Desabafo

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Estava vivendo o maior conflito da minha vida. Pela primeira vez minha família tinha me visto surtar de forma violenta. Meu pai sabia do meu problema em outras escolas, mas também nunca tinha visto, pessoalmente, eu expressar qualquer comportamento mais conflituoso. 

No entanto, ali estava eu agora: na casa do meu... nem sei como defini-lo, depois de ter batido em alguém numa festa de família. Se meu pai já ficava chateado se eu falasse um palavrão, imagina como ele estava depois daquele circo inteiro. Não queria nem pensar no que ele faria comigo.

– Gostou mesmo dos meus produtos de blood care, né? – Felix brinca e eu sorrio, enquanto ele cuida do meu nariz. Zach era tão fraco, que mesmo me pegando desprevenido e me dando um soco com toda a sua força, não tinha conseguido quebrá-lo. Patético. 

– Um mata leão? – questiono. Felix quase me desmaiou pra me separar da briga. 

– É a técnica que aprendi nas ruas com um garoto que lutava, desculpa. – é o que ele responde e eu dou de ombros. – Não podia deixar aquelas pessoas te olharem daquela forma sem fazer nada. 

– Não sei como vai ser quando voltar pra casa agora. – comento, pensativo. 

– Você não fez nada de errado. Quer dizer, nada que mereça tanta revolta vinda do Zach. Acho que ele criou um foco em você, por se sentir rejeitado pela Beth. Inveja, talvez...

– Não queria lembrar eles o motivo pelo qual as pessoas têm medo de mim. – meus olhos se enchem. 

– Nem tudo está em nosso controle. – ele me puxa pra si, dando um beijo na minha testa, depois de terminar a sessão médica e me aconchega em seu corpo. Era muito bom abraçá-lo.  

Ah alguns anos atrás, pra defender a minha irmã, quebrei o nariz de um menino da turma dela. Não me arrependo nem um pouco do que fiz, mas desde então, ser tratado como um animal carniceiro me deixava pensativo. Todas as meninas com quem eu tinha me relacionado falavam a mesma coisa: elas tinham interesse na minha "pegada" e pra mim era fácil apenas não me importar. 

Pelo menos, dessa forma, eu poderia demonstrar que não era resumido apenas a minha força, certo? Parando pra analisar, tudo que fiz na vida envolvia minha aparência intimidadora... menos o momento em que estávamos. Felix me fazia cafuné, enquanto eu me mantinha pensativo em seus braços. Ele estava em pé e eu sentado em sua escrivaninha – a cama seria baixa demais pra ele me "consertar".

– Senti constantemente como se fosse um brinquedo. Que quando dá problema, as pessoas descartam. – Felix comenta. – Quando meus pais descobriram que o Yohan ia nascer e perceberam que não ia dar pra cuidar de dois filhos, me deram pro meu avô. Depois, quando eu cresci e não aguentei mais ser tratado como um miserável, meu avô me deu pros meus pais de volta. Meu pai não aguentava a nossa relação e veio embora. Eu fiquei com a minha mãe. Ela não aguentou ficar apenas comigo, não era suficiente pra ela lidar com aquela pessoa que ela sequer criou... e então ela se matou. Tenho medo de ser descartado de novo, jogado em uma clínica, por isso me esforço tanto pra não fazer as coisas que meu impulso manda. – olho para Felix, que me observa também. E então uma lágrimas solitária e dolorida sai de seu olho e eu limpo com meu dedão.

– Seus pais se separaram pelo o que aconteceu? 

– Sim, mas não culpo meu pai. Quando voltei, com 10 anos, eu rebatia tudo que ele dizia, até se fosse um "o jantar está pronto". Pra maioria das pessoas é obrigação do pai aguentar, mas imagina passar 5 anos sem conseguir conversar com alguém e de repente a pessoa deixa outra em coma. Quando ele me perguntou se tinha motivo, automaticamente eu fiquei com raiva de novo, não consegui me expressar, então engoli tudo de novo e aceitei a pior penalidade que puderam me dar. – ele explica e eu respiro fundo. 

ELO - (ROMANCE GAY)Onde histórias criam vida. Descubra agora