CAPÍTULO 8 - "Um dos meus sonhos é que tu e a minha irmã sejam namorados!"

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(Javi)
- Eu levo-te ao colo, mana - disponibilizou-se o Simão, logo que eu disse à Ana que deveria ser um entorse e que, por isso, não deveria apoiar-se no pé.
- Hum acho que não é boa ideia. Eu sou um bocadinho pesada - tentou explicar-lhe a Ana.
- Então, o Javi leva-te! - disse o Simão de forma muito simplista, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
- Simão! - reprendeu-o a Ana.
- Oh mana, já olhaste para ele? Ele é grande e forte! - disse o Simão, explicando a sua proposta. A sua genuinidade deu-me vontade de rir.
- É uma boa ideia - concordei - Então que dizes?
Vi a Ana bastante hesitante e nada confortável com aquela ideia.
- Posso ir ao pé-coxinho - sugeriu.
- Claro... E vais com o salto alto no pé bom ou vais mesmo descalça? - ironizei. Era impossível ela ir a mancar até a casa.
- Oh mana vai lá para o colo do Javi. Eu quero ir lanchar! - refilou o Simão.
Perante isto, vi a Ana bufar e olhar-me com olhar de quem, mesmo contrariada, cedia. Abri-lhe um sorriso divertido com a sua "birra" e abri os braços, mostrando que estava pronto. Ela abanou a cabeça perante a sua derrota. Peguei no salto que lhe tinha descalçado e entreguei-o ao Simão.
- Simão, eu vou pegar na tua irmã - comecei a explicar-lhe - Mas tu vais agarrar a minha camisola. Não quero que andes longe.
- Ohhhh mas eu sou grande! - contestou.
- Simão...
- Ok - cedeu. Passei-lhe a mão pelo cabelo, despenteando-o. Depois voltei-me para a Ana. Percebi que ela estava a tentar perceber como se poria no meu colo. Tinha vontade de rir daquele desconforto. Mas, ao mesmo tempo, eu também estava nervoso.
Não aguentei. Dei os dois passos que nos separavam e peguei nela sem esperar autorização. Ela assustou-se o que provocou um riso ao Simão e até a mim, enquanto ela corava, furiosa por dentro.
Assim que senti o Simão agarrar-me a t-shirt, comecei a andar. Sabia o caminho até casa dela. Aquele parque era um dos pontos de passagem entre a casa dela e o restaurante em que ontem tínhamos jantado. O percurso era relativamente curto, por isso, estava confiante de que não seria necessário fazer nenhuma paragem.
Em minutos, estávamos em casa da Ana. Ela ainda quis que a pousasse no chão para que abrisse a porta, mas o Simão aliou-se a mim e retirou a chave da bolsa dela. Eu apenas tive de equilibrar a Ana, que se agarrava fortemente ao meu pescoço, em apenas um braço (nomeadamente o mesmo da minha mão que se tinha magoado) e com a mão esquerda abri a porta. O Simão correu logo para dentro, deixando-me a mim e à Ana sozinhos.
Fechei a porta com um empurrão e segui até a um sofá, que avistem do hall de entrada. Assim que pousei a Ana no sofá os nossos olhares cruzaram-se e uma força magnética inexplicável invadiu-os. Passei a minha mão pela face dela e sorri-lhe.
- Como está a tua mão? - perguntou-me.
- Está bem. Não te preocupes.
Ela olhou-me, mostrando que havia detetado a minha mentira.
- Dói-me um pouco - admiti.
- Eu vou buscar gelo.
- Eu vou lá - disponibilizei-me.
- Primeiro, não sabes onde está o gelo. Segundo - levou a mão ao salto alto que ainda tinha calçado e retirou-o - desta vez posso ir ao pé-coxinho.
Admito que não me contive e deixei escapar o meu riso. Ela passou por mim e deu-me uma palmada no braço. Depois começou num bonito número acrobático a saltar até à cozinha. Depois voltou com dois sacos de gelo.
- Tens muito jeitinho com isso de andar ao pé-coxinho... - piquei-a.
A Ana não me respondeu, apenas me atirou um dos sacos com gelo para cima de mim.
- Au! Está frio! - reclamei.
Ela atirou-se para cima do sofá, rindo-se.
- É muito bem feito, menino Javier! - respondeu-me.
- Piadinha... O Simão? - perguntei, não o vendo nem ouvindo.
- Quando chegou, correu até à cozinha. Quando estávamos no parque a brincar, eu disse-lhe que tinha feito o bolo preferido dele e ele foi logo roubar a sua fatia. E agora está no quarto da Di, a ver um filme qualquer.
Ela estava muito mais descontraída ao pé de mim o que me deixava feliz. Gostava quando estávamos assim sem problemas nem preconceitos. Ela colocou o pé sobre a mesa de centro e pousou o gelo sobre o seu tornozelo. Depois voltou-se para mim e pegou no saco de gelo que me tinha atirado que, entretanto, tinha caído para cima do sofá. Pegou-me na mão direita que começava a inchar e colocou suavemente o gelo sobre ela. Sentia o meu coração bombear mais sangue do que aquele que o meu corpo possuía tal a forma como batia descontrolado.
Pensava nela e sabia que algo...inexplicável nos unia. Relembrei-me de quando conheci a María. Apenas após 6 longos meses de uma amizade pura é que comecei a olhá-la de forma especial. Mas a María e a Ana não se comparavam. Eram especiais de maneiras diferentes. E sentia que cada vez que decorava os traços da face da Ana me esquecia dos da María. Estava a traí-la. Não a podia esquecer. Mas a Ana... Ela era única. Tão espontânea, tão preocupada com os outros, tão altruísta, tão genuína... A sua voz interrompeu as minhas reflexões:
- Se te estiver a magoar, avisa-me - pediu-me.
- Não. Está tudo ótimo - sosseguei-a.
- Amanhã devias falar com o médico do Benfica para ele dar um olho nisto - aconselhou-me.
- Penso que não será preciso - ela olhou-me insatisfeita - Mas já que insistes, não me custa nada fazê-lo - ela abriu um sorriso satisfeito. Por aquele sorriso, não custava fazer nada. - Mas tu também devias ir ao médico - constatei.
- Não é preciso. Acredita que não. Eu sou...suscetível a este tipo de acidentes - corou - Sou um bocado...desastrada. Caio com facilidade - não resisti a rir-me - Francisco Javier, isto não tem piada! - reclamou.
- O que não tem piada é chamares-me como a minha mãe! - refilei, arrancando um riso dela.
- Temos pena! Chamemos-lhe o meu trunfo!
- Sim, senhora desastrada!
- Parvo! - disse, dando-me uma palmada no braço, que nos deixou perigosamente próximos. Senti-a ficar nervosa quando a distância que nos separava diminuiu para poucos centímetros. Não sei porquê mas não consegui recuar. Ela atraí-me ainda mais do que acontecia com dois ímans.
Passei ambas as minhas mãos pelos seus cabelos e aproximei-me mais.
Senti que ambos fixámos os lábios um dos outro e com o diminuir da distância, comecei a sentir a sua respiração na minha pele. Naquele momento, beijá-la era a única maneira de eu sobreviver. Era assim que o sentia. Ficamos tão próximos que acabamos por fechar os olhos e deixar-nos levar pelo calor um do outro. Sentia já o cheiro dos seus lábios, quando o Simão apareceu vindo do nada. Afastámo-nos rapidamente assim que o ouvimos entrar na sala, num momento constrangedor. Pelo menos, o Simão pareceu não se ter apercebido do que iria acontecer. Saltou naturalmente para o espaço, que agora existia, entre mim e a Ana.
- Mana, o que é um sonho? - perguntou o Simão.
- Há vários tipos de sonho... - disse-lhe a Ana, ainda a recompor-se do nosso momento.
- Acho que não são aqueles que temos à noite. Acho que são uns que temos acordados - tentou explicar-se - No filme, o menino dizia que o sonho dele era ir à Lua. Ele sonhou com isso? - perguntou confuso.
- Não, ele não sonhou com isso. Há sonhos que nós temos quando estamos acordados. Por exemplo, o que queres ser quando fores grande?
- Hoje, decidi que quero ser jogador de futebol! - disse convicto - Como o Javi - sorriu-me e aquele gesto tocou-me. Será que me via como...um exemplo?
- Então o teu sonho é seres jogador de futebol - disse-lhe a Ana.
- Então, um sonho é uma coisa que queremos com muita força? - perguntou.
- Sim, é isso mesmo!
- E os sonhos podem mesmo acontecer? - perguntou.
- Claro que podem! - respondeu-lhe a Ana - Só tens de trabalhar muito para que eles aconteçam.
- Fixe! Se sonhos é quando queremos muito uma coisa, então eu tenho muitos!
- Ai sim? - perguntei-lhe - Não me queres dizer um?
- Claro que posso! Tu és meu amigo. Um dos meus sonhos é que tu e a minha irmã sejam namorados!

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