Capítulo 14 - Marcos

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Marcos tinha uma rotina estável. Não era o tipo de homem que buscava grandes emoções na vida. Trabalhava em uma empresa de tecnologia de médio porte, onde atuava como gerente de projetos. Sua função era manter tudo sob controle: prazos, entregas e, principalmente, pessoas. Ele sempre se orgulha de sua capacidade de lidar com crises, coordenar equipes e, de certo modo, "controlar" o que acontecia ao seu redor. Sua vida profissional era uma extensão de quem ele acreditava ser: um homem seguro, capaz e confiável.

A empresa na qual trabalhava estava envolvida no desenvolvimento de software de segurança cibernética. Todos os dias, ele gerenciava equipes responsáveis por construir sistemas complexos para proteger dados corporativos e pessoais. Para muitos, o trabalho poderia parecer tedioso, mas para Marcos, havia um certo prazer na previsibilidade dos desafios. Ele sabia o que esperar, e gostava disso.

Apesar de o trabalho consumir grande parte de seu tempo, Marcos sempre acreditou que conseguia equilibrar bem sua vida pessoal e profissional. Ele voltava para casa todas as noites, jantava com Helena e tentava manter o casamento nos eixos, mesmo que, ultimamente, a distância entre eles fosse cada vez mais evidente. Marcos tinha a sensação de que algo estava diferente, mas não conseguia colocar o dedo na ferida.

Desde que Lara ressurgira em suas vidas, algo parecia fora do lugar. Marcos e Lara tinham tido um breve envolvimento, algo que começou sem grandes expectativas e terminou de forma abrupta. Lara, sendo quem era, nunca deu muitas explicações. Um dia simplesmente apareceu com uma desculpa qualquer, algo sobre a vida dela estar tomando outro rumo, e encerrou tudo. Na época, ele aceitou sem questionar demais. Ele sabia que Lara era imprevisível, mas isso fazia parte do que o atraía nela.

Porém, o que mais o incomodava agora não era a maneira como o relacionamento deles terminou, mas sim o fato de que Lara conhecia sua esposa. Helena e Lara nunca haviam se encontrado antes, e Marcos não sabia como reagir àquela aproximação repentina. O ciúme que ele esperava sentir não surgiu, pelo menos não da maneira tradicional. Ele não tinha ciúmes de Lara, mas sim da ideia de que ela poderia estar se aproximando de Helena por outros motivos. Talvez fosse uma tentativa de mexer com ele, um jogo que ela gostava de jogar, testando seus limites.

Ele começou a reparar em pequenos detalhes: como Helena parecia mais distraída, como suas conversas com ele estavam ficando mais curtas e menos frequentes. Marcos sabia que algo estava acontecendo, mas nunca imaginaria que o motivo da distância entre ele e Helena pudesse ser Lara, de uma forma que ele jamais esperaria.

Em um jantar casual, ele resolveu questionar Helena, de maneira sutil.

— Você tem visto muito aquela sua amiga ultimamente?  — perguntou, cortando um pedaço de carne, tentando soar despreocupado.

Helena ergueu os olhos do prato, surpresa pela pergunta, mas tentou manter a compostura.

— A Lara? Sim, ela tem passado por aqui de vez em quando. Acho que estamos nos tornando amigas. — A resposta veio de forma natural, mas havia algo no tom dela que despertou a atenção de Marcos.

"Amigas", pensou ele, internamente desconfortável. Ele se perguntou que tipo de jogo Lara estava jogando. Será que ela estava tentando minar seu casamento, ou estava tentando ameaçar a vida que ele construíra com Helena? A desconfiança começava a crescer, e ele decidiu que não podia deixar isso continuar sem uma confrontação.

Poucos dias depois, ele encontrou Lara em um café perto de sua empresa. Ele sabia que ela costumava frequentar o local, e aproveitou um intervalo para tirar a história a limpo.

— O que você está fazendo, Lara? — ele perguntou direto, sem rodeios.

Lara olhou para ele com aquele sorriso característico, o olhar desarmante e provocador.

— Como assim, Marcos? — Ela brincou, inclinando-se na cadeira, claramente se divertindo com a seriedade dele.

— Não jogue comigo. O que você quer com a Helena? Você está tentando... — Ele hesitou, sem saber como formular a frase. — Está tentando ameaçar meu casamento?

Lara soltou uma gargalhada curta, balançando a cabeça.

— Ah, Marcos. Você é tão previsível. Eu não estou interessada em você nem no seu casamento. Se eu quisesse destruí-lo, teria feito isso há muito tempo. — Ela lançou um olhar desafiador, mexendo na xícara de café à sua frente.

Ele franziu o cenho, sem saber se deveria acreditar. Mas Lara era imprevisível, e ele sabia que ela estava escondendo algo.

— Então por que essa proximidade com ela? — insistiu ele.

Lara deu de ombros, indiferente. — Talvez eu só queira me aproximar de pessoas interessantes. Não precisa se preocupar. O que tivemos já terminou faz tempo. E, sinceramente, você nunca foi um desafio para mim. Agora, se me der licença, tenho outras coisas para fazer.

Ela se levantou e saiu do café com um sorriso de superioridade, deixando Marcos ainda mais desconfiado. Algo não fazia sentido, mas ele não conseguia desvendar o que era. Lara sempre foi um mistério, e agora estava mexendo com a única coisa que ele achava que tinha sob controle: seu casamento com Helena.

Naquela noite, ao voltar para casa, Marcos sentiu a necessidade de se afastar de tudo aquilo, de dar um tempo para colocar os pensamentos em ordem. Durante o jantar, ele puxou o assunto com Helena, que ainda parecia distraída com seus próprios pensamentos.

— Vou ter que fazer uma viagem a trabalho — disse ele, tentando soar casual. — Algumas reuniões importantes surgiram, e vou ficar fora por algumas semanas .

Helena o encarou por um momento, surpresa. — Para onde você vai?

— Vou ao Brasil, São Paulo. Não vai ser muito tempo, mas provavelmente ficarei fora o resto da semana— respondeu ele, tomando um gole de água e evitando contato visual direto.

Helena assentiu, um tanto aliviada com a notícia, mas tentou disfarçar.

— Tudo bem. Acho que vai ser bom para você se concentrar no trabalho — disse ela, esboçando um sorriso.

Marcos não sabia se deveria interpretar o alívio no rosto de Helena como uma coisa boa ou ruim. Estava começando a se sentir como um estranho dentro da própria casa, cercado por segredos que ele não conseguia desvendar.

Enquanto fazia as malas naquela noite, ele se perguntou se aquela viagem seria o que ele precisava para afastar os pensamentos turbulentos e clarear a mente. No fundo, ele sabia que sua desconfiança não era infundada. Algo estava mudando em seu relacionamento com Helena, e Lara, de algum jeito, era parte disso. O que ele não sabia era o quão profundo era o buraco que ele estava prestes a cavar.

A AMANTE (Romance Lésbico)Onde histórias criam vida. Descubra agora