Cap 8 - Augusto Prosseguindo

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A avó de Filipe quis tomar, por sua vez, a palavra; porém, o estudante lhe fez verque ainda muito faltava para o fim de suas histórias, e voltando de novo ao seu lugar,continuou: 

 - O acontecimento que acabo de relatar, minha senhora, produziu vivíssimaimpressão no meu espírito; ajudado por minha memória de menino de treze anos, apenasentrei em casa escrevi, palavra por palavra, quanto me havia acontecido. Isto me tirou otrabalho de mentir, porque, adormecendo sobre o papel que acabava de escrever, meu pai oleu à sua vontade e soube o destino do camafeu, sem precisar que eu lho dissesse. Ele aindaestava junto de mim quando despertei, exclamando: 

- o meu breve!... o velho!... minhamulher!...

 - Anda, doidinho, disse-me meu pai com bondade; eu te perdoo tuas novas loucuras,em louvor da ação que praticaste, socorrendo um velho enfermo; agora, guarda, eu to peço,e mesmo to mando; guarda melhor esse breve do que guardaste o camafeu. 

 E isto dizendo, deixou-me.

 Não se falou mais nesse acontecimento; soube que o velho morrera no dia seguintee que no momento da agonia abençoara de novo a minha camarada e a mim. 

 Meu pai fez todas as despesas do enterro do velho e socorreu sua desgraçadafamília.

 Eu nunca mais vi, nem soube notícia alguma de minha interessante camarada, masnem por isso a esqueci, minha senhora... porque, ou seja que meu coração a tivesse amadodeveras, ou que esse breve tivesse em si alguma coisa de encantador, o certo é que eu aindahoje me lembro com saudade dessa criança tão travessa, porém tão bela. Sem saber seunome, pois nem lho perguntei, nem ela mo disse, quando quero falar a seu respeito, digo:

 -minha mulher! Riem-se? não me importa: eu não posso dizer de outro modo. 

Sempre com sua imagem na minha alma, com seu engraçado sorriso diante de meusolhos, com suas sonoras palavras soando a meus ouvidos, passei cinco anos pensando nelade dia, e com ela sonhando de noite; era uma loucura, mas que havia eu de fazer?...Chegueiassim aos meus dezoito anos. 

Eu já era, pois, mancebo. Meus pais nada poupavam para me educarconvenientemente: aprendia quanto me vinha à cabeça: diziam que minha voz era sonora, epor tal convidavam-me para cantar em elegantes sociedades; julgavam que eu dançava comgraça e lá ia eu para os bailes; finalmente, como cheguei a fazer algumas quadras, pediam mepara recitar sonetos em dias de anos, e assim introduziram-me em mil reuniões, onde asbelezas formigavam e os amores eram dardejados por brilhantes olhos de todas as cores.Além disto frequentava as casas de meus companheiros de estudos e os ouvia contarproezas de paixões, triunfos e derrotas amorosas. Meu amor-próprio se despertou; tivevontade de amar e ser amado. 

Julguei esta minha determinação ainda mais justa, pois tendo ido passear certasférias na roça, e lá falando mil vezes no meu breve e em minha mulher, ouvi a minha mãedizer uma vez, em que me julgava longe: 

- Temo que esse breve tire o juízo àquele menino: talvez que nos seja preciso casá-lo cedo. 

Portanto, para não ouvir somente, mas também para contar alguma vitória de amor,para não endoidecer por causa do breve e, finalmente, para não ser necessário à minha mãecasar-me cedo, determinei-me a amar. 

- Esqueceu-se, por consequência, de sua mulher e do seu breve?! perguntou a Sra.D. Ana, interrompendo Augusto. 

- Ao contrário, minha senhora, tornou este; foi essa minha resolução que me tornoumais firme e mais amante de minha mulher. 

- Não sei, continuou Augusto, que teve o amor comigo, para entender que todas asmoças deviam rir-se de mim e zombar de meus afetos! Pensa que brinco, minha senhora?...pois foi isso mesmo o que me sucedeu no decurso de minhas paixões. Eu resumo algumas .

A moreninha- Joaquim Manuel de MacedoOnde histórias criam vida. Descubra agora