–E então? – Aleksi perguntou, sentando-se no banco ao lado de Andrei – Vai me explicar por que não sai de casa há dois dias?
–Hmm... – o rapaz murmurou, levantando rapidamente os olhos do vaso que estava moldando, quase nem prestando atenção no que o outro dizia.– Ah, eu... Aleksi, você sabe, eu tenho que trabalhar...
–Você nunca ligou para esse trabalho, pelo que eu te conheço. – o moreno levantou uma sobrancelha, olhando para o pedaço enorme de barro que estava sendo precisamente moldado pelas mãozinhas finas de Andrei. – É um vaso grande, não?
–Hmm. – ele não tirou os olhos do vaso.
–"Hmm" – Aleksi o imitou num tom de irritação. – Você não está nem falando comigo.
–Me desculpe, Aleksi, mas eu tenho que trabalhar! – o artesão levantou o rosto, de repente. – Não sou nobre como você, tenho que ganhar meu dinheiro através do suor!
O outro cerrou os punhos, visivelmente irritado. Ele odiava quando Andrei se comparava a ele em relação às classes sociais, de qualquer maneira. Ele realmente não ligava para o fato de que o outro era um artesão, mas o menino se importava um pouco mais do que devia. Era sempre "você é um nobre, eu sou artesão, nunca poderemos ficar juntos".
–Parece que eu estou interrompendo algo. – o rapaz continuou. – Na verdade... Andrei, eu sei que quando você me ignora é porque está escondendo algo de mim.
Ouvindo isso, ele tirou abruptamente o pé do acelerador da roda e o olhou, boquiaberto. Levantou-se e caminhou na direção do amado, abraçando-o com força.
–Porque você acha que eu esconderia algo de você? Aleksi, você é o meu melhor amigo desde que a gente tinha nove anos. Você sabe tudo sobre mim.
–Eu sei... – Aleksi levantou o queixo de Andrei com seu dedo indicador, obrigando-o a olhar para ele e o beijou suavemente nos lábios. – Eu só me preocupo, não quero que nada aconteça com o meu queridinho. Eu te amo demais, Andrei, mais do que você pensa.
–Também te amo. – o loiro riu.
Aleksi ficou com ele durante o tempo todo em que ele fazia o vaso. Gotas de suor escorriam pelo rosto de Andrei e grudavam fios do seu cabelo ems sua testa. Só terminou o vaso no final do dia, quando já estava anoitecendo, porém a peça de cerâmica tinha ficado linda; definitivamente a mais bonita que o jovem já fizera na vida.
–E agora você vai dormir? – perguntou, notando o cansaço de Andrei, que quase nem conseguia manter os olhos abertos. Fazer o vaso tinha tirado-lhe todas as energias.
–Não... – ele esfregou os olhos, tentando afastar o sono. – Tenho que entregar isso ainda.
–Entregar? – Aleksi disse, levantando as sobrancelhas – Achei que você ia vendê-lo.
–Eu vou, só vou entregar na casa da pessoa. Tipo uma encomenda. – Andrei tomou o vaso cuidadosamente nos braços e começou a andar para fora da casa. O moreno o seguiu.
–Que pessoa? Quem você anda vendo e não me fala? – era possível sentir uma ponta de ciúme na voz dele. O menor parou de andar assim que ouviu isso, sentindo um frio percorrer-lhe o corpo.
–Aleksi, querido... – Andrei engoliu a seco – Você é o único na minha vida e sabe disso.
–Quem é, Andrei? – o cavaleiro disse em um tom firme e meio irritado.
–Eu não posso dizer.
A insegurança na voz do amigo fez o coração de Aleksi pulsar com força. "Ele está me traindo..." Ele pensou, sentindo as lágrimas queimarem o fundo de seus olhos verdes.
–Andrei...Vou te dar mais uma chance... – ele respirou profundamente. Andrei, por sua vez, lambia os lábios nervosamente e não tinha coragem de olhar para cima ou dar algum passo. – Você vai me contar quem é essa pessoa.
–Mas Aleksi...
–Você está me traindo?! – Aleksi rugiu para o menino, que cambaleou para trás, com medo.
–Não é nada disso, seu tolo! – lágrimas de medo começaram a cair dos olhos do garoto fragilizado. Ele apenas estava muito cansado e queria que Aleksi o deixasse em paz.
–Então conte-me! Você não teria medo se fosse verdade!
–Você está gritando comigo, você nunca fez isso!
–Me diga o nome da pessoa que você está vendo por trás das minhas costas! – Aleksi agarrou o outro pela gola da túnica, puxando-o ruidosamente para perto de si.
–Não ouse tocar em mim! Solte-me agora! – Andrei gritou, alarmado.
–Andrei! Eu só quero saber o nome... – Aleksi foi interrompido por um chute na canela. O rapaz estava se debatendo, tentando se libertar de suas mãos. Ele agarrou o cabelo do menor, puxando-o com toda a força, arrancando um grito de Andrei, que largou o vaso. A peça caiu nochão e se partiu em pedaços.
–Que gritaria é essa? – Sergej, o pai de Andrei, saiu furiosamente da casa. Era um homem forte, porém já velho, na casa dos 50. Tinha uma barba cinza e longa, assim como seus cabelos mal cuidados e os olhos azuis iguais aos do filho: fracos.
Aleksi rapidamente largou Andrei, que caiu de costas no chão. Seu olhar foi de seu pai para o vaso estilhaçado no chão, ao lado dele.
–V-Você quebrou... – ele pegou os cacos do vaso com suas mãos trêmulas.
O peito do nobre subia e descia com sua respiração, por causa da quantidade de adrenalina que seu corpo havia recebido naquele tempo.
–Andrei, o que você está fazendo? – Sergej perguntou, com as duas mãos na cintura. – O que vocês dois estão fazendo? O sol já se pôs...
–Andrei... – Aleksi começou, mas foi interrompido por um grito.
–O que vocês querem de mim?! – o menino gritou, enfurecido. – Não estão vendo que eu estou cansado?! Eu passei meu dia inteiro fazendo este vaso! E você o quebrou, Aleksi! Me deixem em paz!
Andrei se levantou e marchou para dentro de casa. Ele provavelmente morreria por ter gritado com o pai daquele jeito, mas aquilo não importava. Ele não conseguiria pagar pelas aulas, porque teria de dar o vaso para Olenka no dia seguinte. Aleksi e Sergej ficaram se olhando por um bom tempo, confusos.
O garoto foi para seu quarto, enfiou a cara no saco estufado com feno que era o seu travesseiro e chorou até pegar no sono. Dormiu sem ter sonhos. Não havia mais com o que sonhar.
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Na Terra Crua
AdventureEra o tempo dos deuses antigos e da conquista de territórios, da espiritualidade e da guerra. Uma pequena e anônima vila russa é ameaçada de ataque por parte do exército turco. Neste meio, a história de Andrei Arhipov é contada; um jovem artesão, de...