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     𝕌m teto de tábuas de madeira apodrecida repleto de buracos que são difíceis de se ver no escuro da noite. A superfície macia da qual estou deitado faz minha pele coçar.

   Levanto de súbito após recuperar a consciência. Arquejo, o coração palpitando. Levo a mão ao peito.

   Estou em um quarto escuro, aparentemente abandonado. Uma janela pequena está entreaberta, deixando passar apenas alguns feixes do luar.

   A luz fraca de uma vela em cima de um criado mudo ilumina as quatro paredes claustrofóbicas de cedro. Há uma porta ao lado de um armário do mesmo material.

   Não faço a mínima ideia de onde estou, mas sei que preciso ir embora quanto antes.

   Pulo para fora do colchão da cama enferrujada, avanço até a única porta do quarto. Antes de alcançá-la, meu pé é puxado por algo, e tombo no chão.

   Observo, por cima do ombro, uma corda amarrada nas grades da cabeceira da cama que segura minha perna.

   Puxo-a com força, a cama não se move mais que centímetros, os quatro pés arranham contra o chão de madeira. Quando percebo que não vai soltar, levo a mão até meu broche na intenção de transformar o cristal na espada que a corte.

   Mas ele não está, o broche é apenas um molde dourado e vazio. Ele o pegou, tenho certeza disso. Não me abalo, posso simplesmente invocá-lo quando precisar. Deve estar com ele nas mãos, percebe se eu simplesmente invocar agora.

   Passos começaram a soar lentamente, o som cada vez mais alto. Contenho as mãos trêmulas. Ele está vindo.

   Observo rapidamente algo no cômodo que possa usar contra ele. A corda é inútil enquanto amarrada. A vela poderia queimar tudo e me deixar sem saída, mas poderia queimar a corda, claro.

   Inclino o corpo até o criado mudo, me esforçando para não fazer barulho, os passos pesados ficam cada vez mais próximos. A cera derretida escorre um pouco para fora do castiçal quente, tomo cuidado para não me queimar enquanto estou trazendo a vela para perto.

   As duas pontas da corda queimam lentamente, cada fio se arrebentando, até se partirem. Assopro os restos para evitar possíveis acidentes.

   A sombra de um par de pés para repentinamente em frente à fresta da porta, não faz um som sequer. Apenas o barulho de meus batimentos domina por instantes.

   Aproveito o tempo efêmero. Estico a corda, agilmente me posicionando para o outro lado, de costas para a janela, um ângulo ótimo para enforcar seu pescoço.

    A maçaneta metálica se move, a porta range. Prendo a respiração, os braços firmes para pegá-lo. Quando aberta, a porta revela um par de botas, a maçaneta retangular rendeu ao peso da alça de uma bolsa de couro. Não há ninguém.

   Enrijeço o corpo ao ouvir barulhos vindos da janela. Rangendo ao ser aberta, lentamente. Outra respiração preenche o cômodo.

   — Aprendiz real do príncipe, não é? — A voz suave, finória, um tanto familiar se aproxima.

   Permito-me olhar para trás, hesitante. Sua sombra está agachada sobre o parapeito, como se estivesse pronto para atacar sua nova presa.

   A figura desce e caminha em direção à luz da vela, a cera quase totalmente derretida. Os passos cortam ao chegar perto o suficiente para que eu não possa atacá-lo, o sorriso de canto sarcástico que passei a odiar.

   Mesmo não querendo, as memórias de sua imagem me vêm à cabeça. Os cabelos ruivos acobreados e engrenhados, as roupas velhas recosturadas; as bordas do capuz bege manchadas por um vermelho-escuro, sangue de suas vítimas. As luvas escuras de couro cobrem dos dedos até os pulsos.

A Queda de AhasaliaOnde histórias criam vida. Descubra agora