(Gente, o Wattpad está juntando algumas palavras no meu texto. Eu arrumo e arrumo, mas ele sempre junta as palavras. Se isso acontecer com este capítulo, eu juro que a culpa não é minha. não sei o que está acontecendo.)
- Como foi a viagem? – Cristina pergunta enquanto dirige.
Pegamos um engarrafamento horrível ao sair do aeroporto, mas confesso que não estou me importando muito com o trânsito. Minha mente está presa em João Carlos e a maneira inusitada que me senti perto dele.
Eu havia fugido como uma adolescente morrendo de medo de algo que vai experimentar pela primeira vez. Sabia que tinha sido rude e ele nem merecia, mas não sabia o que fazer. Não estava preparada para conhecer ninguém novo. Ainda não estou. Está muito cedo e não sei quando vai chegar a hora certa. Preciso focar em mim, não perder tempo com um jovem que deve ter uma fila de modelos lindas correndo atrás dele.
A imagem de João com várias modelos seminuas passa pela minha mente e não me agrada. E perceber o quanto aquilo me chateia faz com que meu humor fique pior ainda.
- Você está dormindo, Laura? – Cris pergunta e eu percebo que a estava ignorando. – Eu perguntei como foi a viagem.
- Tranquila – respondo enquanto lembro novamente de João.
Cris afasta rapidamente os olhos do trânsito enquanto paramos em mais um sinal fechado e me observa com interesse.
- O que aconteceu? – pergunta.
- Além da minha separação que a mídia está adorando explorar?
- É, além disso. Sei que sua vida anda uma loucura, mas eu te conheço, Laurinha, e aconteceu algo que está te perturbando. E não é a separação do Tony. Nós conversamos sobre isso pelo telefone e faz algum tempo que você está mais tranquila.
Ela estava coberta de razão, mas como eu ia parar para explicar que o problema era a minha súbita atração por um estranho?
- Não é nada demais – começo a mentir. – é apenas a preocupação com as meninas. Fico sem saber como elas vão lidar com a imprensa correndo atrás de um furo de reportagem enquanto estou aqui, desfrutando esse paraíso.
Cris sorri como se entendesse.
- Você tem duas garotas incríveis e que sabem tomar conta de si mesmas. Agora, por favor, tenta aproveitar a viagem. Já basta de ficar se martirizando. Isso é muito a sua cara.
Eu acho graça, porque como sempre, ela está coberta de razão.
Com algum esforço afasto João Carlos, a imprensa e todos os problemas da minha vida para longe e tento colocar o papo em dia com a Cris, que faz tempo que não vejo pessoalmente.
***
Paro na frente do espelho e fico observando a mulher à minha frente. Bonita, usando um vestido com estampa floral, do tipo que nunca usa em sua vida normal. Seus cabelos loiros são belos também, mas estão longos demais, merecendo um corte. E o mais interessante da figura à minha frente são os olhos. Os mesmos olhos cor de mel de todos os dias, mas com uma intensidade nova, desconhecida. Onde foi a parar a Laura de sempre? Quando foi que me tornei uma desconhecida? Uma hospedeira vivendo dentro do meu próprio corpo, mas que em momento algum parece com a pessoa que eu lembro de ser?
Me afasto do espelho e sento na cama. Ultimamente ando muito pensativa. Tudo me fez questionar. É como se a separação estivesse me fazendo rever todas as minhas atitudes, minhas escolhas, meus erros e acertos. Quantas ações que pensei serem certas hoje me parecem erradas. E o inverso também.
Lembro de quando era uma garota de vinte e poucos anos e acreditava que o futuro me faria ter menos medo, mais certeza de tudo. Chega a ser engraçado o quanto nos enganamos. A maturidade traz muitas coisas boas, mas certa é algo que a vida nunca é. Os anos passam e continuamos vagando acreditando que estamos seguindo um caminho certo, calculado. No fundo somos apenas viajantes incertos e medrosos, sem controle de nada, inclusive dos nossos próprios sentimentos, que são mais rebeldes do que muitos de nós gostaríamos.
Cris bate na porta e em seguida entra no quarto.
- Pronta?
Ela está bela e cheia de estilo, como sempre, usando um leve macacão, combinando com o clima quente de salvador.
Sempre tive uma ponta de inveja de como Cristina era livre, cheia de vida e com uma leveza diante de tudo que eu nunca tive. Mesmo quando a vida apresentava adversidades ela parecia feliz e satisfeita, diferente de mim que há anos sentia como se carregasse o mundo nas costas.
Levantei da cama e a segui. Estávamos indo para uma festa na casa de um amigo dela. Como a maioria das pessoas populares ela sempre tinha algum evento para ir, pois sua companhia era bastante solicitada.
- Estranho estar indo a uma festa no meu primeiro dia de viagem. – eu falei ao chegarmos ao local da reunião.
- Não vejo nada de estranho nisso. E é uma recepção bem simples, só entre conhecidos.
- Aposto que vários artistas plásticos.
Ela riu, sem se dar ao trabalho de me responder.
Cris é artista plástica. Suas esculturas são belíssimas e fazem grande sucesso pelo país e até fora dele. Ela trabalhava em São Paulo, mas a agitação da cidade tinha feito com que ela se cansasse do ambiente e mudasse para Salvador, cidade com vida social e que ainda é no litoral, um ambiente que ela dizia ser inspirador para seu trabalho.
Tocamos a campainha e logo estávamos sendo recebidos pelo anfitrião, um homem no início dos quarenta anos, negro e com um corpo escultural. Olhou para a minha amiga da cabeça aos pés quando a viu e logo a abraçou, passando seu olhar para mim.
- Esta deve ser Laura. – Ele falou sem esperar Cris nos apresentar.
- Sim – Cris respondeu. – E este apressado é o Marcondes.
– Vem – ele falou. – Você tem que conhecer todo mundo.
A casa estava com mais ou menos vinte pessoas. As idades eram variadas e formavam um grupo bastante singular. Era visível que a maioria era artista e estava acostumada a seguir um ritmo de vida próprio.
Eu estava acostumada a conhecer artistas, por causa do tempo que fiquei casada com Tony, só que aquele grupo não parecia nada com as pessoas do círculo social do meu ex-marido.
Enquanto os atores, diretores e cantores que conviviam com Tony eram desesperados pela fama, as pessoas que estavam na casa do Marcondes não pareciam ligar muito para isso. Eram obcecadas pelos seus trabalhos e bastante autocentradas, é verdade; mas pela forma que falavam e agiam ficava claro que o que mais importava era a arte, não aparecer. Isso me agradava.
Sempre odiei a exposição excessiva que a televisão e o cinema causam. Tudo deixa de ser normal para ser grandioso demais, mesmo quando não passa de algo simples. Detesto a maneira como um ator ou cantor depois que fica famoso começa a ser perseguido pela mídia, como os fãs ficam maníacos pela sua vida pessoal, e como o próprio artista muitas vezes perde a noção das coisas e começa a achar que é mais do que é. E no fundo somos todos seres humanos com defeitos e qualidades. Nada demais.
Depois de uma hora de conversa, bebidas e muita risada a campainha tocou.
- Finalmente – falou Marcondes.
- Ele estava trabalhando. – Disse uma jovem que eu não lembrava o nome, mas sabia que era bailarina. – Dá um desconto.
Percebi que estavam esperando alguém. Olhei em direção à porta para ver a pessoa que havia chegado. Meu coração ficou acelerado e eu engasguei com o vinho ao perceber que o convidado não era um desconhecido.
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Um Golpe de Sorte
Narrativa generaleLaura é uma mulher na casa dos 40 anos. Aparentemente ela tem uma vida perfeita, mas isso passa longe da realidade. Acostumada com o casamento segue a vida insatisfeita, fingindo para o marido, para as filhas e até para si mesma. Porque ela não tem...