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      — 𝔼m quantas missões você já esteve, Lanye? — Perguntou ela enquanto punha uma bandeja de prata que segurava duas xícaras e um bule à mesa. O metal refletia o brilho do sol em suas tranças escuras e curtas.

— Bem… — Eu balançava a xícara com chá quente que havia pegado, olhando para os cantos enquanto tentava me lembrar, reparando na reorganização das estantes e no cheiro familiar dos livros da biblioteca desde a minha última visita.

— Sem contar quando nos conhecemos, umas cinquenta nos últimos cinco anos. — Beberiquei o chá, satisfatoriamente quente, lembrando do ano em que a conheci.

Fui enviado juntamente à guarda real para proteger a instituição de uma ameaça de ataque. No final, nada aconteceu. Fiquei feliz por não acontecer.

Haya serviu-se com chá e deixou o bule sobre a mesa. Ela usava um vestido lilás simples, pouco adornado, as mangas curtas um tanto recheadas; os sapatos da mesma cor.

Deixava claro que fora feito justamente para aquela ocasião. Diferentemente de mim, ela jamais repetia seu guarda-roupa. Era de se esperar da filha do diretor de uma escola de magia tão prestigiada e influente quanto a Exydria.

Sua pele escura como café enfatizou o brilho no olhar, que se perdeu vagando pelas imagens que inventava sobre o mundo fora daquele lugar, segundo as descrições que a dei.

Quase me culpei por contar, mesmo que ela pedisse sempre.
Sabia que não poderia fazer nada a respeito, mas não sentia ser justo com ela contando sobre Ahasalia inteira quando ela sabia, tão bem quanto eu, que nunca sairia daquela escola, por mais que desejasse.

Mantendo a compostura, ela se levantou no mesmo instante que minha xícara ficou vazia, segurando o bule de chá. Sorriu simpaticamente, como fazia com todos.

Eu sabia, porém, que fazia isso para compensar sua origem meio-humana por parte de sua mãe, da qual se parecia muito pelo que me disseram. Ela faleceu no parto de Haya, há quinze anos.

Quinze anos. Estava presa naquele lugar sua vida inteira. Por mais que tentasse fingir ser uma ahally — o que seu pai incentivava —, suas orelhas redondas e ausência de asas limitava o avanço das mentiras. Relutante, precisei admitir que me sentia melhor com essa semelhança entre nós.

Levantei a palma da mão em sua direção antes que pudesse encher a xícara novamente.

— Tenho que ir agora. — dei um meio sorriso envergonhado e me levantei. — O príncipe não costuma tolerar atrasos nas reuniões.

Ela sorriu fracamente, voltando o olhar triste para o chão. Brincava com os dedos.

— Certo, certo. Você tem que obedecer seu superior, e eu o meu. — Deu uma risada nervosa, começou a acelerar a cada palavra que dizia. — Mas, eu não seria um incômodo se pudesse ir em uma missão com você apenas uma vez, seria? Quero dizer, isso me ajudaria a aprender…

Soou um sino que a interrompeu. No mesmo instante, suas costas enrijeceram, a expressão voltou a ser impassível, pareceu até mesmo parar de respirar. Um dos funcionários da escola vestia um terno violeta e preto e segurava um sino dourado.

— Senhorita Damsean, encerraremos por hoje. Vamos andando ou estará atrasada para a aula prática de encantamento avançado. — Avisou com um tom rígido, áspero, sem olhar nos olhos. Acabei lembrando da figura de Smurk Damsean, uma das poucas presenças de quem conseguia sentir medo.

Haya virou os olhos verdes-lima para mim, quase como implorado em silêncio. Sem a intenção de magoá-la, segurei seu ombro e afirmei, com a cabeça, para ambos seguirmos nossos caminhos.

A Queda de AhasaliaOnde histórias criam vida. Descubra agora