O dia seguinte à escolha não amanheceu em festa.
Os sinos não tocaram.
Os mercados estavam silenciosos, as praças, cheias de sussurros. Cartazes foram rasgados, bandeiras queimadas em vilas distantes. Em frente ao castelo, o povo se reunia — dividido entre aplausos hesitantes e gritos de traição.
A princesa e Emma ficaram no interior do palácio, protegidas por uma guarda pessoal reduzida. O rei, trancado com o conselho, bradava por estratégias, furioso e humilhado. A rainha... observava. Silenciosa, mas atenta.
E então, veio o corvo.
A mensagem era curta. Uma ameaça, marcada com um símbolo esquecido: uma serpente enroscada em uma coroa rachada.
"O Trono precisa de sangue. Ou a lama o engolirá."
O nome logo se espalhou entre os corredores do palácio: A Rosa Negra. Um grupo secreto, extremista, formado por nobres decadentes, oficiais militares fiéis à tradição, e mercadores poderosos contrários à ideia de uma rainha plebeia, de um reinado liderado por alguém que não cabia em suas definições de mulher ou homem.
Eles se escondiam sob máscaras de lealdade, mas tramavam o caos. E tinham armas. E aliados fora do reino.
Naquela noite, a princesa convocou uma reunião no antigo Salão do Espelho — onde reis declaravam guerra e faziam alianças.
Ela entrou de casaca escura, a espada do pai presa à cintura. Emma estava ao seu lado, de cabeça erguida, ainda que os olhos tremessem.
— Não haverá fuga. — disse a princesa. — Não vou abandonar um trono apenas porque ele incomoda os que não sabem amar.
— Mas e se a guerra vier? — questionou um dos conselheiros, tenso.
— Então guerrearemos por um reino que valha a pena. Um onde não seja preciso mentir para existir.
A rainha enfim se pronunciou:
— A Rosa Negra não teme o sangue. Mas teme a luz. Tragam à tona seus nomes, suas alianças. Que o povo veja quem se esconde nas sombras. E então… verão que a podridão não está no amor de minha filha. Está no medo daqueles que odeiam.
Silêncio.
Emma apertou a mão da princesa sob a mesa.
— Eu ficarei. Com você. Em tudo.
A princesa sorriu de leve.
— Você é a única coisa que faz tudo isso valer.
E enquanto a noite caía sobre o reino, lá fora, tambores distantes começaram a soar. Um som de marcha. De fúria.
A guerra estava às portas.
Mas também estava a chance de renascer um novo tempo.
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As portas do castelo fecharam-se ao amanhecer.
Do alto das torres, podia-se ver o estandarte negro tremulando ao longe: a serpente sobre a coroa rachada. A Rosa Negra marchava.
Eles vinham com força — homens armados, canhões recuperados de velhas guerras, e mentiras nas bocas. Nos vilarejos, espalhavam panfletos que chamavam a princesa de aberração, de impostora, de traidora do sangue real.
