Cap.30. - Vozes Que Ecoam ( parte 2 de 4)

16 3 0
                                        

Depois da minha declaração, o silêncio se instalou na sala como um luto coletivo

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.

Depois da minha declaração, o silêncio se instalou na sala como um luto coletivo.

Até o som da respiração do advogado pareceu mais alto. Todos me olharam, menos Gabriel. Ele simplesmente desviou o olhar por um instante, como se não quisesse encarar a versão de mim que ele nunca imaginou que existiria: a que sobreviveu e falou. A que não ficou calada.

A juíza então retomou o ritmo da audiência.

- O réu tem o direito de se pronunciar, se desejar.

A advogada dele colocou a mão no ombro de Gabriel. Ele inclinou o rosto, cochichou algo e voltou para a frente da câmera. A mulher assentiu.

- O réu deseja falar.

Eu senti meu coração travar. Sabia que ele ia tentar virar a narrativa. Que talvez se fingisse de arrependido, que diria estar em tratamento, que usaria qualquer truque barato. Mas nada me preparou para o que veio.

- Meritíssima... - ele começou, com uma voz mais suave do que eu lembrava. - Eu cometi um erro. Um erro de amor.

Não... não...

- Eu nunca quis machucar a Raquel. Eu só queria protegê-la. Nós tínhamos uma história. E quando eu soube da gravidez, eu... surtei. Achei que era meu filho. Achei que ela estava sendo levada de mim. Tudo o que fiz, foi por amor.

A palavra amor me atravessou como uma faca.

- Eu preparei aquele quarto porque eu sabia o que ela gostava. Eu conheço a Raquel. Eu fui o primeiro amor dela. E ela, o meu.

Fechei os olhos. Quase ri. Primeiro amor?

Você foi meu trauma.

- Eu sei que me excedi. Que passei do limite. Mas eu me tratei. Eu aceitei ajuda. Eu entendi que agi errado. E só peço que a justiça leve em conta meu arrependimento sincero.

A juíza digitava. O promotor observava com frieza.

Mas eu... eu tremia de raiva.

E de nojo.

Meu advogado pediu a palavra novamente. A juíza autorizou.

- Meritíssima, gostaríamos de reforçar que o réu está tentando suavizar um crime gravíssimo. Sequestro não é romance. Cárcere privado não é amor. O fato de não ter ferido fisicamente a vítima não o exime da violência psicológica, da coerção emocional, do controle abusivo.

Ele pausou, ergueu uma das pastas com firmeza.

- Apresentamos aqui o laudo psicológico da vítima, que comprova estresse pós-traumático, distúrbios do sono, ansiedade perinatal. Tudo consequência direta da ação do réu.

A juíza pediu uma cópia digital. Gabriel suspirou.

Eu o encarei.

E ele desviou novamente.

A audiência seguiu por mais de duas horas.

Testemunhas do caso foram ouvidas - inclusive a funcionária da casa onde ele me manteve. A moça, uma diarista, disse que só ia uma vez por semana e não sabia que havia alguém lá dentro. Chorou. Contou que quando viu meu rosto na TV, se sentiu cúmplice sem ter culpa.

O policial que me resgatou também foi ouvido. Relatou minha condição no dia: pálida, tremendo, com marcas no braço de onde Gabriel me segurou. Falou do quarto decorado como uma réplica de fotos antigas do meu Instagram.

- Era como se ele tivesse montado uma prisão com flores e cortinas brancas. - disse o policial. - Mas ainda era uma prisão.

Quando saí da sala, Wesley ainda estava lá, sentado, com Hanna dormindo em seu colo e Kalleb mamando na mamadeira.

Ele olhou pra mim e levantou sem falar nada.

Apenas me abraçou.

Longo, apertado, silencioso.

Chorei ali mesmo, em seu ombro.

- Acabou? - ele perguntou.

- Ainda não. Mas estou mais perto.

Nos dias seguintes, a ansiedade aumentou.

O resultado da audiência não sairia de imediato. A juíza tinha até cinco dias úteis pra publicar a sentença. E nesse meio-tempo, cada barulho da porta, cada notificação no celular, me fazia estremecer.

Sim, eu sabia que ele estava preso.

Mas traumas não conhecem lógica. Eles vivem à margem da razão.

Na terceira noite, acordei com um pesadelo. Eu estava de novo naquele quarto. Mas dessa vez, os berços de Hanna e Kalleb também estavam lá. E Gabriel, de terno branco, segurava os dois nos braços.

- Eles são meus. - ele dizia.

Gritei e acordei suando. Wesley também despertou e me abraçou.

- Tá tudo bem, amor. Foi só um sonho.

- Não... foi um aviso. - sussurrei. - Ele ainda me assombra.

No quarto dia, o e-mail chegou.

SENTENÇA PUBLICADA.

Meus dedos tremiam ao abrir o arquivo PDF. Wesley veio correndo e pegou o celular das minhas mãos.

Ele leu em voz alta:

> "Considerando os fatos, as provas, os testemunhos e os laudos apresentados, julgo procedente a denúncia do Ministério Público e condeno o réu, Gabriel Barbosa, à pena de oito anos e quatro meses de reclusão em regime fechado, sem direito a progressão de pena durante os quatro primeiros anos, conforme art. 148 e 129 do Código Penal."

Parei de respirar por um segundo.

- Oito anos... - sussurrei. - Ele vai ficar lá. Preso.

Wesley me abraçou de novo. Mas dessa vez, eu chorei com alívio.

- Acabou, Raquel. Agora de verdade.

Olhei para o berço.

Hanna dormia com uma das mãos sobre o rosto. Kalleb murmurava no sono, talvez sonhando com algum lugar bonito.

Abracei os dois no pensamento.

- A mamãe conseguiu. - murmurei. - Por vocês.

 - Por vocês

Ops! Esta imagem não segue nossas diretrizes de conteúdo. Para continuar a publicação, tente removê-la ou carregar outra.
Nossa História - 𝑾𝒆𝒔𝒍𝒆𝒚 𝑻𝒆𝒊𝒙𝒆𝒊𝒓𝒂Onde histórias criam vida. Descubra agora