CAPÍTULO 1 - "Porque é que o Javi García te espetou um beijo?"

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(Ana)
Levantei-me quando eram 10h30 da manhã. Hoje era o dia e eu não tinha dormido nada. Saíam as notas dos exames e...eu despedia-me da minha escola.
Por um lado, estava ansiosa, nervosa até. Se não conseguisse tirar as notas que queria, teria de fazer melhoria no próximo ano, o que não estava de todo nos meus planos. Queria manter a minha nota às duas disciplinas, o que não era fácil.
Por outro lado, teria de me despedir dos meus colegas e amigos. A mudança de casa dos meus pais também tinha os seus aspetos negativos. Teria de deixar para trás os meus amigos. Sim, estava um bocado melodramática. Ia afastar-me uns quilómetros, não ia para a China, nem sequer sairia de Lisboa! Acho que a pressão dos exames ainda me estava a afetar... Bem, mas isto tudo também tinha as suas vantagens. Afinal, vinha para o pé da minha irmã, que, quando começou a estudar Design de Moda, teve de mudar-se e começar a viver sozinha. E o melhor é que nestas férias viveríamos juntas para matar saudades.
Logo que me levantei, fui tomar o meu pequeno-almoço e acordar a minha irmã. Bati à porta do quarto e chamei por ela:
- Di, levanta-te lá! Ainda tens de me levar à escola antes de ires para as aulas.
- Que horas são? - perguntou-me com a cara a enterrar-se nas almofadas.
- Quase 11h. Vá l...
- Já?! Fogo, atrasei-me - saltou da cama.
- Para quê tanta pressa?
- Combinei almoçar com o João.
- Namorico estou a ver...
- Não digas asneiras! Ele é simpático e eu estou a encontrar a melhor maneira de lhe dar uma tampa. - ia vasculhando o armário.
- Mas gostas dele...
- O que é que isso te interessa?
- Fui!
Regressei ao meu quarto e vesti-me. Com um dia daqueles o mais provável seria passar a tarde inteirinha na praia. Por mais estranho que parecesse, quando saí do quarto já a Di me esperava.
- Despachaste-te... - comentei.
- Não sei porquê, mas acho que este dia me vai mudar a vida...
Ri-me.
- Tu devias era usar chapéu quando andas ao sol, porque essa cabecinha já está a ficar doidinha.
Ela acompanhou-se na risada e seguimos para a minha escola. Deixou-me lá e desejou-me boa sorte. Acho que ainda me pediu para lhe mandar uma mensagem com os resultados, mas ia já disparada para o corredor, e por isso não sabia se ela o tinha de facto dito ou se eu tinha imaginado. Entrei e espetei o meu olhar nas pautas. Explodi de alegria! Tinha conseguido!
- Parabéns - ouvi uma voz atrás de mim.
- Obrigada, stora - Era a minha diretora de turma e professora de Biologia e Geologia
- Vais mesmo?
- Sim, mas não se esqueça de mim! - brinquei - Venho cá visitar-vos! Estou pertinho.
- Vamos sentir a tua falta. Principalmente o Pedro...
- Stora, nós somos só amigos.
Ela sorriu-me e deu-me dois beijos, desejando-me sorte para o futuro. Segundos depois, ouvi uma grande algazarra: eram os meus meninos. Espetaram os olhos na pauta e tal como eu os gritos foram de "missão cumprida".
Depois de uns minutos de alarido a que eu assistia no meu canto com um sorriso nos lábios, seguiu-se um silêncio suspeito, explicado pelo "Moche à Ana!" que logo se fez ouvir. Ia-me custar não os ver todos os dias. Quando me deram finalmente espaço para respirar, o Pedro tomou a palavra:
- Vamos ter saudades tuas, chiquitita - pôs-me a mão na face e acarinhou-me. Não foi preciso muito para que uma lágrima me escorresse - Ei ei então? Nada de lágrimas - limpou-me a lágrima e abraçou-me, tal como todos os outros.
- E irmos almoçar ao sítio do costume? - desafiou a Marisa.
- Feito! - dissemos em conjunto, como sempre fazíamos. Era uma turma espetacular. O Pedro deu-me a mão e fomos até à padaria em frente. Já nos conheciam tão bem, que nos sentávamos e pouco depois já nos traziam o almoço, sem pedirmos.
- Espero que não te esqueças de mim. - sussurrou-me o Pedro
- Claro que não. E nós vamos continuar a ver-nos!
- Prometes?
- Prometo!
- O que é que prometes? - perguntou a Marta.
- Que vamos continuar a ver-vos ou acham que se livram de mim assim?
- Um brinde à nossa menina! - desafiou o Paulo.
Estivemos ali umas boas horas, mas o meu telemóvel acabou por tocar. Era a minha irmã.
- Sim?
- Ana! Preciso de falar contigo. Onde estás? Podes vir ao Colombo? - a minha irmã falava muito rápido e era notório o entusiasmo.
- Isso é que são aulas animadas. Tanto entusiasmo. Ou terá sido o almoço...
- Ana, isto é sério! Vá lá! Vens até ao Colombo?
- Sim. Às quatro estou aí, pode ser?
- Mais rápido, Ana!
- Ok, ok. Dá-me meia hora, pode ser?
- Sim, pode. Precisas que te vá buscar?
- Não. Eu apanho um táxi ou vou a pé. Até já.
Desliguei e anunciei que me ia embora.
- Desculpem, pessoal, mas tenho de ir. A minha irmã ligou-me e ou enlouqueceu ou então tem uma bomba para me contar.
- Mas já? - perguntou o Pedro.
- Sim, a minha irmã está uma pilha. Vemo-nos por aí, pessoal.
Despedi-me de cada um com dois beijos e algumas palavras. O Pedro tinha-se afastado e estava à porta da padaria. Aproximei-me para me despedir.
- Não te despeças já - pediu-me - Eu levo-te. Onde está a tua irmã à espera?
Ele não estava a fazer uma oferta, estava a fazer um pedido. Não o recusei.
- No Colombo - respondi-lhe, sorrindo. Ele entrelaçou a sua mão na minha e caminhamos até à sua mota. Ele deu-me um dos capacetes e, como era hábito, não consegui evitar e pedi-lhe que fosse devagar. Ele sorriu-me, como dizendo-me que eu nunca mudava. Arrancamos e em 15 minutos chegamos. Descemos ambos da mota e pousamos os capacetes. Ele abraçou-me. Ninguém conseguia perceber o que tínhamos. Não o conseguiam distinguir de uma paixão. Conhecia o Pedro desde pequenina. Lembro-me de ele me defender no recreio, quando os amigos dele me roubavam a minha boneca, ou de dar um murro a um rapaz que se meteu comigo quando entrei no secundário, ou de me consolar quando perdi o meu primeiro namorado... Ele era o meu melhor amigo, o meu irmão mais velho. O meu protetor incondicional. Ia ser estranho não o ver todos os dias.
- Não te armes em melodramática, chiquitita - O Pedro chamava-me a sua chiquitita. Quando éramos pequenos, ele deu-me uma boneca no meu 5º aniversário e combinamos que no espaço de uma semana encontraríamos o nome ideal para ela. A verdade é que, passados esses 7 dias, ainda não havia nome para a boneca. Então ele levou-me a casa dele para pedirmos ajuda à sua mãe. Quando chegamos, ela ouvia ABBA, mais propriamente Chiquitita e então o Pedro sorriu-me e percebi que tínhamos encontrado o nome perfeito. Com o passar dos anos, acabei por deixar a boneca, em destaque na minha prateleira e o Pedro começou a chamar-me a sua chiquitita, porque dizia que eu tinha muitas semelhanças com a boneca.
- Não te esqueças de mim! - pedi, entre lágrimas.
- Nunca! E vê lá se essas saudades de matam essa mania de escolher mal os clubes! - provocou-me. Eu era sportinguista e ele lampião, eu gostava do Barça, ele do Real, eu gostava do PSG, ele do Marselha, eu gostava do Standard de Liège, ele do Anderlecht, eu gostava do United, ele do Chelsea... Estão a ver... Acho que a verdadeira rivalidade era apenas quanto às equipas portuguesas e espanholas, e que o resto era só para nos picarmos. Eternas crianças! Deixei-lhe um beijo na cara e fui-me afastando, os nossos braços esticaram-se o mais possível até que as nossas mãos se acabaram mesmo por separar. Mandei-lhe um beijo e ele piscou-me os olhos. Desisti. Corri para trás e joguei-me nos braços dele.
- Estamos tão lamechas! - reclamou o Pedro.
- Concordo! Vamos passar a vida a ver-nos! Hoje saímos para dançar?
- Claro. Combino com o resto do pessoal!
- Então até logo.
Comecei a dirigir-me ao Colombo.
- Ana! - chamou-me.
- Sim? - virei-me para ele, sorrindo.
- Estou em tua casa às onze.
- Sim, daria muito jeito!
Rimo-nos os dois e eu acabei mesmo por ir para o Colombo, enquanto ele arrancou na mota.
Foi fácil encontrar a minha irmã. Estava na zona de restauração a bater impacientemente com os dedos na mesa.
- Cheguei!
- Aleluia! - reclamou - Senta-te!
- Calma! - sentei-me - Vai haver algum atentado?
- Adivinha o que me aconteceu hoje.
- Beijaste o João.
- Ana, esquece o João e ouve isto: fui convidada para ser a estilista do Sport Lisboa e Benfica.
Ela disse tudo muito devagar quase soletrando com um brilho nos olhos como eu nunca tinha visto. Obviamente que me comecei a rir como uma perdida, mas ela continuava na mesma.
- Estás a falar a sério? - perguntei surpreendida.
- Sim! Não é fantástico?
- God! - saltei da cadeira e abracei a minha irmã - Parabéns! Que passo!
- Eu sei! Estou tão entusiasmada! - estávamos aos saltos em plena zona de restauração. Voltamos a sentar-nos. - Vou amanhã assinar contrato!
- Parabéns, parabéns, parabéns!!!
No meio de tantos festejos, acabamos por trocar uma tarde de praia por uma tarde de compras e conversa. Acabamos por jantar lá e no fim desafiei a Di para irmos dançar com o resto do pessoal. Ela alinhou e ainda convidou uns amigos. Voltamos a casa para pousar os sacos e no agasalharmos. Peguei apenas num blazer branco, enquanto escrevia uma mensagem ao Pedro a dizer que tinha boleia e que nos encontrávamos no bar. Saí do quarto e a Di já me esperava.
- Esqueceste de me dizer que era uma White Party... - brincou a Di.
Olhei para mim. Realmente estava toda de branco.
- Desculpa. Esqueci-me que tenho a estilista mais conceituada do País a viver comigo!
- Que exagero! Vamos mas é!
Seguimos para o bar. O ambiente estava fantástico. O pessoal estava lá todo e fartamo-nos de dançar! Quando regressamos a casa, o sol já estava a nascer. Adormeci. Tinha sido um dia longo e como a minha irmã tinha dito ao sairmos de casa de manhã: esse dia tinha-lhe mudado a vida...

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