Capitulo 6

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A saudade de alguém que você tem a plena certeza de que nunca, 𝘫𝘢𝘮𝘢𝘪𝘴, vai voltar, é uma merda!

Eu costumava achar que era intocável, não literalmente, é claro! Mas eu nunca considerei a ideia de que alguma coisa um dia podia me arrancar cada pedacinho meu, porque achei que era intocável.

Você nunca acorda de manhã e acha que vai levar um tiro, ou que vai ser assaltada, ou que vai receber a notícia de que sua irmã está com câncer em estágio avançado. Não é?

Mamãe dizia que eu não sabia o que era a morte, e eu achava aquilo uma besteira. A morte era o nada, uma escuridão eterna, a carne putrificada se decompondo dia após dia. No entanto, mamãe não podia estar mais certa. Eu não sabia o que era a morte de verdade; nada que eu diga ou tente explicar pode de fato fazer jus à sensação da morte tão próxima; nada pode de fato mensurar o sentimento da perda.

Um dia eu descobri que eu não era intocável, e descobri a morte. Foi a pior coisa pelo que já tive que passar!

Perder alguém que você ama pra cacete é como se pegassem tudo o que você já viveu e a sua vida agora e dividissem em duas partes completamente diferentes.

A primeira parte é aquela onde a pessoa amada está com você, fazendo sua bebida preferida em um dia de chuva, e vocês estão conversando sobre como vocês são tão diferentes e tão iguais ao mesmo tempo e então vocês começam a rir muito de algo que a outra disse até se sufocar com o pedaço de bolo; e a segunda parte, a pior parte, é quando você está sentada na carteira da escola em um dia de chuva e torce pra chegar em casa bem e poder tomar 𝘢𝘲𝘶𝘦𝘭𝘦 chocolate quente e comer aquele bolo e poder se entalar com o pedaço macio daquele bolo porque vai ter alguém pra te ajudar, mas aí você lembra que não vai ter ninguém porque ela não está mais lá, ela se foi e não vai ter chocolate quente, nem bolo, nem risadas, só o vazio, só o silêncio e a saudade. Porque a morte muda tudo.

A morte é 𝘲𝘶𝘢𝘴𝘦 isso.

O ponteiro do relógio tiquetaqueava enquanto todos os alunos estavam com a cabeça abaixada resolvendo a atividade de física.

As aulas já haviam voltado e com ela as lembranças de um tempo que eu não podia mais voltar. Quando Jane morreu, fiquei mais ou menos três meses sem ir à aula porque não conseguia me levantar da cama, e estar na escola agora estava trazendo todas as lembranças à tona.

Me remexi, desconfortável na cadeira, puxando o ar com força tentando respirar. Já estava cogitando reclamar pro professor que a sala estava abafada quando percebi que a culpa não era da sala cheia. Eram as lembranças que estavam me sufocando.

Levantei a mão e me arrependi no mesmo instante, eu era acostumada a sentar na frente, então nessas situações todos viam qualquer movimento brusco que eu fizesse.

— Isabella! — disse o professor, ajeitando os óculos no rosto, passando a mão sobre a barba por fazer, esperando uma resposta.

— Sim, professor?

— Você está com a mão levantada, quer alguma coisa? — perguntou, curioso e irritado porque eu havia interrompido sua aula.

— Ah! Isso? Bem... posso ir ao banheiro? — pedi, com os pensamentos desconexos, uma imensidão de possibilidades diferentes passando pela cabeça, mas nada fazia sentido, então a forma que achei para fugir dali era indo ao banheiro.

— Claro! Não demore, por favor!

— Obrigada!

Saí da sala tentando relaxar, os músculos estavam rígidos, uma queimação estranha aparecia na garganta e eu me senti mais leve só por ter me livrado de quase chorar na frente de toda a classe.

Eu ainda queimo por você Onde histórias criam vida. Descubra agora