O sinal da escola soou agudo nos meus ouvidos, recreio. Finalmente eu poderia achar um lugar afastado daquele "grupinho" de garotos mimados que se achavam os donos da escola. Sentei-me em um banco aos fundos da escola , e passei a mão no corte do meu braço. Estava começando a inflamar, saindo pus do mesmo. A dor era enorme, e eu me encolhia no banco buscando forças onde eu não tinha.
Uma mão se estendeu à minha frente, segurava uma maçã vermelha e grande. Minha boca salivou e eu peguei a fruta erguendo os olhos , era Eloísie.
___ Pode comer. Você não está bem , eu pude ver. – ela sentou-se ao meu lado tirando um rolo de gaze do bolso do vestido rodado que usava.
Mordi a maça a saboreando, minha primeira refeição do dia, e que foi entregue a mim por uma garota um pouco mais velha do que eu , 8 anos de idade.
Ela estendeu a mão para pegar no meu braço e eu recuei, talvez fosse o medo de ela ser como os outros e também querer me ferir.
___ Se acalme... Não vou te fazer mal. – ela se aproximou novamente e pegou o meu braço enrolando a gaze em cima do corte , estancando o pus que saía. – Pronto, assim vai melhorar. – ela sorriu para mim , que olhava fixamente para o garoto ruivo e seus amigos sorridentes do outro lado no pátio.
___ Quem são eles? – perguntei sério e depois voltei o olhar para ela.
____ Aquele ali , é Jason . – falou ela apontando justo para o ruivo que começou a zombaria na classe. – Ele mora no bairro nobre da cidade, o pai dele sempre trás ele de carro. E os outros são os melhores amigos dele : Lucas, Pedro , Matthew e Renato.
***
Voltei para o trailer carregando a carga que haviam jogado em mim na escola, meu rosto não era mais apto a sorrir , não havia motivos para isso. Passei por meu pai, na sala improvisada , sentado em uma poltrona assistindo futebol visivelmente bêbado e segui para o meu quarto sentando na cama. A única coisa que me restou foi chorar, encolhi meus joelhos ao peito e abaixei o rosto desabando em mim. Deixando toda a dor me consumir , todas aquelas palavras, aquelas imagens se transformar em ódio e tristeza. Transformando-me em uma criança amargurada.
De repente ouvi uma voz chamar meu nome, talvez fosse coisa da minha cabeça, mas era muito real. Continuei com a cabeça abaixada mas a voz continuava.
"Gabriel... Gabriel... Ache-me , Gabriel...."
___Mãe? – falei erguendo a cabeça conforme a voz se tornava mais alta e clara.
"Ache-me , Gabriel."
Levantei-me e caminhei em direção à janela do trailer . O tempo estava escuro , apesar de não ser nem meio dia. Gotas grossas de chuva caíam do céu e eu observava o terreno vazio em busca de onde estava vindo aquela voz.
"Eu estou aqui , meu filho..."
Virei o rosto e a vi , parada ao lado da placa de transito velha onde ficava a antiga estrada principal da cidade. Sai correndo em direção ao lado de fora , meu pai nem me viu sair, o sono dele era "profundo" demais e ele roncava como um porco velho.
___ Mãe! – gritei em meio à chuva procurando a imagem que havia visto da janela do meu quarto. Nada . Ela havia simplesmente desaparecido.
Corri até a placa e a segurei , puxando-a o mais forte possível para fora da terra. A chuva, por incrível que pareça estava ajudando. A terra estava mais fofa e logo eu consegui remover a placa do chão. Com as duas mãos a arrastei e me ajoelhei começando a cavar a terra do local em que a placa estava.
A cada mão de terra, meu coração disparava na esperança de achar minha mãe.
Uma hora já havia se passado e eu continuava cavando , até ver algo azulado e pálido aparecer. Era o dedão de um pé, continuei cavando até revelar o corpo de minha mãe ali ,em tão decadente estado.
Havia larvas saindo de suas narinas e boca, mas eu só conseguia pensar no culpado de tudo aquilo. Meu pai.
Eu só queria vê-la novamente , não poderia ligar para polícia se não quisesse morrer. Eu era apenas uma criança indefesa...
Joguei novamente a terra que tinha tirado em cima do corpo dela , e fiquei ali sentado sentindo a chuva cair em meu rosto na esperança que ela lavasse minha alma.
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Diário de um psicolouco
HorrorOuço vozes.. Vozes que sussurram no meu ouvido dizendo que não sou capaz, que eu sou o fraco. O que seria fraqueza para eles? Não sei, posso tentar descobrir ao longo do tempo. Talvez posso tentar descobrir depois que sair deste lugar. Onde as agulh...