Capítulo Dez.

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"Não troco seu ar poluído pelo pó da estrada; Aqui não tem trânsito, só tem boiada; Nosso céu é limpo e a noite enluarada [...]"
Trio Parada Dura

  Já se faziam alguns dias que José Miguel estava na estrada

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  Já se faziam alguns dias que José Miguel estava na estrada. A noite de hoje estava estrelada e a lua clareava o barracão aonde os peões passariam a noite. Eles já haviam entregado a boiada em Rio Verde e estavam retornando para casa cansados. Sem os bois para desacelerar a viagem o caminho era muito mais rápido e em um par de dias estariam novamente em Ouro Fino, mas aquilo não sossegava o peito do rapaz.

Desde sua última noite na cidade, duas semanas atrás, ele não tivera nenhuma notícia de Antonia. Ela não o avisou quando chegou em casa como ele lhe havia pedido, não ligou e também não publicou nada em lugar algum. Ele não costumava ser do tipo que checava redes sociais, mas nos últimos dias se pegava irritado sempre que ficavam sem sinal de telefonia, o que acontecia na maior parte do tempo.

Estava evitando pensar nisso no momento, mas acreditava que ela havia se arrependido do beijo que trocaram. Ele mesmo se sentia um tanto estranho quando se lembrava disso, já era um homem velho para beijar escondido atrás da igreja. Antonia ainda era uma menina e para ele fazia sentido que ela se arrependesse, as circunstâncias iam muito além da inimizade entre as duas famílias.

Nestes vários dias, não houve uma noite sequer em que ele não havia sonhado com ela. Estava parecendo um menininho apaixonado pela professora, torcendo para que ela lhe desse o mínimo de atenção. Evitou procurá-la pois queria lhe dar tempo para repensar toda essa situação, mas já havia se arrependido amargamente da decisão.

Deitado em sua rede, José apagou o cigarro que fumava no chão e alcançou seu celular no bolso torcendo para que houvesse sinal de internet o suficiente para mandar uma mensagem. Ele digitou um milhão de palavras diferentes e apagou todas elas, não sabendo exatamente o que falar para uma menina dez anos mais nova e que não o procurou absolutamente nenhuma vez. Por fim, enviou a primeira coisa que não lhe parecia tão ruim e guardou o celular novamente, cobrindo o rosto com o chapéu e fechando os olhos para dormir.

Antonia estava sentada na janela de seu quarto, os pés balançando no ar enquanto ela contemplava a noite. Desde pequena tinha esse costume e, por esse motivo, sua mãe já havia ameaçado trocar a clássica janela de madeira azul por uma com grades de ferro, para evitar que ela despencasse dali durante a madrugada e quebrasse algum osso. Isso obviamente nunca aconteceu, já que seus pais aparentemente tinham uma certa aversão em lhe dizer não.

A brisa noturna era fria e refrescava o cômodo, provocando arrepios na pele da menina. Já haviam duas semanas em que ela não escutava o berrante de José Miguel pela região e aquilo começava a incomoda-la. Era um desconforto estranho, parecia que algo estava fora do lugar e ela não sabia exatamente o que poderia fazer para organizar. Ela se perguntava o que ele estaria fazendo agora, tão distante de casa.

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