Caminhamos caladas por cinco minutos. Minutos esses que pareciam horas, estava martirizante, a morena ao meu lado parecia inquieta, mexendo muitas vezes na alça de sua mochila e brincando com o brasão de prata brilhante em formato de águia no seu peito, como se estivesse se preparando para falar algo.
– Ela não era assim – Ela quebra o silêncio e eu a olho confusa – Miyeon... Ela não era assim, ela costumava ser fofa e carinhosa, atenciosa... – Abro a boca em um "O" surpresa por ela ter tocado naquele assunto.
– Ah... – É a única coisa que sai da minha boca. Ela pareceu perceber minha surpresa com o assunto – Vocês são namoradas? – Ela balança a cabeça negando.
– Nunca fomos namoradas – Ela suspira profundamente, como se estivesse se preparando para contar um segredo – Nós nunca tivemos algo a mais na verdade – Ela procura meu olhar, como se pedisse permissão para continuar a falar – Miyeon e eu sempre fomos muito próximas, desde o fundamental. Mas eu não conseguia entender suas mudanças repentinas de humor quando qualquer pessoa tinha o mínimo contato comigo – A morena buscar ar novamente – Mas aí eu a contei sobre alguém que eu estava gostando e tudo mudou... Foi aí o primeiro surto – Eu a escutava atentamente sem sequer piscar – Ela ficou agressiva do nada, deferiu xingos e palavrões e saiu da minha casa batendo a porta com força. Mas ainda sim eu a perdoei, bom, ela era minha amiga, e sentir ciúmes de amigos é normal – Dá um pequeno sorriso, como se nem ela acreditasse naquela afirmação – Foi ai que tudo mudou, eu achei que com o tempo o ciúmes dela melhoraria, que era só eu mostrar a ela que nunca a deixaria, que sua amizade era importante pra mim... Mas não – Ela parece hesitante em continuar, então seguro seus dedos, tentando lhe passar segurança, esse assunto parecia ser um tópico sensível para ela, algo íntimo demais para se confiar a um estranho. Sana estava confiando seu segredo a mim – Foi quando tudo aconteceu. Eu estava sentada no refeitório quando vi Miyeon com o grupo de garotas populares, Yuqi, Minnie, Shuhua e Soyeon. Elas estavam rindo estridentemente de algo que Miyeon segurava, me aproximei dela e percebi que meu diário estava em suas mãos... – A japonesa agora apertava minha mão inconscientemente, suas próximas falas com certeza serão doloridas. Torci internamente para não ser o que eu estava pensando.
– Se você não se sentir confortável para falar, você não precisa ok...
– Ela leu meu diário para todos...– Ela me interrompe falando rapidamente, agora espremendo seus olhos com as memórias que lhe atingiram – Ela me humilhou na frente de todos, "ISSO MESMO MIYEON" "AGORA VOCÊ É UMA DE NÓS" "PALMAS PARA A MAIS NOVA LÍDER DE TORCIDA DO L'AIGLE" foram as palavras que elas disseram seguidas de uma salva de palmas – Eu estava chocada com a frieza de Miyeon. Como ela pode fazer isso? Ainda mais com alguém que ela dizia gostar.
Foi aí que memórias me atingiram. Eu me lembrava desse dia. Eu estava lá. Eu estava no refeitório. Eu me lembrava de Sana, ou de sua antiga versão, triste e machucada dentro de uma das cabines do banheiro abandonado do terceiro andar do L'aigle. Eu me lembro de secar suas lágrimas e de a acolher. Mas aquela não era a Sana que eu conheci, a bonita e alegre, a simpática, a líder de torcida, a imponente. Talvez o tempo tenha feito mudanças drásticas na japonesa, tanto em sua aparência quanto em sua personalidade.
– Sana? – A chamo em um fio de voz, quase inaudível.
– Sim... Você estava lá, você me acolheu – Ela tenta sorrir enquanto algumas lágrimas traçam seu rosto. Então em um impulso a envolvo em meus braços. Tudo pareceu encaixar, mesmo muitas coisas ainda estando confusas, como, por que Sana ainda anda com Miyeon? Por que ela é uma líder de torcida? Por quê?
Não ouso perguntar mais nada, apenas me calo e espero a japonesa se recompor. Mas assim como eu, a mais baixa parecia não conseguir se desvencilhar de meus braços, onde se aconchegava ainda mais.
[...]
Ficamos naquele aperto por mais um tempo, até eu ter certeza que a líder de torcida estava mais calma. Entrelacei nossas mãos e a guiei até minha casa. Ela não pareceu se importar com o toque tão íntimo e segurou minha mão com mais firmeza.
TZUYU
– Tzu? – Sinto meu corpo balançando suavemente – Tzu, você está bem? – Minha irmã perguntou me lançando um olhar preocupado.
– Uhum – Murmuro me mexendo no banco do carona, tentando achar uma posição mais confortável.
– É que você estava suando, fiquei preocupada – Fala sem tirar sua atenção do volante.
– Só estou com sono, não dormi bem... – Ela acente desconfiada mas não faz mais perguntas. Então só me viro de novo e volto a pegar no sono.
_________
5 anos atrás
Eu estava muito preocupada com a morena na minha frente ela tomava um copo de água enquanto tamborilava os dedos na mesa. Eu estava com um nó na garganta, queria pedir a ela que desse continuidade no relato. Muitas coisas não faziam sentido na minha cabeça e eu queria entender tudo que se passava na dela.
Mas ainda tinha algo que fazia um barulho ainda mais forte e alto na minha mente. O fato de eu não me lembrar de Sana. Como e por que eu não conseguia me lembrar? Eu só conseguia me lembrar de consolar a japonesa no banheiro, mas o fato de que fomos da mesma classe por um ano inteiro e eu não conseguir lembrar de sequer ouvir seu nome me apavorava. Eu estava com amnésia? O quanto sua aparência mudou? Ela fez alguma cirurgia plástica? Eu não conseguia mais segurar essas perguntas só para mim.
— Sana? – Tiro a atenção da morena de seus dedos – Por que eu não consigo me lembrar de você? Por que parece que você não é mais a mesma pessoa que eu consolei no banheiro? – Ela dá uma risadinha forçada.
– Eu também me assustei um pouco quando percebi que você não lembrava de mim, mas de algum jeito fiquei feliz por isso. – A morena parece pensar nas suas próximas palavras, talvez estabelecendo um limite do quanto eu poderia saber sobre sua antiga versão – Quando tudo aquilo aconteceu eu fiquei um mês sem aparecer na escola, fui diagnosticada com ansiedade e fobia social, e era começo de ano letivo. Os professores me enviavam as atividades por email – Respira fundo – Eu não conseguia me levantar da cama. Foi nessa época que estávamos na mesma classe – Minha boca se abre em um "Oh", as coisas estavam se encaixando – Quando eu pisei pela primeira vez na escola depois de todo o acontecido, eu havia me distanciado de todos os meus amigos e ficado isolada, me escondendo pelas sombras. Foi um ano complicado. Eu estava sem minha melhor amiga, a que me traiu, sem amigos pois ninguém queria andar com alguém que foi humilhado – Percebo a dificuldade que ela tem em manter contato visual comigo, sempre olhando para um ponto qualquer enquanto fala. Meu coração estava tão apertado que parecia que ele havia reduzido de tamanho, se eu pudesse botar em palavras, diria que ele está do tamanho de um grão de arroz.
– Meu deus Sana, eu não consigo imaginar o quanto deve ter sido difícil para você... – Falo tentando confortar de alguma forma a garota à minha frente.
– Sim... Foi uma época bem complicada... Mas não vamos ficar falando sobre iss... – Percebo ela tentar desviar do assunto, mas algo em mim gritava dizendo que ela guardava isso a muito tempo, e que de alguma maneira confiou em mim para botar para fora. Eu não sabia como agir, nunca tive amigos, então só seguia meus instintos, e eles diziam que eu devia escutar com atenção.
Seu copo estava prestes a transbordar, era preciso ela o esvaziar.
–Sana – A interrompi colocando minha mão sobre a sua – Por favor não guarde tudo para si, se precisar desabafar eu estarei aqui – A morena pareceu surpresa com minha fala, mas ao mesmo tempo vi seus músculos relaxarem e um pequeno sorriso simpático se formar no canto de seus lábios.
– Muito obrigado, Chewy! – Ela sorri, e eu sorrio também pelo uso do apelido – Eu prometo que vou continuar me abrindo para você – Suas mãos agora acariciavam as minhas – Mas não hoje, agora precisamos ensaiar de verdade!! – Ela se levantou em um pulo, mas eu ainda a olhava preocupada. Eu esperava do fundo do coração que a japonesa estivesse verdadeiramente bem.

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GOOD LUCK, BABE - Satzu
FanfictionO que é o termino de um relacionamento se não um estágio do luto? Após um termino difícil, Tzuyu encara de frente os estágios do luto: Negação, Raiva, Barganha e até o então momento a Depressão. À Taiwanesa revive incansavelmente memórias do passa...