16 - Ela.

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TZUYU

Acordo sentindo minha boca seca, olho para todos os lados tentando recuperar minha consciência, percebendo que o carro já não está em movimento, Ning não está no volante, e agora o céu já não está em um tom claro e sim alaranjado, indicando o fim da tarde.

Me remexi sentindo um leve desconforto em minhas costas e virei o espelho retrovisor do carro para analisar minha aparência. Péssima decisão. Eu estou horrível, não consigo reconhecer minha própria imagem, aquela não sou eu, e sim o que sobrou de mim, somente a carcaça do que um dia já fora Chou Tzuyu.

Respirei fundo e abri a porta do carro, saindo de seu interior e observando o grande local à minha frente, senti a brisa gelada do mar e o cheiro da maresia invadir minhas narinas. Jeju. Eu conhecia bem aquele lugar, ele guardava muitas lembranças, não só minhas, mas de todos que um dia me rodearam.

— Yoda! — Escutei meu nome ser chamado, me virando para encarar a figura da minha irmã na porta da casa, acenando para que eu me aproximasse — Venha — Balançou suas mãos para que eu a seguisse.

Entrei na casa observando cada canto e como tudo parecia igual, todos os móveis ainda estavam nos mesmos lugares da última vez, as decorações ainda eram as mesmas, tudo estava igual. Quase tudo.

Agora não havia mais as gritarias, as risadas, ou os resmungos de meus amigos.
Era só uma casa como outra qualquer, cheia de pertences de outras pessoas que um dia por ali passaram. Que sem ninguém para lhe preencher se tornava apenas mais um amontoado de coisas organizadas e desorganizadas por todos os cantos. Um lugar cheio de memórias do que um dia já foi bom.

E era exatamente assim que eu me sentia.

Uma grande casa cheia de lembranças e pertences de outra pessoa, onde eu tento organizar tudo em seu devido lugar, e quanto mais eu arrumo, mais coisas aparecem, e mesmo arrumando e arrumando eu sempre acho alguma coisinha que pertence a ela. Ficando presa nesse loop infinito.

Talvez fosse a hora de eu parar de tentar organizar, e somente lidar com tudo, lidar com o fato de que nunca ficará arrumado.

Me permito sorrir em meio aquele mar de melancolia que me atingiu, lembrando da primeira de muitas vezes em que eu e meus amigos fomos para aquela casa. Desde o passeio da escola, Jeju virou nosso ponto de encontro, e mesmo depois do fim do ensino médio nós havíamos continuado alimentando esse hábito de anualmente nos encontrarmos naquela ilha.

Eu sentia falta disso, sentia falta desses momentos. Mesmo ainda mantendo contato com todos, sabemos que não é mais a mesma coisa.

Infelizmente uma enorme rachadura irreparável ocorreu em nosso meio, e mesmo tentando tapar com band aid, ela fica cada vez maior. Então firmamos um acordo silencioso em nome de nossa amizade de nunca falarmos sobre o ocorrido.

— Está com fome Tzu? — Minha irmã perguntou tomando minha atenção. Balanço a cabeça negando — Mas você vai comer mesmo assim, prometi a Mãmã que iria cuidar de você. Não faça uma senhora taiwanesa irritada aparecer na porta dessa casa, por favor! — Reviro os olhos me sentando na bancada da cozinha, vendo Ning tentar preparar alguma gororoba na panela. Faço cara de nojo e a mais nova bufa. Cozinhar não era o seu forte — Eu estou tentando, Okay! Você sabe que cozinhar não é o meu forte — Fala abandonado os legumes que estavam em seus braços e alcançando um lámen qualquer no armário.

— Sua mulher não teve sorte com você — Brinquei fazendo a mais baixa me olhar com os olhos semicerrados — Se ela dependesse de você para comer estava ferrada.

— Olha aqui — Apontou o hashi para mim — Minha mulher é muito bem cuidada, tá bom. Eu só tenho esse pequeno defeito na cozinha, mas tirando isso sou excelente.

GOOD LUCK, BABE - SatzuOnde histórias criam vida. Descubra agora