III

240 25 2
                                    

– Mãe! Tô com fome! – A Tina grita da sala, enquanto usa o celular – Antes que eu me esqueça, preciso de um novo celular, também! O meu tá muito velho! – Continua gritando, sentada no sofá que fica na frente da lareira e no lado da escada.

– Nós não compramos o seu celular semana retrasada, Tina? – Papai responde, sentando em uma poltrona no canto da sala de estar, ao lado de uma pequena estante cheia de livros.

– Tyler, se atualiza! A Blackberry já lançou 3 novos modelos nas últimas semanas! A Lindsay tem um, ela acabou de me falar! Eu que não quero ir para a minha nova escola com um celular super desatualizado! – Ela fala, com uma cara de nojo.

– Na sua nova escola ninguém sequer tem celular, Tina. – Papai resmunga, abrindo um livro velho que pegou na estante

– O quê?! – Ela se levanta, com cara de nojo. Arranca os fones de ouvido bruscamente – Para tudo! Vou estudar numa escola de caipiras?!

– Não são caipiras, Tina – Papai fala friamente, sem tirar os olhos do livro. – E, como a Jane já disse, vocês não têm querer. Se achamos melhor você estudar nessa escola, você vai estudar!

A Jane sai da cozinha pelo enorme arco da cozinha. Põe a mão na cintura e grita:

– Olha, se a minha Tina não quiser ir pra essa escola, ela não vai!

Meu pai tira os olhos do livro para encarar a Jane

– Mas eu já fiz a matrícula dela – Volta os olhos para o livro

– Ora, então manda o Jack no lugar dela! – A Jane grita.

– Ok. – Meu pai responde friamente.

Desço as escadas em um pulo

– Eu vou para uma escola de caipiras?! – Pergunto, indignado.

– Vai – A Jane volta para a cozinha.

Não respondo nada, porque eu sei que, não importa o que eu fale, eles com certeza não vão mudar de ideia.

——————————————————————————————

[Trecho retirado de grampo telefônico autorizado pela polícia]

Domingo, 2h59

Tina: Tyler... socorro... (sussurrando)

Tyler: Tina? O que foi?

Tina: A boneca... ela me encontrou... (Passos distantes e pesados se aproximando) NÃO! NÃO! VÁ EMBORA! VÁ EMBORA! (Gritos femininos)

Tyler: Tina?! TINA!

Voz dupla: Eu encontrei a Tina... (estática, sussurros, passos se distanciando, som de algo sendo arrastado)

[Fim da ligação]

——————————————————————————————

Subo pela escada barulhenta, e ando pelo corredor até chegar à penúltima porta: o meu quarto. Ponho minha mão na maçaneta enferrujada, e giro devagar. A porta se abre, com um ranger bastante amedrontador.

O quarto é bastante espaçoso, e tem várias janelas com grandes cortinas em uma das paredes, o que deixa ele bastante iluminado. O piso é de madeira escura, e as paredes são de um papel de parede que um dia deve ter sido azul-bebê, um pouco descascado e com algumas rachaduras. Encostada na parede repleta de janelas, está uma cama de casal bastante espaçosa, com base de ferro, colcha verde e travesseiros grandes e fofos (acho que devem ser de penas.). Ao lado da cama, um criado mudo com uma pequena gaveta com um abajur velho em cima. Na outra parede, um enorme guarda-roupas de madeira escura (aparentemente velho) e uma cômoda. O quarto também conta com algumas prateleiras com alguns livros velhos, e uma pequena estante sem livros no chão. Olho para baixo vejo um tapete vermelho-escuro no meio do quarto. Tiro os meus sapatos e as minhas meias, e jogo em um canto do quarto. Ando descalço até a minha cama. Passo pelo tapete e noto algo estranho: manchas secas, quase que imperceptíveis. Me jogo de joelho em cima do tapete e passo a mão por uma das manchas. Olho mais de perto. Sangue seco.

BonecaOnde histórias criam vida. Descubra agora