Cruel

09

ELEANOR BLACKWOOD

     O príncipe cumpriu sua promessa e Victória parecia não fazer ideia de minha presença naquela noite e para que continue assim, venho tentando agir normalmente. 

Também estou aproveitando toda e qualquer oportunidade de criticar esse romance, com a esperança de arrancar essa venda dos olhos de Victória e fazer com que enxergue a realidade. Ainda que seja inteligente, que seja a futura herdeira da Companhia Blackwood, essas coisas não são moedas de troca. Não existe nada que torne esse relacionamento possível, nem mesmo o destino está a favor deles.

Tem vezes que a vejo suspirando pelos cantos, com um sorrisinho nos lábios e quero segurar ela pelos ombros e sacudir, implorar para que seja racional. Para que não me faça ter que lutar com ela mais uma vez por algo que é meu. Porém, tenho me contido. Não posso levantar a desconfiança dela ou de mamãe. 

Nesse momento, tenho dois objetivos principais. Primeiro, impedir que mamãe descubra sobre os dois. Tenho certeza que se souber sobre Victória e James, fará de tudo para que os dois se casem, ignorando toda a história que nós dois temos até aqui. Tenho que evitar isso a todo custo não só por mim, mas por eles dois também. Posso imaginar o inferno que seria se duas pessoas que não estão destinadas, acabassem juntas.

O segundo é achar uma forma de me aproximar de James. Nosso pouco contato deu espaço para que esse romance entre ele e Victória acontecesse, mas tenho certeza que quando me conhecer de verdade, perceberá que sou a pessoa que ele sempre procurou. Não será difícil conseguir engatar em um relacionamento — um público, a propósito, diferente do que ele tem com Victória.

Conversei com Tio Charles por cartas na última semana e ele me garantiu seu total apoio. Agora, eu só precisava convencer a mamãe sobre meu baile de debutante e que aprendi o que quer que esteja tentando ensinar com esse meu tempo ajudando na cozinha. Ela diminuiu meu tempo nas tarefas essa semana, então acredito estar no caminho certo.

Victória suspira ao meu lado e a espio secretamente enquanto seus olhos estão focados naquele livro enorme que está lendo para sua aula de história, sobre a Guerra de Rainfield. Tem desbravado essas seiscentas páginas desde que sentamos aqui fora enquanto Anna cuida de seu jardim.

Volto a focar em minhas aquarelas quando se move para anotar alguma coisa no pequeno caderno que trouxe consigo hoje. Vejo pelo canto do olho que me observa rapidamente, depois joga uma mecha longa do cabelo escuro e ondulado para trás do ombro e recosta novamente na cadeira. 

Observo o brinco de esmeralda que não me lembro de vê-la comprar ou ser presenteada. A ponta dos seus dedos continuam tocando a joia, as bochechas coradas, os suspiros. Esse conjunto de pequenas coisas traz de volta as lembranças daquela noite. Dela correndo para os braços de James, os lábios dele encontrando os dela. 

Aperto o pincel com força e me obrigo a focar na pintura. Pintar ajuda a clarear minha mente e organizar meus sentimentos. E tem sido minha salvação, principalmente nos últimos dias. As pessoas tendem a não me atrapalhar quando estou pintando, também não tenho que fingir expressões. Ninguém desconfiaria que a cada pincelada estou planejando como ter um relacionamento público com James — o que parece algo impossível no momento.

A forma mais rápida seria através de Vivi, mas tenho medo demais de sequer mencionar James perto dela. Tio Charles, prometeu tentar conseguir um convite para o baile de aniversário do príncipe, mas duvido que isso realmente aconteça.

São raros e escassos os convites para famílias não-nobres como nós. Os únicos que sempre recebem são aqueles que fazem parte do conselho real e alguma outra família que tenha ligação com algum nobre próximo da família real, como os Ortiz que são parentes maternos da Willa Terrintown.