Sorriso

...

Desde muito pequena fui instruída sob os caprichos da alta sociedade. As lições de etiqueta sempre me ocupavam boa parte do tempo. Poderia dizer, facilmente, que a educação e o respeito formavam o pilar central de minha família.

Mas as vezes, a família não é aquilo o que pensamos ser...

Passados alguns dias da atitude instável de meu pai, decidi, por conta própria, me aventurar cada vez mais pelos campos floridos próximos ao rio.

Em princípio minhas escapadas não levantavam suspeitas, entretanto, com o passar dos dias percebi que nossa empregada me vigiava cada vez mais até que, em algumas semanas, a mesma começou a questionar-me cada um de meus passos.

Ainda me recordo de seus olhos cinzentos e opacos toda vez que lhe dava a desculpa de estar a colher novas flores para os arranjos de minha mãe...

No fundo acredito que ela soubesse que tudo não passavam de mentiras ingênuas, mas por pena, permitia que eu vivesse minha liberdade onde, ao poucos, aquele tão imprudente sentimento ia crescendo cada vez mais em meu peito.

...

Era uma manhã calma de sábado, terminava minhas lições quando recebi a visita de meu pai em meus aposentos. Atrás dele, minha mãe estava oculta sob um de seus pomposos chapéus franceses, os mesmos que costumava usar quando ia para a cidade.

—Estão de saída?

Indaguei com a ansiedade incendiando meu peito.

—Sua mãe e eu temos assuntos a resolver.

—Quais assuntos?

—Nada que deva se preocupar querida, mas até voltarmos não quero que saia de casa, entendido?

—É claro papai...

—Ótimo docinho, voltaremos em breve, prometo trazer alguma coisa para você!

Retribui o sorriso gentil e esperei até que seus passos se distanciassem. Quando tive certeza de que estava sozinha corri para os campos sentindo a brisa suave acariciar meu rosto.

O caminho até a cidade era longo e por motivos pessoais nossa empregada havia se ausentado. Era o dia perfeito para explorar os morros além do rio!

Quantas aventuras eu não iria desbravar? Quantas pessoas novas eu finalmente conheceria? Seus costumes, suas vestimentas, suas danças, suas comidas...

Naquela manhã eu estava radiante. Eram tantas as possibilidades! Porém, com a cabeça longe, não me atentei nas rochas que cortavam o rio, principalmente no lodo que as tornavam escorregadias.

A queda foi certeira.

Sem saber nadar e com uma dor latejante em meu tornozelo eu estava sendo levada cada vez mais pela correnteza.

Será que toda a curiosidade e anseios por ser livre valeriam uma morte tão horrível quanto o afogamento?

Já sem forças para manter o rosto na superfície estava prestes a me entregar aquele infeliz destino quando, por intervenção divina, senti algo agarrar minha cintura trazendo-me de volta ao calor do sol.

—Pelos céus! Você está bem?!

Permita-se imaginar com complacência o que vi, talvez assim, entenda melhor o motivo pelo qual aquela manhã de sábado ter mudado para sempre minha vida...

A carta de LohrenOnde histórias criam vida. Descubra agora