four

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O dia seguinte no hospital psiquiátrico deveria amanhecer com o céu nublado, as cores mortas pintando as pessoas enquanto pequenos detalhes nelas brilhavam, de acordo com Castiel.

Seus olhos azuis, os olhos verdes de Dean, os cabelos avermelhados de Charlie, os cabelos louros de Lilith, as bochechas coradas de Gabriel.

Todavia, antes mesmo do Sol nascer por de trás das casas que enfeiravam a cidade, o hospital ouviu gritos.

Castiel odiava gritar.

Castiel sentia ânsia ao gritar.

Mas Lúcifer não o deixava em paz.

Mas Meg não o deixava em paz.

Tudo estava turvo e confuso para o pequeno homem. Seus olhos estavam marejados e a voz já rouca quase não saia pelos lábios que sangravam após horas e horas os mastigando com os dentes. As mãos arrancavam cabelos da cabeça e aquilo era a única coisa que determinava o existente e o inexistente.

Castiel queria Crowley ali.

Castiel queria Lúcifer ali.

Castiel queria Dean ali.

Castiel queria sair dali.

Quando ele viu a agulha e pensou em entrar em seu mundo de esquecimento, ficou com medo de não sair de suas loucuras nunca mais. Gritou, então, em plenos pulmões e evitou pensar que a mão de sua enfermeira estava sobre o seu braço e tentava segurá-lo:

- Dean! Dean, por favor... - ele implorou com lágrimas molhando as roupas brancas, enquanto os orbes azuis seguiam o sobretudo que era retirado do seu corpo - D-devolvam! - ele gritou em um sussurro estrangulado, engasgando-se com a própria saliva.

Por fim, a seringa fez o seu trabalho no pescoço do homem. Ele xingava Meg de todos os nomes que conhecia até o seu corpo amolecer na cama e seus sentidos ficarem cada vez mais fracos.

Castiel odiava remédios.

Castiel odiava soníferos, calmantes e anestesias.

Castiel odiava ser obrigado a dormir...

Castiel odiav...

***

Quando Castiel acordou, estava envolto de braços gordinhos e uma pancinha que ele conhecia muito bem.

Crowley era como o seu pai.

Mas Crowley era apenas um bibliotecário.

Crowley conhecia Castiel desde que ele tinha 13 anos.

Crowley não era o demônio que as pessoas achavam que ele era.

- Cr-owl...

- Hello boy - ele disse com sua costumeira voz rouca - Fiquei sabendo do seu acesso de pânico ontem e corri para cá.

Castiel queria se mover, mas o efeito do remédio não devia ter passado. Então ele choramingou quando não conseguiu se encolher de vergonha por ter feito aquilo com Crowley, apenas fechando os olhos enquanto tentava fazer sons que se parecessem com palavras ao invés de soltar grunhidos desconexos.

- Está tudo bem, Cass. Pode dormir mais um pouco. Provavelmente quando acordar vai estar melhor.

Castiel dormiu novamente, sendo embalado por Crowley.

***

- Dean Winchester, muito prazer.

- Winchester? Castiel deve ter comentado de você.

- Espero que coisas boas.

- Cass só fala sobre as boas pessoas. Eu sou Crowley.

- É o pai de Castiel?

- Conheço-o desde que ele tinha 13 anos. Eu sou bibliotecário da escola onde ele estudava e ele é como um filho que eu nunca tive.

- E você, provavelmente, é o pai que ele nunca teve.

- Felizmente eu estou aqui. Eu espero que esteja cuidando dele.

- Eu tento Crowley, eu tento. Mas eu não sou enfermeiro dele. Meg é quem cuida do Cass.

- Entendo. Espero que ela não esteja fazendo nada contra o pequeno Castiel.

- Eu também queria esperar isso, mas é a Meg. Quando se trata dela, devemos esperar o pior.

- Hm... eu desconfiei que você gostasse de Castiel desde que te vi com essa coroa ridícula de flores na cabeça.

- O-o que? M-mas...

- Relaxe rapaz. Eu estava brincando.

Castiel queria ouvir mais da conversa, mas acabou adormecendo novamente.

***

Quando acordou pela última vez naquele dia, Dean estava sentado em uma cadeira ao lado, fitando os pés cobertos de Castiel.

- D-Dean?

Os olhos verdes alcançaram os sonolentos olhos azuis, perdidos em sua expressão cansada. Ele deu um mínimo sorriso e se levantou, pegando um copo de água e alguns comprimidos em uma bandeja.

- Hey anjo. Você pode tomar esses remédios, por favor?

Castiel odiava remédios.

E Castiel não costumava pensar poucas vezes antes de tomá-los.

Mas Dean estava ali.

Dean sempre estava ali.

Então ele ergueu a mão e pegou os comprimidos com cuidado, bebendo alguns goles de água e devolvendo o copo de plástico às mãos de Dean. Ele sorriu de lado para o mesmo.

- Monstros... proteção. Onde está a proteção, Dean? - Castiel conseguiu sussurrar sem gaguejar, uma surpresa para o loiro. Ele se desencostou da cadeira e atrás dele lá estava o sobretudo cor de creme.

- Está aqui - o loiro ajudou o de olhos azuis a se vestir, e logo o mesmo voltou a se deitar na cama.

- Crowley?

Dean fechou a expressão, sentando-se na lateral da cama de Castiel. Ele não recuou, mas também não avançou sobre as mãos do contador de histórias que tanto queria tocar.

- Ele... foi falar sobre Meg. Talvez você não tenha mais que vê-la. Talvez eu cuide de você agora.

Castiel não gargalhava.

Castiel mal sorria.

Mas naquele momento Castiel estava feliz demais para se calar.

Ele soltou uma risadinha baixa pelo nariz.

Castiel não sabia definir os sentimentos muito bem. Muitas vezes, não sabia diferenciar a felicidade da euforia, o medo do pânico. Então ele se prendia aos momentos e os sentimentos daqueles momentos. Ele sentia como se tivesse dormido escutando a voz de Dean contando uma história, ele sentia como se tivesse ido procurar flores com Dean para sua nova coroa de flores de verdade. Ele sentia como se tivesse libertado a abelhinha. Ele sentia como se não tivesse que bater oito vezes o dedo na parede. Ele sentia como se Lúcifer estivesse ao seu lado. Ele sentia como se Sam e Gabriel fossem jogar "Sorry" com ele.

Castiel sentia.


still 》fanfic destielOnde histórias criam vida. Descubra agora