Capítulo 06: Se persisterem os sintomas um médico deverá ser consultado

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- Qual o problema daquele cara com você? - Minho indagou, ainda pensando sobre o que aconteceu horas antes. Changbin estava organizando os travesseiros na sala, onde passariam a noite. Ele estendeu um edredom no chão limpo, colocou cerca de três travesseiros encostados no sofá e jogou os cobertores que Haejin pegou para os garotos.

- Sei lá. - Deu de ombros, pegando a vasilha grande de pipoca na mão de Minho. - Ele é estranho. - Decidiu que aquele era o melhor adjetivo para definir quem era Chan, porque ele era muito estranho. E deixava Changbin confuso, totalmente confuso.

Minho se juntou a ele no chão após pegar o refrigerante na geladeira, ele usava casaco e calça de pijama. Seu pai, Haejin, já tinha ido para a cama, alegando cansaço. Ele era um homem de meia idade de cabelos grisalhos, olhos pretos profundos iguais aos de Minho e rosto marcado pelo tempo, Changbin sempre o achou muito parecido com Minho, em questão de personalidade e aparência, principalmente agora que o amigo estava crescendo. Ele estava cada dia mais parecido com o pai, e eles tinham os mesmos costumes, manias e hábitos. Changbin gostava de provocar Minho dizendo que eles eram a cópia um do outro, ciente que o Lee odiava ser comparado, mesmo que fosse seu pai. Mas ele sabia que não era um insulto, Haejin era um bom homem, calado e meio distante, mas um bom homem.

Os dois garotos sentaram no chão encostados no sofá de frente para a televisão presa à parede, as luzes apagadas e o balde de pipoca no meio deles. Changbin ainda usava a camisa de Chan, só trocou a calça moletom pelo pijama, porque era mais confortável. Mas permaneceu com a camiseta, alegando não estar com frio o suficiente para trocar. Ou talvez fosse só preguiça, ou talvez ele tivesse gostado mesmo da colônia que Christopher usava. Agora, mais ciente que aquela roupa o pertencia, Changbin conseguia sentir o cheiro do australiano em cada centímetro do seu corpo: pelos braços, pescoço, por tudo. Era enjoativo, doce e irritante, mas Changbin parecia inebriado, incapaz de querer se livrar. Iria perguntar a marca do perfume quando voltasse para casa, talvez ele estivesse ganhando interesse - pelo perfume, obviamente.

-Ele não é um cara ruim. - Changbin prosseguiu, se servindo de um copo de refrigerante, entregando um a Minho logo após, que aceitou de bom grado. - Ele é meio estúpido, metido e estranho, mas não é ruim. Vai ver foi a criação. - Novamente balançou os ombros, sem saber direito o que mais poderia adicionar para tentar defender a índole do garoto. Não que estivesse simpatizando com ele, mas Chan definitivamente não era um cara ruim.

Minho deu play no filme que estava na televisão, as vozes vindo do televisor logo preenchendo aquela lacuna de silêncio entre eles. Changbin se aconchegou ao lado do amigo, deitando a cabeça no ombro dele enquanto comia pipoca. Em algum momento, a pipoca acabou e o refrigerante já estava com a temperatura ambiente, jogado em algum lugar longe deles. Minho deitou no travesseiro e Changbin deitou sobre o braço dele, ainda aninhado no amigo. Era comum que eles sempre acabassem assim nas noites de maratona na casa do Lee, eles sempre foram mais apegados fisicamente, embora o tratamento afetuoso entre os amigos fosse mútuo, Minho podia ser tão grudento com Changbin quanto era com Hyunjin e Jisung. Ele sempre dizia que não tinha preferidos, e realmente não tinha. Embora Jisung alegasse vez ou outra que se um dia eles morassem juntos e a casa pegasse fogo, Minho salvaria primeiro Changbin, depois ele e Hyunjin.

- Não confio nele. - Minho murmurou, encarando a televisão onde o filme estava prestes a acabar. Changbin esfregou um dos olhos, meio alheio e com bastante sono.

- No Ciclope? - Indagou, confuso.

- Não, Bin. - Riu, afagando o cabelo dele. - No Chan. Não confio muito nele.

- Acho que ele também não confia muito em você e nem vai com a sua cara.

- Que bom, o sentimento é recíproco.

- Qual é? Ele é até fofo, se você tentar olhar de certo ponto.

- Pode até ser, mas ele não faz meu tipo.

- Ninguém faz seu tipo, Lino. - Eles riram, porque era verdade. Uns anos atrás, quando Hyunjin estava passando por uma crise de identidade e não sabia exatamente do que gostava ou quem realmente era, Minho compartilhou com eles que nunca havia sentido atração romântica e nem sexual por ninguém, o que resultaria nele se assumindo alguns meses depois como arromântico e assexual para os amigos. E consequentemente, Jisung também tomou coragem e contou para eles que era exatamente igual a Minho.

Changbin nunca pensou muito na sua sexualidade, mesmo após ser bombardeado com tantas descobertas por conta dos melhores amigos. Ele preferia não se aventurar no autoconhecimento, pelo menos não por agora. Sabia que tinha algo de diferente, aquele seu atraso romântico pelas pessoas não era comum, até onde sabia. Sua mãe não era assim, ela sempre estava se apaixonando por um ou por outro. Até seu pai seguiu em frente após o divórcio. Porém, ele não era como seus pais, e nem como seus outros colegas de escola, que sempre estavam metidos em relacionamentos passageiros e atrações momentâneas. Changbin podia sim achar alguém atraente - achava os amigos bonitos na própria maneira deles -, mas existia uma grande diferença entre achar bonito e ter uma atração romântica, ou sexual. Changbin não sentia isso com facilidade. Ele sempre oscilou entre não sentir nada, ou sentir muito, mas tudo dependia de como a ligação dele com as pessoas surgiam, podia demorar até que ele entendesse que aqueles flertes não eram flertes de amigo, e ele odiava ser tão atrasado assim. Quantas oportunidades não perdeu? Conheceu alguns garotos legais durante o ensino médio, mas não conseguia gostar deles daquele jeito.

E ninguém conseguia esperar até que ele estivesse pronto, por isso, deixou de lado. Atração romântica não era sua praia, e a sexual? Muito menos. Changbin às vezes acha que veio com defeito de fábrica, mas nunca diria isso em voz alta, tinha medo que seus amigos entendessem errado. Não achava que a nula atração de Jisung e Minho pelas pessoas era um erro de fábrica, pelo contrário, nunca conheceu pessoas mais normais que eles dois, mas a negação corria em suas veias, não conseguia aceitar de jeito nenhum que era daquele jeito. Por que? Não sabia. Não entendia. E sinceramente? Não dava a mínima. Se ele não pensasse no assunto, ele não existia. E também, quem sentiria atração por Changbin atualmente? Ele era pequeno, magricelo e desajeitado, além dos seus problemas de raiva, autocontrole e confiança. Changbin se achava tão medíocre as vezes que nem suportava se olhar no espelho, e talvez sua mãe estivesse certa, ele devia parar de comer tanto quando estava ansioso ou estressado.

Ele se aconchegou o máximo possível ao lado do amigo, esfregando o rosto no braço dele e se aninhando como um gatinho, e Minho não reclamou. Ele nunca reclamaria. Changbin gostava de estar com ele, sabia que Minho era confiável, seguro e muito atencioso, apesar da expressão de poucos amigos e algumas cicatrizes por mexer com motores quentes e peças de motocicletas. Queria não ter que se preocupar com o futuro, ou como faria para ganhar a vida porque seria um adulto em alguns meses. Queria ser para sempre um menino chorão e desajeitado, porque esse era ele. Changbin sempre foi muito sentimental, embora odiasse mostrar isso na frente das pessoas. Não queria ser um homem adulto, com responsabilidades de adulto e fazer coisas de adulto: como casar, ter filhos e fazer com que sua mãe tenha orgulho do homem que ele se tornou. Ele não queria nada disso.

O filme terminou e Minho desligou a televisão, deixando os dois no escuro. A casa estava tão silenciosa, confortavelmente silenciosa. Changbin foi parar nos braços de Minho, e quando fechou os olhos para dormir, acabou pensando nele. O cheiro de Chan parecia tão forte e inebriante que mexeu com a sua cabeça, e Changbin começou a imaginar estar abraçado com ele, deitado na beliche no escuro do seu quarto. Lembrou dos momentos deles juntos, das conversas no meio da madrugada, da voz baixa e melodiosa, daqueles olhos castanhos brilhantes e intensos, e de repente seu coração doeu. Doeu de verdade. Changbin ficou assustado e incomodado. Ele se encolheu na direção de Minho e agarrou o tecido da camiseta que vestia, muito confuso.

- Binie? - A voz de Minho parecia tê-lo acordado de um transe. Ele se remexeu desconfortável pelo aperto no peito e tentou respirar com calma. O que tem de errado comigo? Quis chorar, porque não se sentia bem e porque tinha medo do que aquilo significava. Ele abraçou Minho com força e desejou desaparecer dentro daquele abraço confortável. - O que foi? - Indagou preocupado, a mão acariciando o cabelo preto e macio.

- Não sei, só me abraça.

- E precisa pedir? - Changbin podia não ver, mas sabia que o amigo estava sorrindo e ele realmente o apertou de volta, o abraçando na mesma intensidade.

Meu Inquilino Australiano | binchanOnde histórias criam vida. Descubra agora