Capítulo 3

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Miranda tentou de várias formas conversar com as filhas, mas as duas pareciam irredutíveis, exatamente como a mãe. Ela não podia culpá-las - aquele comportamento era um reflexo dela mesma. Sabia disso. Sabia que as filhas estavam magoadas, e por mais que compreendesse suas razões, ver a própria personalidade espelhada nas meninas a deixava desnorteada. Sempre as encorajou a ter voz própria, a serem autônomas, a se posicionarem como ela aprendeu a fazer. Mas nada a preparou para enfrentar aquilo de frente, ver suas lições sendo aplicadas contra ela. Era como uma ironia amarga.

Suas meninas tinham apenas 10 anos, mas demonstravam uma força de caráter que ela nunca havia encontrado nem nos adultos com quem lidava diariamente. Em outras circunstâncias, Miranda estaria orgulhosa. Mas ali, naquele momento, seu coração estava apertado. Faziam horas que as meninas estavam trancadas no quarto, recusando-se a falar, a sair, até mesmo a comer. E por mais que ela fosse uma mulher forte e implacável no trabalho, sentia-se pequena e impotente diante das próprias filhas. Miranda se orgulhava de liderar uma revista com maestria, de controlar sua vida e seu entorno com precisão cirúrgica. Mas nada, absolutamente nada, a preparara para lidar com duas crianças de quase 11 anos em um momento como aquele. Sentia-se vulnerável de um jeito que raramente permitia.

Sem outras alternativas, Miranda deixou de lado o orgulho e se sentou no chão, encostada na porta do quarto que as filhas dividiam. Respirou fundo, uma, duas, três vezes, como se estivesse se preparando para um confronto - mas dessa vez, o confronto era com seus próprios medos. Quando finalmente falou, sua voz saiu baixa, como se a cada palavra sua armadura se desfizesse.

- Eu sei que estão magoadas... Acreditem, eu entendo. E, por mais que pensem o contrário, eu me importo com vocês e... eu me importo com Andrea. - as palavras escaparam com uma facilidade que a surpreendeu, quase como se tivessem estado presas por muito tempo. - É verdade que eu negligenciei meus sentimentos, e sim, eu afastei Andrea. Mas, assim como eu entendo vocês, preciso que tentem me entender também. Esse sentimento é novo para mim... e a força dele me assusta. - A confissão, algo tão raro em Miranda, trouxe um nó à sua garganta.

Do outro lado da porta, as duas ruivas estavam sentadas no chão, com as pernas cruzadas, ouvindo atentamente. Apesar da irritação, as palavras da mãe começavam a penetrar nas barreiras que tinham erguido.

- Vocês mais do que ninguém conhecem as razões para essa armadura que eu carrego. - continuou Miranda, agora com a voz um pouco mais trêmula. - Vocês sabem o que eu enfrentei para chegar onde cheguei, e isso deveria ser motivo suficiente para entenderem que, às vezes, eu... falho. Eu sinto muito por ter decepcionado vocês. De verdade. Mas a vida real não é tão simples quanto os filmes de romance que vocês assistem. A vida real é complicada, é difícil... E nem sempre sei o que fazer.

Por um instante, o silêncio tomou conta do corredor, enquanto Miranda lutava para recompor a compostura que sempre mantinha. Ela limpou a garganta e, com um esforço final para manter a firmeza, acrescentou:

- Espero que possam entender o meu lado. - Miranda se levantou lentamente, sacudindo a poeira imaginária das mãos. - Não demorem a sair. O almoço de vocês está no forno. E isso não é um pedido.

Ela deu dois passos firmes para longe da porta antes de hesitar. Sabia que não seria tão simples reconquistar as filhas, mas pela primeira vez em muito tempo, Miranda se permitiu acreditar que, talvez, suas palavras tivessem encontrado algum espaço nas mentes delas. Do lado de dentro, as duas conversavam sobre tudo que ouviram da mãe.

Miranda desceu e sentou-se cuidadosamente no sofá da sala, seus olhos fixos na escada enquanto esperava, ansiosa, ouvir os passos das filhas. No entanto, o som nunca chegou. Um silêncio angustiante preencheu o espaço, deixando claro que suas palavras não surtiram efeito. Ela respirou fundo, sentindo o peso da frustração e do desespero. Sabia que tinha uma última carta na manga. Com mãos ligeiramente trêmulas, discou o número de Nigel mais uma vez. Quando ele atendeu, sua voz não tinha mais o tom controlado de sempre. "Nigel, preciso que você fale com Andrea... implore, se for preciso. Diga a ela que volte e, por favor, fale com as meninas. Não importa se ela não quer falar comigo!" - Miranda dizia, quase em súplica. "Ela pode me ignorar para sempre, se isso a faz sentir melhor, mas eu preciso que ela fale com as meninas. Já se passaram horas, Nigel. Elas não saem do quarto." Sua voz, normalmente firme, agora estava tingida de uma vulnerabilidade rara.

When The Ice Melts - MirandyOnde histórias criam vida. Descubra agora