Os dias passaram e Afonso não conseguia afastar da mente a última conversa que tivera com Tomás. A simplicidade do encontro, a forma como os olhares se cruzaram e as palavras fluíram, deixaram-no a pensar em coisas que nunca esperava. Não era apenas uma atração superficial, mas algo mais profundo, um fascínio pelo mundo de Tomás, tão diferente do seu. Por isso, decidiu que o café sugerido teria de acontecer, e depressa.
Na manhã seguinte, Afonso entrou novamente na livraria, desta vez com uma camisa leve que destacava os seus músculos, mas sem parecer demasiado casual. Tomás, que estava a organizar a montra, não o viu entrar. Ele respirou fundo, aproximou-se do balcão e fez-se notar com um claro.
- Bom dia!
Tomás olhou para ele e sorriu de imediato.
- Bom dia, Afonso. Hoje parece que vieste mesmo para levar algum livro! - Brincou, enquanto se levantava.
- Não exatamente... Acho que não consegui deixar de pensar no café que sugeri. - Afonso colocou as mãos nos bolsos, tentando disfarçar o nervosismo, embora o seu sorriso confiante o traísse. - O que achas de fazermos isso agora?
Tomás, surpreso pela iniciativa, olhou para o relógio. Ainda faltava uma hora para fechar para o almoço, mas a livraria estava praticamente vazia, e ele sentia uma ansiedade agradável a crescer dentro de si. Sem pensar duas vezes, acenou afirmativamente.
- Porque não? Vou fechar uns minutos mais cedo hoje.
Afonso abriu a porta para Tomás, que trancou a livraria atrás de si, e juntos caminharam até um café acolhedor a poucos metros de distância. O ambiente era descontraído, com mesas de madeira e luz suave, criando o cenário perfeito para a conversa que ambos sabiam estar prestes a acontecer.
Sentados frente a frente, entre sorrisos tímidos e olhares curiosos, Afonso foi o primeiro a falar.
- Tu deves estar a perguntar-te o que alguém como eu faz numa livraria, não é?
Tomás riu-se, mas acenou com a cabeça.
- Confesso que a pergunta já me passou pela cabeça algumas vezes. Nunca te vi comprar nada... Não me leves a mal.
Afonso endireitou-se na cadeira e olhou diretamente para Tomás.
- Eu acho que, no fundo, não era para comprar livros que eu ia lá. Era para te ver. - A honestidade direta dele deixou Tomás momentaneamente sem palavras. Ele corou ligeiramente, mas sentiu o coração acelerar.
- Então... tens estado a vir por mim? - Perguntou Tomás, tentando manter o tom descontraído, mas com uma ponta de emoção.
- Sim! - Admitiu Afonso, com um sorriso brincalhão. - Há algo em ti... na forma como és tão calmo, tão diferente de mim, que me fascina. Eu passo os dias no ginásio, em competições, sempre a correr de um lado para o outro. Mas tu... tu tens uma serenidade que eu nunca encontrei em mais ninguém.
Tomás ficou em silêncio por alguns momentos, absorvendo o que Afonso dissera. Não estava habituado a receber este tipo de atenção, muito menos de alguém como Afonso, que parecia ter tudo. Mas, estranhamente, ele também se sentia intrigado por Afonso. Era como se aquele contraste entre eles, de mundos tão diferentes, criasse uma química inegável.
- Sabes, eu também te tenho observado. - Disse Tomás finalmente, com um sorriso tímido. - Nunca pensei que te interessasses por livros, mas cada vez que entravas na livraria, trazias uma energia que... mexia comigo.
Os dois trocaram um olhar profundo, como se naquele momento compreendessem que, apesar das suas diferenças, havia algo mais forte a uni-los. Afonso, aproveitando o silêncio confortável, estendeu a mão sobre a mesa e tocou suavemente na de Tomás. O toque foi breve, mas cheio de significado, deixando claro que, entre eles, estava a nascer algo mais do que uma mera curiosidade.
- O que dizes a um segundo encontro? - Afonso perguntou, com um brilho malandro nos olhos. - Desta vez, talvez num sítio mais ao meu estilo... que tal uma caminhada junto ao rio?
Tomás sorriu, o nervosismo de antes a desaparecer.
- Gosto da ideia. - Respondeu, com um tom que indicava que, de facto, estava aberto a descobrir mais sobre este homem que tinha entrado na sua vida de forma tão inesperada.
E assim, entre livros e exercícios, palavras e silêncios, nascia uma conexão inesperada. Um romance que prometia ser tão singular quanto os próprios protagonistas, feito de diferenças que, em vez de os afastarem, os uniam. Ambos sabiam que esta era apenas a primeira página de uma história que poderia ser uma das mais marcantes das suas vidas.

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Era uma Vez...
Short StoryO que acontece quando o amor surge numa livraria? Tomás e Afonso são dois homens de mundos diferentes que, inesperadamente, veem as suas vidas cruzarem-se numa pequena livraria. Tomás, dono de uma livraria e amante de histórias, vive entre os livros...