Capítulo 3| Coisas terríveis da vida.

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5 de fevereiro | domingo

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5 de fevereiro | domingo. 

Um vazio tomava conta do meu peito. 

Eu queria ficar frustada, ou sequer brava. Mas, honestamente, fiquei tão mal quanto pude imaginar que seria caso acontecesse. Débora estava grávida. Como isso pode acontecer? Seria impossível, não? 

O vento gelava meu rosto, secando as lágrimas que teimavam escorrer pelo canto dos olhos. Nunca havia me sentido tão puta com a vida.  O meu "tudo vai ficar bem " não adiantaria agora. Ficar feliz, pra que? Tudo acabou pra mim, acabou, Jessica. Seu mundo agora é dela. Sempre foi.

Acelerei a moto como naquele dia de ruína. A chuva cobria minha visão como um chuveiro gigante. Tudo estava azul, o meu declínio estava próximo. Eu já não me importava de morrer ou não, apenas queria correr como se nunca mais fosse voltar. 

Soltei os braços e por alguns segundos, me senti viva. Os respingos se rebatiam no capacete, encharcando minha roupa no tom mais negro, como um céu em meio ao furacão. Era assim que me sentia. 

A minha vida estava por um triz do fim, essa sensação de que posso perder tudo, mesmo que não tenha nada... mesmo que seja para reivindicar por amor, ou por ego. Ter algo me faz querer viver, e mesmo que o mundo se vire contra mim, eu terei essa coisa. 

Estacionei a moto em um beco escuro, onde a iluminação amarelada não alcançava. A chuva ficava cada vez mais forte, deixando uma neblina densa acima do meu pescoço. Andei até uma porta velha esverdeada, no final do beco. Passei a língua nos lábios, pensando se seria certo querer algo ali, mas ele era minha única esperança. Levantei a mão, receosa, e dei um toque na ferrugem do portão. 

- Bell, você está em casa? - murmurei. - Bell...

Recuei dois passos, ele provavelmente não estava ali. Deve estar em algum lugar, bebendo e transando com alguém. Nunca ficava quieto, e muito menos sem sexo. Caminhei até a moto, que me aguardava molhada. Eu não sei no que pensar, meu contrato estava quase fechado, se demorasse mais tempo, poderia jamais ver a luz do sol novamente. Algo estava se aproximando, consegui escutar seus passos vindo em minha direção, mas não consegui ver nada. Levantei a tela do capacete, tentando enxergar uma silhueta parada em minha frente, a pelo menos uns cinco metros. 

Seu moletom cinza com um boné preto, uma calça jeans escura e...

Minhas pernas ficaram bambas quando percebi algo reluzente em suas mãos. Não havia algo para me defender, mas a minha angústia estava em êxtase. Era meu fim, meu amado fim. 

- Demorei? - sorriu de forma medonha. - Eu vim te buscar. 

- Quem é v- você? - solucei. 

A cada três passos, ele sorria com seus olhos. Eu não fazia ideia do que ele queria, mas aceitei de forma passiva meu destino. Se fosse para morrer, que fosse agora. 

- Com licença. - parou em minha frente, me olhando nos olhos. - Eu preciso passar. 

Afastei-me, dando-o espaço. Fiquei perplexa, mas se dissipou enquanto observava seus atos. Seu corpo largo e alto se estendeu até uma caixa de papelão encharcada. O canivete rasgou o topo, deixando um miado abafado e desesperado ser despertado. Um homem daquele tamanho com um gatinho? Porra, que susto. 

- Sinto muito por ter deixado você assim. - suas mãos adentraram e trouxeram consigo um gatilho preto, mirrado e minúsculo. 

Girei os calcanhares ainda em total choque, tentei mover meus pés do chão. Parecia que algo estava a me prender naquele beco. Será que ele conhece o Bell? Será que ele sabe onde ele poderia estar? Mordisquei meus lábios, em receio de dizer algo. Acelerei meus passos, desesperada. 

- Você...vai voltar assim, toda molhada? - senti sua respiração falhar, como se houvesse dado um sorriso. 

Me arrepiei por inteiro. Uma onda subiu pelo meu corpo de forma violenta. Uma pontada no meu peito me fez chorar, como uma facada terrível. Em um desespero, a falta de ar me fez retirar meu capacete de forma brusca. Puxei o ar com força...

- Eu não queria ter te assustado. - se aproximou de mim, onde meus ossos tremiam. - Você está bem? 

Seus olhos me cortaram como adagas em meu pescoço, aquele olhar perturbador me fez sentir um medo enorme. Meu corpo queria recuar, mas presa ao chão, não poderia nem se quisesse. O capacete rolava, parando embaixo de seu pé. Os lábios ressecados não me permitiam falar...

- Não...não encosta em mim! - um peso no peito me fez murmurar. 

- Eu não quero te machucar. - de forma passiva, levou o pequeno gato ao chão. 

O pequeno felino preto se esfregava em sua perna, miando de forma constante, tirando minha atenção de seus olhos mortais. 

Eu estava aflita e desesperada. E isso era reconfortante...






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