dois

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A risada de Hélio se torna um eco frágil dentro do quarto. O som é acolhedor.

Paz. Se a paz tivesse uma estrutura sonora, seria como a risada de Hélio.

Ele se diverte enquanto eu o carrego como se fosse um saco. Para ele o mundo é um mar infinito de possibilidades e diversão. Tudo é uma grande aventura. O coloco de pé sobre a cama e ele salta como se fosse voar a qualquer momento. Não consegue ficar parado um segundo sequer. Às vezes acho que nunca vou conseguir acompanhar seu ritmo.

— Hora de dormir.

O anúncio é feito com cautela enquanto eu ajusto a colcha da cama com estampa de carros. Ele se joga sobre o colchão e suspira alto. Como se todo o ato fosse um grande sacrifício. Não chega a ser dramático, mas é muito atuante.

— Mas eu nem tô com soninho.

A reclamação vem acompanhada de um bocejo longo e acho graça diante da mentira nada convincente. Já são quase onze da noite e mesmo com o dia agitado, ele ainda passou horas brincando e desenhando.

— Eu sei, mas para crescer e ficar forte, você precisa dormir.

Uso a mesma desculpa que Urbi. É a sua tática toda vez que ele reclama sobre a hora de dormir. Sempre funciona.

— Pra ficar forte ingual você? — questiona sonhador quando eu o pego de novo e o deito sobre o colchão.

— Você provavelmente vai ficar mais forte. — respondo a questão levando-a na maior seriedade possível.

— Eu quero ser mais forte! — ele gesticula levantando as pernas e os braços para o ar, ainda inquieto sobre o colchão.

— Então é melhor dormir logo.

Ele parece convencido ao se aconchegar no travesseiro. Lhe entrego o boneco do Thor, seu personagem favorito, e ele o agarra como se fosse um urso de pelúcia.

— Tio Nathan, conta uma história? — o pedido vem com um olhar ansioso.

Me seguro para não fazer uma careta descontente.

Descobri que sou um péssimo contador de histórias, no fim das contas não se pode ser bom em tudo. Na minha última tentativa, Hélio perdeu o sono se questionando várias coisas sobre o pé de feijão e de como o gigante deveria ser amigo do Thor, dos vingadores. Urbi passou o restante da noite rindo da minha ínfima tentativa.

— Que tal eu ficar aqui até você dormir? — proponho com a esperança de escapar da missão que é lhe contar uma história.

— Você fica? — ele pergunta ansioso.

— Claro! — respondi bagunçando seus cabelos e ele riu divertindo-se.

Resolvo me acomodar na cama e lhe fazer companhia até que o cansaço vença e leve a melhor. A sua cama é pequena para os meus mais de 1,80, é estreita e consigo com muito custo acomodar eu, Thor e Hélio.

Ponho os braços atrás da cabeça tentando ficar confortável e abrir espaço para o Hélio. Inquieto como sempre, ele deixa o boneco de lado e deita de bruços para me encarar. Canta baixinho uma música que não conheço. Então se estica até alcançar meu rosto e deixa a mão direita brincar com minha barba rala depois de alguns dias sem fazê-la.

Seu olhar me encara divagativo entre cantarolar a música e brincar com os pelos em meu rosto. Ele boceja várias vezes seguidas, os olhos pesam tentando ficar firmes. Evito encarar seus olhos, pois se o faço por minutos seguidos consigo ver um pouco dela nele.

Meu Doce PresenteOnde histórias criam vida. Descubra agora