Além da Inovação

Cálculos e anotações

A porta do laboratório se abriu de repente, e Sky entrou apressada, o rosto iluminado com a empolgação típica que a fazia parecer sempre no limite entre a genialidade e a curiosidade infantil

‘’Jayce! Viktor! Vocês precisam ver isso!’’  ela disse, segurando algumas anotações e diagramas em suas mãos trêmulas.

Jayce e Viktor, que estavam concentrados ajustando o Hexcore.

‘’Sky’’ Jayce começou, tentando não soar impaciente. ‘’Estamos no meio de algo... complicado.’’

‘’Eu sei, eu sei!’’ Sky interrompeu, apressando-se para o lado deles. ‘’Mas isso está relacionado. Eu estava analisando os parâmetros que vocês mencionaram antes e... bom, acho que há uma maneira de estabilizar a matriz sem sobrecarregar o sistema.’’

Ela colocou suas anotações na mesa, dispersando alguns dos papéis que já estavam ali. Viktor arqueou uma sobrancelha e puxou as folhas para examiná-las, enquanto Jayce suspirava.
‘’Sky, isso é impressionante, mas você precisa…’’

Ele parou quando viu a expressão de Viktor mudar.
Viktor olhava os diagramas com uma mistura de interesse e ceticismo.
‘’Essa abordagem... é arriscada, mas... intrigante.’’ Ele franziu a testa, estudando cada linha com cuidado.

‘’Arriscada?’’ Sky se aproximou mais, parecendo ligeiramente ofendida. ‘’É eficiente! Eu calculei tudo.’’

Jayce colocou uma mão no ombro de Sky, tentando acalmá-la.
‘’Sky, ninguém está questionando sua habilidade. Só que o Hexcore já é... instável o suficiente.’’

Sky bufou, cruzando os braços. ‘’Eu só quero ajudar.’’

Viktor ergueu o olhar para ela, a fadiga visível em seu rosto.
‘’Suas ideias têm mérito, Sky. Mas o problema não é apenas técnico. Este projeto está... no limite. Cada pequena mudança pode significar sucesso ou desastre.’’

Jayce assentiu, mas antes que ele pudesse dizer algo, Sky virou sua atenção para ele, claramente incomodada.
‘’Sempre o mesmo discurso. Jayce, você costumava confiar mais em mim. Desde quando…’’ Ela hesitou, olhando de relance para Viktor. ‘’Desde quando outras coisas ficaram mais importantes?’’

Jayce franziu a testa, percebendo o subtexto.
‘’O que você quer dizer com isso?’’

Sky soltou um suspiro frustrado.
‘’Nada. Esqueça. Só achei que vocês gostariam de saber que existem opções.’’

Ela começou a recolher suas anotações, mas Viktor colocou uma mão em sua direção, ainda segurando um dos diagramas.
‘’Deixe isso comigo’’  ele disse calmamente. ‘’Vou analisar mais tarde.’’

Sky hesitou, parecendo ligeiramente surpresa, mas acabou deixando os papéis com ele.
‘’Certo. Eu espero que ajude’’  disse ela, sua voz mais suave agora. Então, virou-se para Jayce. ‘’E talvez você devesse lembrar quem sempre esteve aqui para apoiar suas ideias.’’

Antes que Jayce pudesse responder, ela saiu do laboratório, fechando a porta com um baque.

O silêncio reinou por alguns segundos, e então Jayce se virou para Viktor, sua expressão de exasperação dando lugar a uma leve preocupação.
‘’Acho que ela está um pouco... irritada.’’

‘’Não é novidade.’’  Viktor suspirou, deixando o diagrama de lado. ‘’Ela tem um ponto, no entanto. Essas ideias podem ser úteis, mesmo que... pessoais.’’

Jayce balançou a cabeça, um sorriso cansado surgindo.
‘’Você acha que tudo é trabalho, não é?’’

‘’Não tudo’’ Viktor respondeu, lançando-lhe um olhar significativo.

Jayce sorriu mais abertamente, e o laboratório voltou ao ritmo tranquilo de antes.

A madrugada avançava silenciosa no laboratório, iluminado apenas pelas luzes suaves dos dispositivos e dos monitores. A tensão da conversa com Sky ainda pairava no ar, mas o trabalho continuava, ininterrupto. Viktor estava em sua mesa, os olhos cansados, mas atentos aos diagramas e cálculos, enquanto Jayce estava ao seu lado, analisando algumas anotações.
O som de um leve estalo quebrou o silêncio, e Jayce olhou para Viktor.

‘’Você deveria descansar, Viktor. Está ficando evidente que você está forçando demais.’’ Ele observou, seu tom levemente preocupado.

Viktor não levantou os olhos dos papéis, mas a sua expressão se suavizou um pouco. Sabia que Jayce estava certo, mas ele não queria mostrar fraqueza. A doença ainda o atormentava, e admitir isso, mesmo para Jayce, era uma batalha constante.
‘’Eu estou bem. Não se preocupe.’’  Sua voz saiu mais áspera do que pretendia.

Jayce não se deixou enganar. Ele se aproximou de Viktor, pegando os papéis das mãos dele.
‘’Chega de trabalho por hoje, Viktor. Você já fez o suficiente.’’  Ele insistiu, a suavidade na voz um reflexo de sua preocupação.

Viktor ficou em silêncio por um momento, apenas observando Jayce. Algo em seus olhos denunciava que ele estava à beira de algo mais profundo, algo que se escondia atrás de suas palavras e gestos. Jayce, por sua vez, olhava-o com uma intensidade silenciosa, como se estivesse tentando entender o que mais havia por trás daquela fachada de indiferença.

Sem um aviso claro, Viktor sentiu a mão de Jayce em seu ombro. O toque foi suave. O contato parecia esquentar a pele de Viktor de maneira diferente, fazendo com que a tensão em seu corpo se aliviasse um pouco. Algo mudava no ambiente, algo que ele não sabia nomear, mas que sentia de maneira clara.

‘’Não sou bom em ficar parado, Jayce.’’  Viktor disse finalmente, sua voz mais baixa, revelando um pouco da vulnerabilidade que ele tanto tentava esconder.

Jayce se agachou ao seu lado, os olhos fixos nos de Viktor.
‘’Eu sei.’’  Ele disse suavemente. ‘’Mas você não está sozinho nisso.’’

Ao olhar para Jayce, sentiu algo que o fez ficar paralisado. Era como se as palavras que ele tanto temia dizer estivessem prestes a escapar, mas ele as guardava. Ele não estava preparado para revelar tudo o que sentia. Não agora.

Jayce, percebendo o conflito no olhar de Viktor, se aproximou mais, suas mãos agora ao lado do rosto de Viktor. O gesto, tão próximo, fez Viktor sentir uma pressão no peito que ele não sabia como lidar. Era um turbilhão de emoções que ele havia tentado ignorar por tanto tempo.

‘’Eu só…’’ Viktor começou, mas as palavras se perdiam. Ele queria dizer algo, mas a sensação de estar à beira de algo importante o deixou em silêncio.

Jayce, no entanto, não se afastou. Ele sabia o que estava acontecendo, sabia o que Viktor precisava, mesmo que ele mesmo não estivesse pronto para admitir. Com um sorriso tranquilo, ele tomou a iniciativa, encurtando a distância entre eles. Seu toque no rosto de Viktor foi leve.

E, nesse instante, os dois se encontraram em um momento de total entendimento silencioso. Não precisavam mais de palavras.

Sem hesitar, Jayce inclinou-se, seus lábios tocando suavemente os de Viktor. Era um beijo sem pressa, sem urgência, mas com uma intensidade quieta que dizia mais do que qualquer frase poderia expressar.

Quando se separaram, Viktor permaneceu com os olhos fechados por um instante, como se estivesse processando o que acabara de acontecer. Jayce, ainda segurando o rosto de Viktor, o observou em silêncio.

‘’Viktor…’’ Jayce sussurrou, a voz mais suave agora. ‘’Não precisa se preocupar com nada mais. Só... fique comigo, ok?’’

Ele finalmente assentiu, seus olhos encontrando os de Jayce. Por um momento, tudo o que existia era a proximidade deles, o silêncio confortável e as emoções que estavam finalmente começando a fazer sentido.

Jayce sorriu suavemente e, sem dizer mais nada, ajudou Viktor a se acomodar novamente, apoiando-o com cuidado. Eles se sentaram por um tempo, ambos perdidos em seus próprios pensamentos, mas com a certeza de que, no final das contas, estavam exatamente onde deveriam estar.

A madrugada continuava, mas agora, com Viktor ao lado de Jayce, o peso da solidão e das dúvidas parecia mais leve.