–Daqui a algumas horas, este rio vai ficar coberto de flores. – Aleksi mencionou. Sua mão descansava em cima da mão de Andrei e ambos estavam sentados à margem do rio, olhando a água fluir.
–É lindo. – o loiro sorriu, porém seu rosto ficou sério novamente. Algo o perturbava. – Mas... Aleksi... Eu queria te perguntar uma coisa.
–Pode perguntar. – os dedos do outro se enrolavam entre as mechas compridas e douradas do amado.
–É verdade o que dizem, de que os turcos estão vindo?
–Acho que é.
Uma tensão estranha se instalou. O loiro olhou para cima, para rosto do mais forte. Os olhos verdes de Aleksi estavam baixos e ele lambia os lábios nervosamente, como se ali tivesse um demônio que ele queria expulsar. Andrei escalou o peito grande do outro e o beijou suavemente nos lábios. Abriu a boca e suas línguas se atacaram vorazmente. Era difícil terem um tempo tão grande juntos, pois Andrei ficava o dia inteiro fazendo vasos e Aleksi sempre estava no castelo do Rei. Só podiam se encontrar no final da tarde e ficarem no máximo 2 horas juntos, pois assim que o sol se pusesse, o artesão tinha que entrar em casa. Mas aquele dia era o dia sagrado de Kupala, o solstício de verão, então era como se fosse um feriado, pois as pessoas trabalhavam muito pouco.
–Só tome cuidado, eu gosto muito de você. – o artesão disse, plantando um beijo na bochecha do outro.
–Nada nunca aconteceu, Andrei. – riu nervosamente.
–Pode acontecer, você sabe melhor do que eu. E aliás, a quantas guerras você já foi?
–Uma. – Aleksi disse, emburrado.
–Viu? Você é um soldado jovem, quase nem tem cicatrizes. Eu mesmo tenho mais cicatrizes do que você...
O jovem foi interrompido por um empurrão. Aleksi se levantou e começou a andar.
–Aleksi? – o loiro disse, cambaleando, tentando se levantar para acompanhar o passo do outro. – Aleksi! Você ficou bravo? Me desculpa, eu não queria te deixar bravo, eu te amo!
–A gente se fala depois, Arhipov. – ele disse com raiva, andando mais rápido.
–Arhipov?! Não me chame de Arhipov! As pessoas da vila me chamam de Arhipov, mas você tem que me chamar de Andrei! – o rapaz disse manhosamente, parando de andar para ver se Aleksi faria o mesmo. Mas ele continuou andando, o que o deixou furioso. – Aleksi! Você vai parar de andar e vai olhar para mim! – Andrei gritou numa voz aguda. O moreno fez muita força para não rir.
E para sua surpresa, ele parou de andar e se virou, com as sobrancelhas levantadas. Andrei não conseguiu esconder a expressão de espanto, mas logo tentou cobri-la com um olhar desafiador. Porém, seu amado já tinha percebido.
–Melhor assim. – cruzou os braços.
–O que você quer? – o cavaleiro disse com desprezo, aproximando-sedele do mesmo jeito que um predador se aproxima de sua presa. – Já conseguiu me irritar.
–Como você se sente obedecendo às ordens de um menino de dezoito anos? – o artesão sorriu um sorriso torto e o queixo do moreno caiu.
–Você é incrivelmente desprezível, Andrei Arhipov. – disse ele em uma voz baixa e o menino se lançou em seu pescoço, atacando-o combeijos. – E imprevisível.
O nobre permaneceu imóvel enquanto o menor escalava seu corpo, cobrindo-o com beijos, rindo como uma menina.
–Você me ama! – Andrei riu e Aleksi o empurrou, começando a andar para fora da floresta. O outro deixou que fosse, dessa vez, não conseguia parar de rir – Me diga que você me ama! – gritou alegremente para o amigo, que já estava meio longe.
–Não!– o moreno riu e saiu correndo.
"Esse tolo sabe que eu o amo, e que eu morreria se algo acontecesse com ele" Aleksi pensou, com um sorriso enorme nos lábios. Ah, aquele menino mexia com ele...
Andrei só voltou para casa ao cair da tarde, onde encontrou seu pai sentado na sala, bebendo hidromel com outros seis homens. Engoliu a seco, acenando com a cabeça para os homens. Aquilo era importante. O pai nunca levava homens para a casa e muito menos bebia hidromel no dia-a-dia. Correu para seu quarto, mas já que não tinha porta e dificilmente paredes, ele conseguiu ouvir o que os homens diziam. Falavam sobre a guerra que viria e de como eles estavam velhos para aquilo, de como eles não teriam muita chance contra os turcos.
O rapaz absorveu as palavras e olhou para suas mãos ásperas e cheias de pequenas cicatrizes, perguntando-se se tinha alguma coisa que ele poderia fazer. Mas não, não havia nada, nada para um simples artesão. As pessoas da vila mal o notavam, alguns nem sabiam seu nome. Ele tinha dois nomes na vila: "Arhipov" e "menino". Apenas seus pais e Aleksi o chamavam de "Andrei". Mas aquilo não fazia muita diferença, ele fora ensinado a não ser nada para ninguém desde o momento em que nasceu.
Juntou todos os seus pensamentos e os enfiou no fundo de seu estômago, enquanto olhava calmamente as pessoas festejando, cantando e pulando em torno da grande fogueira de Kupala. Aquele era o único dia em que as flores de samambaia desabrochavam. Dizia a lenda que, aquele que encontrasse uma dessas flores na floresta, durante a noite, seria agraciado com sorte e prosperidade. Andrei nunca havia tentado. Não havia porquê tentar. Seu destino estava traçado desde o nascimento; no barro ele havia nascido e para ele voltaria.
No entanto, uma ponta de esperança cresceu em seu peito. Talvez, se os jovens cavaleiros encontrassem as flores, eles poderiam vencer aguerra. O jovem fechou os olhos, respirou profundamente e pediu aos deuses pela prosperidade sagrada que residia na delicada flor de samambaia.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Na Terra Crua
AdventureEra o tempo dos deuses antigos e da conquista de territórios, da espiritualidade e da guerra. Uma pequena e anônima vila russa é ameaçada de ataque por parte do exército turco. Neste meio, a história de Andrei Arhipov é contada; um jovem artesão, de...