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Depois da minha declaração, o silêncio se instalou na sala como um luto coletivo.
Até o som da respiração do advogado pareceu mais alto. Todos me olharam, menos Gabriel. Ele simplesmente desviou o olhar por um instante, como se não quisesse encarar a versão de mim que ele nunca imaginou que existiria: a que sobreviveu e falou. A que não ficou calada.
A juíza então retomou o ritmo da audiência.
- O réu tem o direito de se pronunciar, se desejar.
A advogada dele colocou a mão no ombro de Gabriel. Ele inclinou o rosto, cochichou algo e voltou para a frente da câmera. A mulher assentiu.
- O réu deseja falar.
Eu senti meu coração travar. Sabia que ele ia tentar virar a narrativa. Que talvez se fingisse de arrependido, que diria estar em tratamento, que usaria qualquer truque barato. Mas nada me preparou para o que veio.
- Meritíssima... - ele começou, com uma voz mais suave do que eu lembrava. - Eu cometi um erro. Um erro de amor.
Não... não...
- Eu nunca quis machucar a Raquel. Eu só queria protegê-la. Nós tínhamos uma história. E quando eu soube da gravidez, eu... surtei. Achei que era meu filho. Achei que ela estava sendo levada de mim. Tudo o que fiz, foi por amor.
A palavra amor me atravessou como uma faca.
- Eu preparei aquele quarto porque eu sabia o que ela gostava. Eu conheço a Raquel. Eu fui o primeiro amor dela. E ela, o meu.
Fechei os olhos. Quase ri. Primeiro amor?
Você foi meu trauma.
- Eu sei que me excedi. Que passei do limite. Mas eu me tratei. Eu aceitei ajuda. Eu entendi que agi errado. E só peço que a justiça leve em conta meu arrependimento sincero.
A juíza digitava. O promotor observava com frieza.
Mas eu... eu tremia de raiva.
E de nojo.
Meu advogado pediu a palavra novamente. A juíza autorizou.
- Meritíssima, gostaríamos de reforçar que o réu está tentando suavizar um crime gravíssimo. Sequestro não é romance. Cárcere privado não é amor. O fato de não ter ferido fisicamente a vítima não o exime da violência psicológica, da coerção emocional, do controle abusivo.
Ele pausou, ergueu uma das pastas com firmeza.
- Apresentamos aqui o laudo psicológico da vítima, que comprova estresse pós-traumático, distúrbios do sono, ansiedade perinatal. Tudo consequência direta da ação do réu.
A juíza pediu uma cópia digital. Gabriel suspirou.
Eu o encarei.
E ele desviou novamente.
A audiência seguiu por mais de duas horas.
Testemunhas do caso foram ouvidas - inclusive a funcionária da casa onde ele me manteve. A moça, uma diarista, disse que só ia uma vez por semana e não sabia que havia alguém lá dentro. Chorou. Contou que quando viu meu rosto na TV, se sentiu cúmplice sem ter culpa.
O policial que me resgatou também foi ouvido. Relatou minha condição no dia: pálida, tremendo, com marcas no braço de onde Gabriel me segurou. Falou do quarto decorado como uma réplica de fotos antigas do meu Instagram.
- Era como se ele tivesse montado uma prisão com flores e cortinas brancas. - disse o policial. - Mas ainda era uma prisão.
Quando saí da sala, Wesley ainda estava lá, sentado, com Hanna dormindo em seu colo e Kalleb mamando na mamadeira.
Ele olhou pra mim e levantou sem falar nada.
Apenas me abraçou.
Longo, apertado, silencioso.
Chorei ali mesmo, em seu ombro.
- Acabou? - ele perguntou.
- Ainda não. Mas estou mais perto.
Nos dias seguintes, a ansiedade aumentou.
O resultado da audiência não sairia de imediato. A juíza tinha até cinco dias úteis pra publicar a sentença. E nesse meio-tempo, cada barulho da porta, cada notificação no celular, me fazia estremecer.
Sim, eu sabia que ele estava preso.
Mas traumas não conhecem lógica. Eles vivem à margem da razão.
Na terceira noite, acordei com um pesadelo. Eu estava de novo naquele quarto. Mas dessa vez, os berços de Hanna e Kalleb também estavam lá. E Gabriel, de terno branco, segurava os dois nos braços.
- Eles são meus. - ele dizia.
Gritei e acordei suando. Wesley também despertou e me abraçou.
- Tá tudo bem, amor. Foi só um sonho.
- Não... foi um aviso. - sussurrei. - Ele ainda me assombra.
No quarto dia, o e-mail chegou.
SENTENÇA PUBLICADA.
Meus dedos tremiam ao abrir o arquivo PDF. Wesley veio correndo e pegou o celular das minhas mãos.
Ele leu em voz alta:
> "Considerando os fatos, as provas, os testemunhos e os laudos apresentados, julgo procedente a denúncia do Ministério Público e condeno o réu, Gabriel Barbosa, à pena de oito anos e quatro meses de reclusão em regime fechado, sem direito a progressão de pena durante os quatro primeiros anos, conforme art. 148 e 129 do Código Penal."
Parei de respirar por um segundo.
- Oito anos... - sussurrei. - Ele vai ficar lá. Preso.
Wesley me abraçou de novo. Mas dessa vez, eu chorei com alívio.
- Acabou, Raquel. Agora de verdade.
Olhei para o berço.
Hanna dormia com uma das mãos sobre o rosto. Kalleb murmurava no sono, talvez sonhando com algum lugar bonito.
Abracei os dois no pensamento.
- A mamãe conseguiu. - murmurei. - Por vocês.
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