hoje, pois daí para frente, as coisas só pioraram.

Balanceei a cabeça, como se o gesto pudesse afastar essas memórias incômodas. Eu não estaria sendo a sua monitora numa tentativa desesperada de me aproximar. Desta vez, era por mim. Eu precisava daquela indicação, e era só isso que importava agora. Não era uma questão de querer ajudar Simon ou de tentar, mais uma vez, ser sua amiga. Era uma questão de sobrevivência – minha própria sobrevivência.

Enfim, por  algum motivo, optei por vestir um vestido preto que abraçava suavemente cada curva do meu corpo. Não era vulgar, mas tinha um toque de elegância que eu sabia que atraía olhares. Um pouco de corretivo para as olheiras, um toque de pó compacto para uniformizar a pele, e finalizei com um gloss que fazia meus lábios brilharem sob a luz suave do quarto.

Quando olhei no espelho, um sorriso satisfeito surgiu em meus lábios. Eu estava, sem dúvida, bonita.

Desci as escadas lentamente, tentando parecer casual, mas sabendo que minha mãe estava me observando. Ela me olhou dos pés à cabeça, levantando uma sobrancelha em aprovação.

O meu meio- irmãoOnde histórias criam vida. Descubra agora