Capítulo 1

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Subi no avião sem saber ao certo o que estava fazendo. A única certeza que tinha em minha mente é que necessitava sair da vida que estava levando.

Talvez fosse uma fuga. Talvez realmente estivesse sendo covarde por não desejar enfrentar de frente a imprensa, o novo relacionamento do meu marido, meus supostos amigos. As coisas estavam tão complicadas dentro de mim que só desejava sentir um minuto de paz. Eram tantas pessoas dizendo ao mesmo tempo o que eu tinha que fazer com a minha vida. Era tanto barulho, tanto falatório em um momento que só precisava de silêncio e compreensão.

Por conta desta necessidade fiz as malas e parti. Expliquei a situação a minhas filhas, que aceitaram com um olhar preocupado minha viagem, mas não me repreenderam. Durante toda a vida deles eu jamais havia tomado uma decisão tão intempestiva. Sempre havia sido a mulher que cuidava da família, prezava por ela e mantinha as aparências, mas de que importavam as aparências agora? De que me adiantava fingir que estava lidando com tudo tranquilamente? Eu não estava.

Não queria continuar sendo o que esperavam de mim. Já havia passado da hora de descobrir meu verdadeiro eu. Havia me desgarrado da minha essência há tantos anos que agora já nem sabia mais quem eu era.

Então pela primeira vez em muitos anos subi sozinha em um avião.

Naquele dia não era a esposa do ator famoso, a mãe de duas filhas inteligentes, a mulher exemplar.

Ao subir naquele avião, rumo a Salvador, eu era apenas Laura, uma mulher completamente perdida e em busca de mim mesma.

Abri meu exemplar de Comer, Rezar, Amar para ler durante a viagem. Não pude deixar de sorrir da ironia de ler aquele livro em um momento tão complicado. Havia me tornado um clichê ambulante, mas não me importava. A Elizabeth Gilbert havia mudado sua vida para melhor. Eu também iria conseguir.

Comecei a ler as primeiras páginas, mas quando a leitura começava a me prender, fui interrompida.

- Nunca entendi quem consegue ler no avião.

Olhei para o dono da máscula voz e me deparei com um rapaz. Devia estar no final dos vinte anos, provavelmente pouca coisa antes dos trinta.

- Está falando comigo? – perguntei.

Ele sorriu para mim, confirmando minha pergunta.

O sorriso dele era franco e sexy ao mesmo tempo e me senti hipnotizada pela maneira natural que ele despejava aquele sorriso.

- Não sei fazer outra coisa quando viajo – respondi. – Um livro é sempre a melhor companhia para um voo.

- Não supera uma companhia de carne e osso, isso eu garanto.

Não pude evitar contrair meus lábios em um breve sorriso. De certa forma ele tinha razão.

- O problema é que estou viajando sozinha, então só me resta a companhia da Elizabeth Gilbert.

- Ouch.

Ele fez um gesto teatral como se eu o tivesse machucado ou algo parecido.

- O quê? – perguntei.

- Sou uma companhia tão ruim assim?

Dessa vez ri de verdade e com gosto. Como aquele garoto conseguia puxar conversa de maneira tão aberta com uma completa estranha? Jamais teria coragem de fazer isso. Na verdade eu não tinha coragem de fazer uma série de coisas.

Sempre fui uma mulher fechada no meu círculo de amizades. Nunca consegui socializar com facilidade com pessoas desconhecidas ou que havia acabado de conhecer. Por isso me incomodava tanto estar nas festas que o Tony, meu ex-marido, tinha que ir por conta da sua profissão. Atores têm que socializar com qualquer tipo de pessoa. Faz parte da profissão. Só que eu nunca tinha levado jeito para a imprensa e para o círculo de falsidade que cercava os famosos. Tony achava que era puro descaso com sua carreira, mas não. O problema é que sempre fui introspectiva e lidar com quem não tenho intimidade me tira da minha zona de conforto.

Um Golpe de SorteOnde histórias criam vida. Descubra agora