Foram semanas de tratamento intensivo até que todo o veneno saísse do organismo de Antônio. A recuperação foi lenta, e Irene esteve ao lado dele o tempo todo, atenta a cada detalhe, a cada melhora, a cada suspiro mais profundo. Agora, finalmente, estavam de volta à fazenda, mas algo havia mudado. Não era o espaço físico; havia uma nova leveza entre eles, uma sensação de que a verdade, ainda que dolorosa, havia limpado o caminho.
Angelina não trabalhava mais na fazenda. Depois da grande decepção que teve com Agatha e, com a volta de Irene como dona da casa, sabia que não poderia continuar ali. A relação entre elas estava arruinada, e trabalhar ali não era mais uma opção. Decidida a seguir em frente, Angelina começou a trabalhar na pousada com as sobrinhas, buscando um novo rumo para sua vida.
Petra e Hélio, por sua vez, agora livres das mentiras que haviam assombrado suas vidas, decidiram que era hora de celebração. Planejaram uma viagem ao lado de Luigi e Anely, comemorando o fato de que a sucessão seria dividida entre a filha legítima dos La Selva e o italiano, cuja lealdade à família jamais foi questionada.
Na fazenda, restavam apenas Antônio e Irene, adaptando-se à nova realidade. A casa ainda tinha vestígios da presença de Agatha, com algumas mudanças na decoração que Irene, aos poucos, desfez. Cada pequeno ajuste parecia carregar um significado mais profundo, como se Irene estivesse reestabelecendo a ordem não só da casa, mas também de suas vidas. Trinta anos de casamento haviam sido vividos sob a sombra de um fantasma, de um segredo que pairava entre eles, como um véu invisível. E agora, mesmo que não estivessem mais casados no papel, ainda eram companheiros. Se pertenciam de uma maneira que nem um divórcio havia sido capaz de destruir.
Agora, estavam unidos pelo tempo e pela verdade. Não havia mais uma "morta-viva" entre eles, como Irene costumava dizer. Não havia mais segredos. Quando Antônio esteve à beira da morte no hospital, e Irene achou que poderia perdê-lo, ela admitiu o que guardava há tanto tempo: foi responsável pela morte de Daniel. Mas ele, debilitado, não a julgou. Não naquele momento, e talvez nunca o fizesse, afinal, ele também tinha sua parcela de culpa, por não tê-la ouvido antes, por tê-la deixado sozinha em meio ao caos.
Irene, agora, estava de pé junto à janela, observando o vento balançar as folhas do jardim. O robe de cetim macio roçava sua pele, e em suas mãos, um copo de uísque caro. Ela olhava para os carros estacionados e, por um momento, permitiu-se imaginar como seria sua vida se Daniel ainda estivesse ali. Teria sido diferente? Ou talvez o destino os levasse à mesma estrada, mas por caminhos diferentes?
— Você fica linda assim, pensativa, sob a luz do luar. — A voz de Antônio quebrou o silêncio.
Ela não se virou, mas um sorriso leve curvou seus lábios. Sabia que ele estava sendo sincero, algo que havia faltado por tanto tempo entre eles. Agora, não havia mais dissimulação.
— O que você quer, Antônio La Selva? — ela perguntou, ainda de costas para ele, observando a escuridão lá fora.
— Não posso elogiar minha mulher? — Ele respondeu, aproximando-se.
Irene finalmente se virou para ele, um meio sorriso brincando em seus lábios.
— Sua mulher? Achei que eu era a vagabunda, a messalina, a piranha? — A provocação era clara, mas Irene sabia que era uma conversa que já estavam adiando por tempo demais. Antônio estava recuperado, forte, e agora era o momento de enfrentar o que havia ficado pendente entre eles.
Antônio respirou fundo, visivelmente desconfortável. — Irene... muita coisa aconteceu. Você me traiu! Eu estava com raiva, ferido, com ciúmes!
— E você me traiu também! E muito antes de eu sequer pensar em fazer o mesmo! — Irene se aproximou, encarando-o de frente, a voz firme. — Eu só te traí porque você me deixou de lado, Antônio! Eu gritei por você e você não me ouviu!